Aerococa Greatest Hits – Uma Trilha Sonora Alucinante

Temos a trilha sonora ideal para acompanhar os desdobramentos do Aerococa em que 39 kg da branquinha embarcados no avião oficial do presidente Bozo.

Aerococa

Quando as autoridades espanholas encontraram os 39 kg de cocaína na mala de mão do sargento da FAB Manuel Silva Rodrigues, ficaram surpresas, pois a droga estava a mostra, não houve esforço algum pra camuflá-la. Indício de que o traficante ou “mula qualificada”, como o classificou o vice presidente, o também militar Hamilton Mourão, estava seguro de que levaria sua carga ao seu destino final. 

Isso levanta muitas questões a serem respondidas pelo governo bozonaro: como o sargento conseguiu embarcar no avião oficial da comitiva presidencial portando 39 kg de cocaína em sua bagagem de mão? Quem é o proprietário dessa carga? Qual seu destino final? Há quanto tempo essa operação de tráfico internacional usa esse expediente pra transportar drogas pra fora do Brasil? Seria mesmo possível responsabilizar apenas o sargento pelo transporte? Um simples sargento da FAB teria condições de arquitetar e executar todos os procedimentos necessários para realização dessa operação de tráfico internacional de entorpecentes?

Enquanto refletimos sobre essas questões, aguardamos os desdobramentos da investigação e esperamos por uma explicação razoável (se é que podemos esperar isso desse dito governo) do governo bozonaro, vamos ouvir essa seleção de músicas sobre esse produto tão precioso e importante que viaja na aeronave oficial do presidente da república do Brasil.


1. Cocaine Blues – Johnny Cash

https://youtu.be/UjxYHbcC6Co

Essa música mostra que não devemos usar cocaína quando estivermos com dor de cotovelo ou qualquer tipo de problema conjugal. Cocaine Blues conta a história de um sujeito que por algum motivo, que desconhecemos, cheira uma carreira de pó mata a mulher, guarda a arma embaixo do travesseiro e vai dormir.

Após cometer esse feminicídio o sujeito acorda na manhã seguinte, pensa na merda que fez e pra achar uma solução pra resolver essa treta o que ele faz? Isso mesmo, cheira outra carreira de pó. A cafungada trás a disposição necessária para que ele fuja, porém não a habilidade para dirigir o carro usado na fuga. Resultado, se fode em Juarez com os meganhas todos o cercando. Outro problema e o que ele faz?

Dessa vez ele pega leve, fuma uns baseados e toma uns remédios tarja preta. Levado diante do delegado, que joga em sua cara a barbaridade do crime que cometera, nosso personagem chama o delegado pro pau. Claro, dá merda novamente. Sem droga pra usar no xadrez enquanto esperava o julgamento, bateu aquela crise de ansiedade e quando foi levado diante do juiz tava mansinho, faltava a branquinha pra lhe dar aquela coragem de antes. Implora por misericórdia, mas o juiz o sentencia a 99 anos de prisão a serem cumpridos na famosa prisão de Folsom. 

Os últimos versos são de uma voz na cabeça do agora prisioneiro que lhe diz pra deixar o whyskey de lado e cair de nariz na cocaína.


 2.  Cocaine – J.J. Cale

Se a primeira música de nossa seleção Aerococa Greatest Hits nos mostra uma consequência terrível do uso da cocaína, Cocaine,  vem se apresentar como sua antítese. Nesta música J. J. Cale nos mostra que não importa qual seu humor ou se o momento da sua vida é bom ou ruim, use cocaína e tudo se acerta.

Se está deprimido cheire uma carreira, se seu time ganhou um título importante dê uns tecos, se você vai dar um rolê, ir numa festa, dê uns “tiros”, tudo ficará mais emocionante e intenso. Use cocaína e a sensação ruim causada pela tristeza vai passar e a sensação boa da felicidade vai se intensificar, a festa e o rolê vão ficar mais divertidos sem a menor dúvida. 

Cocaine teve sua fama alcançada muito mais por causa de Eric Clapton do que de seu compositor J.J. Cale. Contudo Clapton teve a cara de pau de dizer numa entrevista que Cocaine é uma música anti-droga. Certamente Clapton tinha algum motivo pra dizer isso, provavelmente uma tentativa de fazer um mea culpa, pois a letra é claramente uma exaltação à cocaína. 

