Coronel bateu um papo com o Oganpazan abordando de sua fase inicial de raps motivacionais até o seu momento atual na sujeira!
Quem curte rap nacional underground e não está parado no tempo com saudosismos, certamente já ouviu algum som do rapper e produtor mineiro Coronel. Desde a época dos raps motivacionais ou “maromba” que marcou os primeiros sucessos na carreira do artista, Coronel já vem fazendo barulho na internet, nas ruas e na cena under brasileira.
Com o tempo, seu som migrou para algo mais denso e reflexivo sem deixar de lado a resiliência e resistência presente nas letras de outrora. Com diversos trabalhos lançados nas redes que vão desde feats com nomes como LetoDie e Mateus Coringa até singles e álbuns como o seu mais recente “O RETORNO DO BOOMBAP” (2021), Coronel já provou que é um artista diferenciado e que não tem medo de se colocar dessa forma na cena. Por isso, fizemos questão de levar uma ideia com ele. Sem mais delongas, saca só a “resenha”!
Conta um pouco das suas influências musicais? Sei que é bem diversa e pesada, passando por nomes que vão desde 50 Cent a Tyler, The Creator…
O primeiro contato que tive com música primeiramente foi quando eu era bem novo, vim de uma família em que todo mundo cantava e tocava algum instrumento e eu ficava admirado com o talento da minha família, tendo em vista que meus tios e meus pais aprenderam com os pais deles, e na época não tinham condições de escolas músicas nem nada do tipo, aprenderam a tocar instrumentos em casa, que vão desde violão até sanfona, aprenderam com meu avô! O contato com rap veio ali por volta de 97, meu pai tinha um aparelho de vinil e tinha um disco do Racionais, era Sobrevivendo ao Inferno, apesar de muito novo na época eu pude entender as mensagens que passavam sobre onde moravam, como agiam e como influenciavam tanta gente mais velha e mais nova na época, o que me deixou admirado e com vontade de um dia ajudar pessoas através de música como faziam, e isso até hoje né!
Depois descobri os rappers internacionais e o primeiro foi a lenda Tupac, o primeiro som que ouvi foi “Hail Mary”, e bateu bem forte em mim, depois descobri 50 Cent, na época das mixtapes, e a primeira dele que ouvi foi a mixtape Power of the Dollar, e brisei na faixa “How To Rob” onde ele praticamente ataca os rappers da época que mais faziam sucesso, e me identifiquei porque eu desde sempre fui de falar o que me vinha na cabeça, desde que eu tinha convicção do que eu tava falando. Foi aí que ele tornou o artista que eu mais ouço e que mais me identifiquei, e por ele se considerar ser o General do rap, daí veio meu nick de Coronel!
Tyler, The Creator descobri um tempo depois, e cara, aquelas letras todas pesadas, mas ao mesmo tempo em batidas delicadas com sua voz insana e transmitindo toda a imposição através da música, coisa que dava pra sentir o que ele queria realmente passar, era surreal de ouvir, e foi mais uma de minhas influências!
Como você desenvolveu seu vocal típico e marcante no rap nacional? Como era a recepção hoje e como é hoje?
Essa é engraçada, eu sempre gostei de imitar pessoas, personagens de jogos, fazer várias vozes porque eu gostava de ver a reação das pessoas, só que no primeiro som que lancei não tinha definido ainda como cantar, o tipo de voz, entonação, e resumindo, é um som que dava sono nas pessoas por causa de minha voz, sem imposição vocal, não transmitia nada (…) Daí passou um tempo, escrevi uma coisa que eu julguei ser daora, mas que precisava de alguma imposição porque era um som totalmente voltado a dar força pro pessoal, motivar sabe!? Na época eu grava por microfone de web cam, fiquei horas tentando várias vozes na frente do microfone, daí saiu uma coisa meio rouca, mas fui aperfeiçoando com o tempo e cheguei no vocal que tenho hoje, estudando sobre como manter sem me prejudicar, e hoje em dia canto com super tranquilidade!
