“Mais uma Estória” música do mestre Gog, não se tornou um hit histórico mas pode ser considerada um clássico perdido!
Quando chega as lojas o álbum: CPI da Favela (2000), o último com a formação clássica do incendiário quarteto de Brasília (Gog, Dino Black, Japão e Mano Mix), Genival Oliveira Gonçalves, já era considerado o “Poeta do Rap Nacional”. Por conta de sua singular construção poética e das suas importantes contribuições na construção da identidade Rap nacional, Gog já tinha esse título.
Canções épicas como “Ei, Presidente”, “É o Terror” e a genial “Brasil com P”, são clássicos absolutos na arte do canto falado e todas pertencem a esse grande disco. Mas é sobre outra preciosidade desse grande álbum que gostaria de “falar”. A música: “Mais Uma Estória”.
Um storytelling de “todos nós nas periferias”?
Se ver diante das contradições e transformar a realidade a sua volta em poesia cantada, não é para muitos. Gog possui essa capacidade com maestria, narrando um storytelling sem romantizar a história e a rotina dos seus universais personagens. Com uma qualidade poética capaz de nos fazer tocar a carne daquelas pessoas. Há em “Mais uma Estória” uma grane abertura de direções às quais o ouvinte é levado a perceber as pluridimensões daquelas existências. O social, pessoal, histórico, político, religioso, são algumas dimensões que conferem a essa letra o seu lugar na nossa história.
Afirmação da importância musical e política da palavra cantada?
Porém, em “Mais Uma Estória”, o poeta Gog, consolidava ainda mais o gênero musical Rap, como um dos mais importantes da música no Brasil do final do século 20. Mais Uma Estória pode até não ser considerada um hit para alguns, mas aqui a construção poética de Genival, aliada a luxuosa produção do grande DJ Raffa, o qual dispensa apresentações prévias e o vocal poderoso de Angel Duarte nos refrões, atestam a qualidade incontestável dessa obra em todos os seus aspectos.
Musicalmente, a produção do DJ Raffa apela para uma base recheada de soul music onde as batidas se apaziguam ao baixão e ao violãozinho que conduz a melodia. O refrão de Angel Duarte é marcante e nos entrega um fatalismo que é de certo modo desmetida pelos versos de Gog: “Nasce um homem pobre, seu destino é sofrer”. Dizemos de certo modo, porque a complexidade de vidas narradas pelo poeta do Rap, nos mostra que esse destino é uma construção. E sendo um processo múltiplo essas vidas não se resumem ao sofrimento. Algo inclusive na brincadeira entre as palavras história e estória, “Mais uma Estória” é a “estória” de muitos dos nossos mas sempre passível de mudanças e permanências, como a história e Gog nos ensina.
Diálogos rebeldes com a “MPB”
Puxando rapidamente da memória, sem fazer uma consulta prévia mais aprofundada, me vem à cabeça canções como: “Geni” e “Construção”, ambas de Chico Buarque. “Admirável Gado Novo”, de Zé Ramalho, “Haiti” de Caetano Veloso e “Pra Dizer Que Não Falei de Flores”, de Geraldo Vandré. Esses são alguns exemplos de canções fortíssimas dentro desse recorte poético-social e não é difícil perceber como o texto de Gog se equivale tranquilamente ao desses outros grandes poetas da nossa música.
Quando em 2015, Gog nos entrega o seu álbum homônimo: Genival Oliveira Gonçalves, (aquela altura, o 10° de sua longa e prolífica carreira), no qual continha a linda “Desconstrução”, sua “versão-homenagem” para a obra original de Chico Buarque, e que à época havia sido elogiada pelo próprio Chico, naquele período, Gog já figurava entre os grandes mestres escribas do Rap no Brasil e se consolidava ainda mais no panteão dos grandes da dita “MPB”. Mais esse é uma outra Estória…
-Mais Uma Estória – Gog : Desletrificando
Por Paulo Brazil