Clapton estava limpo à época e havia se conscientizado sobre os perigos do vício ao dar essa entrevista, Nesta mesma entrevista diz ter parado de tocá-la e ainda que via uma forma positiva de tocá-la sob uma perspectiva que aborde as consequências do uso da cocaína. Para isso ele cita o verso “If you wanna get down, down on the ground; cocaine” (Se você quer descer, descer até o chão; cocaína). Esse é o único verso da música que se pode atribuir uma aura negativa ao uso da cocaína, porém todo o resto é uma exaltação à mesma. Desculpe tio Clap, mas essa é uma música sobre como é bom pra caralho usar cocaína. 

J. J. Cale coloca a cocaína em todos os momentos de sua vida, isso porque, como diz o refrão da música, a cocaína não mente. Mas eu tenho pra mim que o J. J. Cale na verdade tinha um vício crônico em cocaína quando escreveu essa música, só acho. Ainda vou ousar a dizer que ele tava no auge do uso do pó, aquele momento antes de ultrapassar o limite e cair na desgraceira total. 

Portanto amiguinhos, tenham cuidados com as ideias erradas do vovô Cale, permaneça no Dollynho. Troque a palavra cocaína pela palavra Dollynho e tudo se resolverá, a música ficará segura ate mesmo para menores de dezoito anos e será uma terapia praqueles que lutam contra o vício.


3. Cocaina – Sabotage

Sabotage narra nos versos de Cocaína toda dinâmica do tráfico dentro das favelas. O ponto central é o modo como a vida das pessoas é afetada por essa estrutura arquitetada por uma engenharia social perversa, que usa a mídia como instrumento que cria a ilusão de que a fonte do problema ligado ao consumo das drogas vem das periferias.

Quando na verdade está nos gabinetes de quem governa o pais, onde são planejadas as operações do tráfico que vão botar a droga dentro das favelas, mas também nos condomínios de luxo, onde também existem bocas. Só que estas não sofrem com as batidas e esculachos diários da PM. O helicoca do Aecin taí como prova, assim como o Aerococa presidencial, de que as megaoperações de tráfico de drogas são coordenadas por gente engravatada e poderosa. 

Sabotage fez os corres dentro da estrutura de tráfico estabelecida nas quebradas e por isso narra com propriedade sobre o estrago feito pelo pó na vida de pessoas com as quais convivia. Fala da dificuldade de se livrar do vício e a dinâmica existencial que este impõem ao dependente químico. Cocaína, do Sabotage, trata de uma realidade social caótica, sem esperança e sombria, cujo controle está nas mãos de terceiros, que abastecem de droga as favelas e as criminalizam, fazendo um jogo político abjeto, covarde, que sustenta um discuso anti drogas hipócrita, mas que garantem votos e eleição. 


4. Snow Blind – Black Sabbath

https://youtu.be/h_j_48G2L_o

Snowblind nos coloca dentro da viagem de quem acabou de dar fim em algumas carreiras de pó. E olha que nisso o Black Sabbath era especialista nos anos 70. Em suas autobiografias, Ozzy (Eu Sou Ozzy) e Toni Iommy (Iron Man) revelam vários episódios em que a tônica consistia em cheirar alucinadamente.  Quando iam gravar um disco levavam sacolas (será que alguma continha algo próximo àqueles 39 kg?) de pó e passavam dias enfurnados no estúdio cheirando, compondo e gravando. Iommy chega a dizer (ou terá sido Ozzy?) em sua autobiografia que o Sabbath era uma banda de cocaína que tocava rock´n roll, tamanho era o excesso de consumo da substância.

Diferentemente das músicas anteriores, Snowblind narra uma viagem sob o efeito da cocaína, descrevendo uma atmosfera fria, que paira sob uma paisagem gélida. Aqui está nevando ,literalmente,e e a neve preenche todo campo de visão e gera sensações que percorrem as veias, atingem o cérebro, a imagem do sol é usada para contrapor forças contrárias, o calor gera desconforto, apenas o frio consegue causar satisfação. Não é o brilho do sol que conforta, mas o brilho arrepiante da neve.

