Bob Dylan – Blood On The Tracks

Quando tudo pesa, quando o ambiente perde cor, definição, sentido e dimensão… Fica um vazio. O próximo passo é oblíquo, à princípio o medo toma conta de cada um de nós e, com isso, a mente não tem mais opções. E para tal só nos resta pregar peças de desconfiança, borbulhando nossa própria mente de uma forma nada positiva, estimulando um temeroso e caótico próximo passo que parece nunca chegar, mas que para ser dado, precisa ser resolvido e zerado para um novo início. Pé direito, pé esquerdo, pé direito…

Esse próximo passo é um novo, completamente independente dos fatos que estimularam o tumultuado anterior, mas as aflições mentais atrapalham a clareza deste raciocínio. O problema precisa ser exorcizado de uma forma que este seja exposto e dissecado. Mas de um ângulo que ainda assim, não seja mais incômodo para que o indivíduo que sofre de tal mazela, possa enfim, dialogar sobre o ocorrido, nem que seja com ele mesmo.

A resolução do problema nunca é a mesma, afinal de contas somos seres inexatos e devemos agradecer por isso. Até por que resolver os mesmos problemas com as mesmas características conclusivas nos faria andar em círculos. Deixaria nossa mente debilitada sem possibilidade de cura. O fato é um só, problemas surgem, somem, ressurgem, mas nunca são os mesmos, o que prevalece é a coragem de tirar aquilo de dentro do peito.

Aquele ponto de saturação. Acordar um dia de manhã com um humor do cão, tomar aquele café velho do seu bule, ver o céu da janela do apartamento e notar que até o tempo anda tirando sarro da sua cara… Não vai adiantar acender outro cigarro e fumá-lo de forma cinematográfica olhando para o nada, tampouco remoer seu insucesso choramingando com aquele moletom velho.

A solução machuca, mas é justamente essa pontada de dor que faz você sair e encarar a vida. Aprenda com quem já sofreu, escute a voz do mestre Dylan ao som de seu trabalho mais sincero e honesto com seus problemas, veja a experiência ao som do icônico e brilhantemente melancólico ”Blood On The Tracks” lançado em 1975.

Line Up:
Bob Dylan (vocal/guitarra/gaita)
Bill Berg (bateria)
Charles Brown III (guitarra)
Tony Brown (baixo)
Richard Crooks (bateria)
Paul Griffin órgão/teclado)
Buddy Cage (steel guitar)
Gregg Inhofer (teclado)
Peter Ostroushko (mandolin)
Barry Kornfeld (guitarra)
Thomas McFaul (teclado)
Kevin Odegard (guitarra)
Billy Peterson (baixo)
Chris Weber (guitarra)
Eric Weissberg (banjo/guitarra)

Track List:
”Tangled Up In Blue”
”Simple Twist Of Fate”
”You’re A Big Girl Now”
”Idiot Wind”
”You’re A Gonna Make Me Lonesome When You Go”
”Meet Me In The Morning”
”Lily, Rosemary And The Jack Of Hearts”
”If You See Her, Say Hello”
”Shelter From The Storm”
”Buckets Of Rain”

Depois que tomei contato, com este que é o décimo quinto trabalho de estúdio do poeta americano, sempre penso em meus problemas com base neste registro.  Aqui o foco da dissipação de percalços é espantar os males da separação que assolou seu casamento com Sara Lowndes. Quando tudo parecia um grande e profundo parafuso emocional, Dylan mostrou por que é de fato Bob e fez de todo esse desgaste amoroso-psicológico, combustível para um de seus melhores discos.

Temos pouco mais de 50 minutos de um Folk-Rock da melhor qualidade e o impacto de seu conteúdo é imediato, ainda maior quando se entende o paranorama das gravações. Pode-se facilmente imaginar nosso heói sentado no sofá de casa com pilhas de papéis e sua viola, tentando retratar o que restou de seu sentimentalismo em frangalhos, de seu coração partido, de sua insegurança e fraqueza abstrata.

É possível ainda notar a dificuldade de se mostrar esse lado ”frágil” que transparece no disco. É difícil assumir as coisas desta forma e talvez por isso que os fãs do trovador vejam esse CD como algo muito maior do que pura fossa. Encoraja você a sair do fundo do poço e, faixa a faixa, parece narrar a evolução de recuperação do próprio compositor, além de nos brindar com letras realmente lindas e que demonstram a dificuldade de se superar um problema, ainda mais amoroso tal qual foi aqui relatado.

O próprio músico se mostrou surpreso com o grande sucesso desse desabafo e isso mostra o caráter genuíno deste LP. Este fora obra do acaso e foi feito da forma que melhor gera ignição no motor de combustão sonora: de forma sincera. Aqui temos um Bob que não tem medo de mostrar que está de joelhos, que chorou e que em certos momentos ficou sem norte algum, muito pelo contrário.

A beleza é justamente sentir que ele admite isso. Até ele, o grande Bob Dylan, já sofreu por amor, já não soube o que fazer… Mais do que isso, teve problemas e os resolveu do seu jeito, minimalista, simples e trovadoresco: cantando e tocando gaita.

A separação deve ser um processo complicado também por isso. O casamento não é uma instituição que foi feita visando um fim, esta convenção foi feita exatamente pensando no contrário, o fim não existe, só o para sempre que pode se perpetuar no tempo.

Mas as vezes não dá certo e nesses momentos você não pode parar e aqui vemos que o bonde seguiu. No começo do disco tenho certeza que o judeu ficou encolhido na janela, olhando e imaginando a vida das pessoas vistas pelo vidro, mas perto do fim ele já estava de pé, de cabeça erguida, sem saber exatamente o que procurar, mas sabendo que já estava apto a voltar a procurar algo.

”Tangled Up In Blue”, ”Simple Twist Of Fate”, ”You’re A Big Girl Now”, ”If You See Her, Say Hello”… Alguns dos capítulos de um disco que por mais que possua dez faixas, poderia ter apenas uma narrando o caminho todo. É com a profundidade e moral de um livro completo que o mestre nos mostra como nós funcionamos quando estamos acuados, se revelando contra tudo e todos, como em ”Idiot Wind”.

Tudo passa, tudo mesmo, se não passar é por que você parou de andar e o perigo é justamente a estática do mesmo lugar. Essa frase não é do Bob, juro.

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