NegaFya e Visioonarias – Mulheres Negras na luta no Hip Hop BA Parte 1

NegaFya e Visioonarias, excelentes amostras da riqueza do Hip Hop Ba feito pelas pretas, uma poetisa nervosa e uma dupla começando os corres

Africanas na luta 2

 

Marcadores raciais de forte relevo são elementos que tomados dentro de uma sociedade racista como a brasileira na maioria das vezes se transformam em formas de invisibilidade. E como obviamente podemos entender, artistas precisam de um público por vir, para que consigam se manter fazendo aquilo que amam. Começamos uma série para trazer ao público trabalhos do rap Ba feito por mulheres negras que muitas vezes encontram serias dificuldade para produzir e quando conseguem vencer as diversas dificuldades, muitas vezes tem seus trabalhos caindo no vazio.

Sendo assim sentimos a necessidade de além de noticiar como já fazemos diuturnamente, juntar algumas das pretas mil e um graus do rap baiano em duplas em séries especiais. O desejo é ver a formação de uma guerrilha potente suficiente e se auto fortalecendo de modo a criarem e dividirem público e palco, condições de produção, parcerias e outros mecanismos de fortalecimento mutuo. Quem sabe Sil Kaiala volta aos palcos e as produções. 

Fabiana Lima, nome civil da guerrilheira poética NegaFya, faz parte do importante grupo de poesia Resistência Poética. Moradora do bairro da Sussuarana, a poetisa, MC, artista de rua, produtora e ativista cultural vem produzindo excelentes trabalhos sociais, poéticos e políticos em sua caminhada. Fazendo com maestria parte da linhagem diaspórica daqueles e daquelas que transformam nossa dor em luta. Vencedora de diversos Slams, representante baiana em torneios nacionais, temos diante de nós e compondo com muita qualidade a cena do hip hop baiano, uma jovem mestra da arte do Spoken Word.

Há pouco tempo NegaFya começou a soltar lindos trabalhos audiovisuais em seu canal no youtube, como é o caso da quente F.R.E.N.E.S.I. com a participação de Rilton Junior. Uma produção da ORUN, contando com a direção de Gabriel Oliveira que abriu com a qualidade já conhecida essa estreia em canais virtuais da impactante poética que participantes da cena soteropolitana já testemunha presencialmente nos Slams da Onça, por exemplo. 

Poesia preta, feita por uma mulher que utiliza seu talento poético para denunciar em sua nova produção uma situação existencial que muitas mulheres negras enfrentam no seu cotidiano. A objetificação que as trata como descartáveis, como objetos socialmente desvalorizados. Nosso racismo como construção secular, cheio de artimanhas e mecanismos de separação entre o nosso povo, criou essa faceta onde mulheres plenamente melaninadas, são vistas como mero objeto de prazer.

Um mecanismo social que produz o que NegaFya aqui denuncia: “A Solidão da Mulher Petra”, mais um dos efeito do racismo que pretende desumanizar nossas mulheres. Projetando-lhes características hipersexualizadas ao mesmo tempo em que retiram-lhes a beleza que lhes é intrínseca. Homens negros e brancos que não encontrariam aí o respectivo status social de se relacionar com mulheres mais claras ou brancas, seguem a linha racista de desvalorizá-las sutil ou abertamente, não assumindo relacionamentos, utilizando a forma: amor livre para esconder seu racismo. 

O vídeo clipe brilhantemente dirigido por Fabíola Silva, traz diversas faixas etárias das nossas guerreiras pretas que sempre estão lá na contenção, historicamente responsáveis por sustentar nossas famílias em todos os aspectos. Um clipe que utiliza uma bonita fotografia deixando evidente a beleza, mas também na voz e nas palavras de NegaFya, a inteligência voraz e sagaz que não se cala. O acompnahamento musical é de um dos produtores que tem mais e melhor atuado na cena rap, hip hop de Salvador, o onipresente Dactes Beats.

Com um áudio visual muito bem tramado, é literalmente o nascimento público em larga escala dessa dupla que já mostra muita qualidade nesse primeiro trabalho. Prenhes de idéias e flow, a dupla Brena Èlem & Udi Santos, formam essa visão a frente do tempo, que vocês podem chamar gentilmente de Visioonárias.

Com essa primeira faixa, Visionárias chega num beat foda do Henry Mc 71, com o seu primeiro single, onde já podemos notar as minas metendo o pé nos trilhos do rap pesado e preenchido de conceitos que se diferenciam do que elas consideram engodo, embuste. O audiovisual conta com a produção do Coletivo Cutucar e às captura bem próximas da estação do trem, e por cima dos trilhos não querem dizer outra coisa que não: o nascimento de uma dupla com disciplina e visão.

O nome do grupo já denota essa perspectiva, que fica muito escurecida quando as mesmas se diferenciam do feminismo para afirmar o pensamento mulherista, de cunho Pan-Africanista. “Chegando pra causar inflamação” é outro signo interessante, presente no seu refrão, pois pode ser interpretado como uma afirmação contrária ao andar numa linha política ou moral hegemônica dentro do que vemos e ouvimos cotidianamente no rap.

Como Udi canta logo no seu primeiro verso: “Preta suburbana é game over/ programa educativo lá em casa é sem Discovery”, marcando sua posição privilegiada na escala social, capaz de ver de baixo pra cima, a diversidade de formas de opressão que concorrem para lhes empatar ou finalizar seus caminhos.

Com o single videoclipe Visionárias, as minas dão a partida da estação, deram o start numa composição desse trem bala que é o rap feito por mulheres pretas na Bahia, esperamos que permaneçam nos trilhos apesar de todas as dificuldades que sabemos existir, para se chegar no destino visionado.

 

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