As metáforas criadas em torno da representação da neve são incríveis e nos colocam diante de uma viagem fantástica dentro do efeito da cocaína. Há uma estrofe que descreve uma imagem forte acerca da sedução que a cocaína gera sob seu usuário:

Don’t you think I know what I’m doing
Don’t tell me that it’s doing me wrong
You’re the one who’s really a loser
This is where I feel I belong

Nela o eu lírico se coloca numa condição de plea satisfação sob efeito da cocaína. Ataca quem tenta lhe aconselhar sobre os perigos a que está exposto ao se deixar levar pela substância. O último verso “Sinto-me pertencente a este lugar” mostra a completa entrega ao pó e o desejo profundo de desfrutar de todas as sensações que ele pode despertar.


5. Overdose de Cocada – Bezerra da Silva

Bezerra da Silva dominava a arte de jogar com os múltiplos sentidos das palavras e expressões que animam o imaginário popular. Em Overdose de Cocada, a palavra cocada é usada para criar um duplo significado para a expressão “cocada boa”. A grafia nos leva a conceber o quitute vendido em padarias, vendas e pelas baianas de acarajé, contudo a fonética nos leva a pensar em cocaína, também conhecida pela sua abreviação coca. Isso porque ouvimos a expressão como se fosse ” É coca da boa”. 

A criatividade do sambista ao criar um jogo de linguagem alicerçado em estrofes que ora remetem à venda do doce, ora à venda da droga, gera não só um contexto permeado por humor já característico do Bezerra, mas de crítica social, uma vez que descreve as interações entre ambulantes e traficantes de um lado e a polícia do outro. Inclusive dando a entender que rola uma passada de pano dos policiais conforme vemos nesse trecho:

Houve uma diligência
Só para experimentar
Eles provaram da cocada
E disseram doutor
Deixa isso prá lá!
Só porque…

E os gambé aliviam só porque É cocada boa!!


6. Um Bom Lugar – Sabotage e Black Alien

Essa música entrou por causa de dois versos cantados por Black Alien na participação que faz nesse clássico do álbum Rap é Compromisso do Sabotage. Os versos foram proféticos:

Quem tá no erro sabe
Cocaína no avião da FAB


7. Bales of Cocaine – The Reverend Horton Heat 

Agora vamos com o coutry mais pesado e intenso da The Reverend Horton Heat e seus fardos de cocaína voadores. Nessa balada coutry um fazendeiro preocupado em trabalhar nas suas plantações e se depara com uma situação inusitada, fardos de cocaína caindo no solo de sua propriedade. 

Não tenho dúvida de que muita gente por aí anda pensando no que poderia fazer com esses 39 kg de cocaína encontrados no avião oficial do presidente Bozo. Certamente são os mesmos planos do fazendeiro de Bales of Cocaine. Ir pra cidade grande e vender tudo, ficar milionário e ficar de boa curtindo a vida. Reservar um pouquinho do pó só pra curtir em momentos de comemoração e outras ocasiões especiais.  

Esse é o típico delírio de fissurados sempre desejos de curtir o próximo teco. Mas quem sabe se pensar positivo esse delírio se concretize. Certamente milhares de maconheiros, ao estarem chapados, viajaram em toneladas de maconha caindo do céu durante muitos anos, até que em 1987 esse delírio coletivo se concretizou.

Não caíram fardos do céu, mas vieram latas boiando pelo mar até as praias dos litorais fluminense e paulista. Cerca de 15 mil latas, onde estavam escondidas 22 toneladas de maconha boiavam no mar quando pescadores encontraram as primeiras amostras. Esse episódio ficou conhecido como Verão da Lata e virou filme que você pode assistir clicando bem aqui.


8. Master Of Puppets – Metallica

Master os Puppets dá voz à própria cocaína. O eu lírico se personifica na substância que assume o protagonismo e comunica suas reais intenções  ao estabelecer relações com aqueles que a procuram. Essa representação antropomorfizada da cocaína é feita para discutir a relação entre a droga e seu usuário. Assim é dada à cocaína o status de mestre e ao usuário o de seu escravo. 

Nada de romantizar a relação com as drogas ou glamoriza-la. Em Master of Puppets a cocaína se apresenta como um tirano cujo propósito consiste em exercer o domínio sob seus comandados sem nenhum tipo de piedade. Ela se mostra extremamente sádica, obtendo seu prazer através do exercício de seu poder quem se encontra sob seu domínio.

