Viktor Arkad pediu dupla: “A De Fora é a Minha (2022)” – Resenha

Viktor Arkad lança o seu trabalho solo: A De Fora é a Minha (2022) com produção em alto nível e um jogo que une a tradição e a modernidade.

Viktor Arkad

Abraçando o antigo e o moderno com a sutileza e maestria que só o tempo nos permite obter, Viktor Arkad nos entrega o EP: A De Fora é a Minha (2022), um trabalho composto por 6 faixas, musicalmente rico, consistente e cheio de referências. Mostrando que – de chuteiras ou descalço – segue sendo “jogador-caro” e que antiguidade é posto.

Desde o longínquo ano de 2006, período em que ao lado de seu parceiro Miedson, Viktor Arkad esteve a frente do grupo Atitude Diferenciada, quando o grupo nos entregava o icônico álbum: Preparado Para Batalha, ali o MC já demonstrava (ancorado em beats clássicos de boombap) toda a versatilidade que o consolidou como um dos grandes MC’s de sua geração.

Passou-se então por uma longa “hibernação artística” de 16 anos até que que Víctor, agora Viktor Arkad, nos entregasse seu mais novo trabalho, dessa vez em carreira solo, na retomada de sua carreira musical.

O baba é a vero e sem espaço para “sub-20”.

Arkad é conhecido entre amigos, produtores e pelos mais próximos, pelo seu alto grau de exigência na elaboração e execução de seus trabalhos e com: A De Fora é a Minha (2022), não poderia ser diferente. A escolha do time para trabalhar ao seu lado nessa empreitada musical foi feita de maneira criteriosa e o resultado não poderia ter sido outro que não fosse um trabalho de alto nível no Rap nacional.

Arme seu baba e desça pra arena:

Contando com a produção da MPN Records (formada pela dupla criativa: André That Hora e Raonir Braz) e de Faustino Beats, nomes talentosos e importantes para a construção da cena contemporânea do rap baiano, e que dispensam apresentações prévias. Com os scratches precisos de DJ Poeira, feats de Bia Porto e Therr San, o design ficou a cargo de Rafael Oliveira e captando a atmosfera do disco, o olhar fotográfico de Rafael Ramos, Thássio Reis na direção criativa e completando o time, Vovô no Beat (Braian, do lendário grupo Filosofia de Rua) na captação de voz de Bia Porto e fechando a pesada equipe criativa o já consagrado Raonir Braz na mix e master do disco.

A De Fora é a Minha (2022):

Sobre um sofisticado beat em que o pagodão flerta com o grime, Arkad dixava suas linhas num ritmo suingado, narrando suas vivências em metáforas futebolísticas que qualquer morador de periferia e amante do futebol de cara já se identifica, além de uma sonoridade moderna, a track resgata um elemento primário e essencial do Rap há muito esquecido pelos artistas da nova geração: o scratch. Que aqui ficam a cargo do experiente DJ Poeira, parceiro de longa data do MC.

“Eu & Você” sem dúvida figura entre os trabalhos mais ousados e experimentais do artista ao longo de sua carreira. Nessa lovesong, o artista sai de sua “zona de conforto”, do Rap clássico e mergulha na fusão Arrocha-Trap, trazendo uma sonoridade singular que só poderia ser concebida na Bahia, ideal para escutar em looping com a cremosa do lado.

“Sextoou” abre “os trabalhos” no dia oficial da esbórnia em grande estilo, em que traz um contraponto com Eu & Você, onde vemos a love “song-frência” do último romântico, mas que aqui o malandro vai pra pista desopilar “nos reggaes” das noites quentes soteropolitanas. O beat de reggaeton e afrobeat mesclados ao samba-reggae dão o tom dançante que a track oferece.

Já com a faixa “Em Minha Fé”, Viktor Arkad revisita o Rap clássico, com beat de boombap, onde captura elementos de samba, que logo vira para um beat tenso de Trap, com pinceladas sutis de boombap, em que numa audição desatenta o ouvinte pode até não perceber e se passar na sofisticação das variações rítmicas que o som nos propõe.

Uma canção potente, de forte identidade musical, com produção assinada pela dupla criativa da MPN Produções e Faustino Beats – outro notável beatmaker baiano – num estilo clássico que consolidou Viktor Arkad como um dos grandes letristas de sua geração. A track que com pouco menos de três minutos nos entrega toda sua carga ideológica, numa tensão que contrapõe boa parte do disco.

Uma mensagem urgente e direta, numa época em que o efêmero cada vez mais se torna regra, aqui o poeta segue versando sem freio e mostra que dentro do seu campo divaxa seus versos em qualquer posição das quatro linhas. Do abstrato ao concreto, a regra é: não desperdiçar versos.

A sinergia contida em “Game On” é o resultado de toda a efervescência sonora contida na mistura de ritmos que dão vida a track. A faixa se apresenta como uma das mais dançantes de todo o disco. A ousada mistura de elementos de Trap, Funk e música eletrônica deu origem a uma sonoridade pesadíssima, ideal pra bater certo nos paredões de Salvador.

#VVV: Dentre as obras que compõem o mais novo trabalho de Viktor Arkad, VVV foi a track que primeiro me foi apresentada. Tive o privilégio de ver a construção dessa obra e sem dúvida é uma das melhores canções que o MC nos apresenta.

A mescla de beats suingados com outros mais introspectivos, variações rítmicas e rimas versáteis, aliadas ao vocal lírico e afinado de Bia Porto, fazem dessa uma das melhores canções que compõem a obra.

Aqui, Arkad esbanja boa parte de seu sofisticado repertório, trazendo suas vivências e percepções em linhas metafóricas sutis e que se você viajou na letra e não castelou a luxuosa produção do beat, que assim como em Minha Fé, é assinado pela dobradinha entre MPN Produções e Faustino Beats – sem problemas… só dar o play novamente, pois esse som é foda…!!!

Ao discorrer pelas 6 faixas que compõe todo o EP, o artista não mede esforços em ousar e arriscar, e em razão disso não põe barreiras na construção de suas obras, seja na parte musical (beats) ou na construção de suas letras, aqui sua arte se apresenta livre de amarras… livre no real conceito.

A simetria entre futebol e Rap que permeia: A De Fora é a Minha, também não é jogada ao acaso, não é algo gratuito ou meramente estético, temático ou figurativo na obra de Viktor Arkad. Esses universos de fato dialogam entre si e Arkad tem propriedade para falar sobre o que escreve. Neste sentido, é curioso e fundamental perceber como um “velho” jogador volta ao “game” resgatando a simplicidade de avisar/pedir a próxima rodada, que na Bahia se configura em pedir a “dupla”, independente do tamanho do campo. 

Filho nato da Boca do Rio, pedaço de terra importante, localizado no coração de Salvador, prolífico em produzir grandes boleiros e também grandes MC’s. É ali também onde o artista viu e ver surgir o tempo todo tantos craques – dos campinhos de terra e no Rap, é também onde primeiro fincou as bases sólidas de seu QG. Foi a partir dali que Viktor Arkad entendeu que com o passar do tempo, devagar também é pressa e muitas vezes é mais importante que a bola corra, o jogador se preocupa com o posicionamento, com a marcação e com os outros fundamentos necessários ao bom jogo, A De Fora é a Minha (2022), prova isso.

Viktor Arkad pediu dupla, A De Fora é a Minha (2022)  – resenha

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