No início as pessoas tomaram um choque porque nunca tinham ouvido nada parecido até então pelo underground, vi que gostaram, o que me motivou ainda mais a trabalhar nisso e deixar minha voz melhor e melhor a cada som, e de lá pra cá teve super diferença nisso. A principal delas foi que eu aprendi a me impor com a voz que eu canto e consigo passar pro pessoal realmente o que tô sentindo com isso!
E suas letras sujas e reflexivas ao mesmo tempo? Como se deu seu amadurecimento em relação a isso ao longo do tempo?
Cara, minhas letras são simples demais, ao meu ver, porque tudo que passo nelas são coisas que eu já vivi ou vivo ainda, já passei por vários perrengues onde eu só tinha a música pra me expressar porque eu sempre fui de guardar problemas comigo. Então, eu só me via ali escrevendo, mas ao mesmo tempo eu pensava também que, não poderia passar só agressividade, porque desde sempre eu tinha ciência de que se algum dia eu chegasse longe fazendo música, outras pessoas de certa forma iam se influenciar com aquilo, se identificar com aquilo, então eu tinha um certo cuidado também e mantinha o equilíbrio entre mesmo estando com raiva. Queria que as pessoas refletissem sobre o por que de eu ter chegado naquele ponto, o por que de eu estar fazendo aquilo, através de reflexões, e graças a Deus a recepção sobre isso foi maravilhosa, até hoje várias pessoas chegam em mim dizendo que de certa forma minhas músicas já tiraram a pessoa da pior. Essas letras já ajudaram muito, então é gratificante demais pra mim, não tem preço!
Seu álbum mais recente traz letras mais abstratas e o marcante beat do boombap. Como foi essa escolha e como rolou a participação do Mateus Coringa nesse trabalho?
Desde sempre eu sou apaixonado por boombap, eu respiro boombap e quem me conhece de perto sabe muito bem disso. Tanto que em qualquer momento que você chegar aqui em casa, ou eu vou estar produzindo ou escutando boombap! E como todo mundo sabe, o que tá mais em alta hoje em dia é o trap, e tendo em vista que eu amo boombap, eu decidi “nadar contra a maré” e fazer um disco só de boombap; apesar de que o boombap nunca foi embora. Decidi colocar o nome de “O RETORNO DO BOOMBAP” pra mostras às pessoas que um dos pilares de tudo que tem hoje, é o boombap!
E Coringa é um mano que eu escuto desde sempre, do underground, inteligente, sujo, cheio de coisinhas por trás das letras, coisinhas que eu digo é que ele é super metódico, lógico, sujerada e é isso que eu gosto. Um cara super gente fina que eu tenho o prazer de chamar de amigo, e quando eu chamei ele pelo Twitter, ele disse que já tinha ouvido algo meu, daí tipo, pra um fã dele igual eu sou, fiquei feliz demais da conta e resultou na faixa FRIO do meu último álbum!
Recentemente, na internet, já vimos o primeiro lançamento “HISTÓRIAS” do seu próximo álbum que já está saindo do forno. Pode falar um pouco mais sobre isso?
Então, meu próximo álbum é bem voltado pro lugar onde eu fui criado, o nome do disco vai se chamar “QUERÓ” que é o nome do morro onde eu vivo desde sempre, o famoso Morro do Querosene (Governador Valadares, MG). Vai ser totalmente voltado pra cá, pra minha quebrada, pra quem vive nela, pra quem não tá mais entre nós, sobre como tudo por aqui mudou durante todo o tempo em que vivo aqui, sobre essa menorzada que tá vindo agora. Então, assumi a responsabilidade a fazer essa dedicatória vindo do lugar que eu vim, meu morro, e podem esperar muita coisa, boombap, trap, drill, funk, tudo do jeito que Coronel sabe!
Muito obrigado pela entrevista, Coronel! Quer acrescentar algo mais?
Eu só quero agradecer a oportunidade desse espaço que me foi dado, de coração mesmo, isso é muito importante, muito importante estar aqui trocando essa ideia e saber que consequentemente meu trabalho tá chegando onde tem que chegar. Então, obrigado pelo espaço e Outubro tem álbum!
-Reflexivo e visceral: um bate-papo com o rapper e produtor mineiro Coronel
Por Gustavo Marques
Fotos que ilustram a matéria por Julia Andrade