Não a toa o seu título ser justamente esse, que em bom português significa Mestre das Marionetes. O viciado está numa condição de total submissão e acaba tendo sua vontade anulada pelo seu mestre que assume o controle e determina suas decisões. Assim escolhas são feitas a partir das determinações desse mestre implacável. Sobra à marionete a sensação de impotência e total incapacidade de se afirmar sua subjetividade.  

Temos nessa elaboração dessa metáfora uma forma de expressar a luta de integrantes da banda contra o vício em cocaína e heroína. As imagens criadas são muito pesadas e impactam, dando a dimensão do pesadelo no qual estão imersas as pessoas viciadas em cocaína. Alguém precisa mostrar Master os Puppets urgente pra Eric Clapton para que ele saiba reconhecer uma música de temática antidroga.


9. Truckin – Grateful Dead

Nessa música do Grateful Dead a cocaína ocupa uma posição de figurante aparecendo apenas pra ilustrar um ponto em que seu uso se faz necessário para se manter na estrada. Truckin´ é uma road song em que um viajante narra suas experiências nas estradas e nas cidades onde vai passando. Podemos ver que esses roles de uma cidade para outra exigem concentração e atenção, assim uns tecos entre uma cidade e outra funcionam como bom estimulante para se manter na atividade.


10. Can’t You Hear Me Knocking – The Rolling Stones

Chegamos ao final com uma música que aborda não o uso, os efeitos devastadores ou saborosos da cocaína, mas que trata da sua falta, a fissura, a abstinência e a busca desesperada pela substância a fim de saciar esse desejo enlouquecedor.
A palavra cocaína é mencionada em um único verso de Can’t You Hear Me Knocking (Você não me ouve batendo?). Porém sua menção é suficiente para fazermos as associações nos versos que se seguem. Trata-se do verso “Y’all got cocaine eye” (Todos vocês tem olhos de cocaína) claramente uma alucinação de um viciado sob efeito da abstinência daquela substância que vê refletida pelos rostos de todas as pessoas que encara.
 
Essa interpretação se sustenta nos versos da estrofe que se segue:

Can’t you hear me knockin’ on your window (Você não me ouve batendo na sua janela?)

Can’t you hear me knockin’ on your door (Você não me ouve batendo na sua porta?)

Can’t you hear me knockin’ down your dirty street, (Você não me ouve batendo na sua rua suja?)

yea

Vemos o surgimento de uma pessoa em completo desespero querendo a todo custo encontrar alguém, provavelmente seu fornecedor, ou aquela figura que vai salvar. O cara tenta se fazer ouvir pela porta, pela janela, pela rua suja, o que dá indícios de se tratar de um lugar em que se pode encontrar a cocaína e finalmente dar um fim ao suplício. Contudo a busca é infrutífera e o viciado segue sua busca efêmera, movido pela fissura, pela sede que o consome.

Help me baby, ain’t no stranger   (Ajude-me, baby, não sou nenhum estranho)

Help me baby, ain’t no stranger   (Ajude-me, baby, não sou nenhum estranho)

Help me baby, ain’t no strange    (Ajude-me, baby, não sou nenhum estranho)

Esse verso que se repete ao longo dessa estrofe imprime ainda mais dramaticidade à situação do junkie, dano nos a impressão de que a demora em satisfazer seu desejo intensifica os efeitos da abstinência sobre ele. Beira a humilhação, mostrando a completa perda de amor próprio e a disposição a fazer qualquer coisa para ter sua necessidade saciada. As duas estrofes que se seguem descrevem a via crucis que continua se desdobrando gerando situações cada vez mais degradantes.
Vamos nos ater aos versos finais que levam a um desfecho angustiante.

Hear me howlin’       (Ouça-me uivando)

And all, all around your street now       (E tudo, por toda a sua rua agora)

Hear me knockin’       (Ouça-me batendo)

And all, all around your town       (E por toda, toda a sua cidade)

Esses versos revelam o desespero causado pela falta da cocaína, intensificado pelo fracasso em consegui-la. Colocando o junkie em completo estado de aflição, levando ao descontrole que se manifesta em uivos e deslocamentos aleatórios pela rua, batendo em portas a procura de atenção, depois pela cidade numa agonia extremamente aguda e perturbadora.

Aerococa Greatest Hits
Por Carlim

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