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As novas fronteiras sonoras do Azymuth

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O Azymuth lançou um de seus discos mais disruptivos em 2020. Com uma jornada de mais de 50 anos de história, o trio não para de surpreender.

Senhoras e senhores: Azymuth

O Azymuth é uma das bandas mais originais da música brasileira. Com um repertório capaz de compreender desde um groove de partido alto até o mais swingado Jazz-Funk, o trio formado pelo baterista e percussionista Ivan Conti Mamão, o tecladista Kiko Continentino e o baxista Alex Malheiros, está ativo desde a década de 70 e esses mais de 50 anos de história precisam ser enaltecidos.

Com lançamentos por selos como Atlantic, Milestone e Far Out Recordings, o Azymuth sempre gozou de grande reconhecimento internacional, inclusive o grupo foi o primeiro conjunto brasileiro a se apresentar na meca do Jazz mundial, o Montreux Jazz Festival, durante a edição de 1976.

Após superar obstáculos difíceis, como a morte do tecladista José Roberto Bertrami, em agosto de 2012, Ivan e Alex continuaram a somar no groove, contando com Kiko na formação desde 2015. Tecladista de experiência abundante, já tocou ao lado de nomes como Milton Nascimento, Gilberto Gil, Carlos Malta, Dave Liebman e Eumir Deodato, por exemplo, só quem assistiu o trio com o Kiko consegue perceber sua importância, não só para a continuação da história da banda, mas também para as recentes reinvenções e gravações de estúdio.

O primeiro disco de estúdio que apresentou a banda reformulada foi o elogiado “Fênix“, lançado via Far Out em 2016. Acho que esse título ainda é bastante atual, pois ele resume a capacidade nata que o grupo possui para se reinventar e seguir explorando novas possibilidades de se fazer música. 

Lembro de ouvir o Azymuth com 15 anos de idade e pensar como o “Light as a Feather” possuía uma sonoridade moderna. Para meu espanto, o disco era de 1979 e só quem já escutou esse LP sabe o que estou querendo dizer. Se o “Light as a Feather” tivesse sido lançado hoje, ainda soaria absolutamente fresco e seria possível promover paralelos com artistas da nova geração, como é o caso do produtor, DJ e tecladista Kamaal Williams, por exemplo. Basta ouvir 5 minutos dos groove de sinth do britânico para perceber que ele escutou Azymuth até furar os discos.

O Oganpazan já entrevistou o baterista Ivan Conti e aquela conversa ajuda a entender como os integrantes do grupo continuam produzindo, sem perder a vitalidade e cair na armadilha de copiar a si mesmo. O Mamão, por exemplo, possui projetos que dialogam com a música eletrônica (como o “Poison Fruit“) e o Hip-Hop, por exemplo. Vale lembrar que ele gravou um disco com o Madlib, um dos grandes produtores e DJ’s do Hip-Hop. “Jackson Conti“, lançado em 2008, mostra como a cabeça desses caras possui sua própria frequência e como o grupo está sempre olhando para frete.

Azymuth e Jazz Is Dead

Em 2020 no entanto, o Azymuth lançou um dos discos mais ousados de sua carreira. Como parte do elenco de estrelas da Jazz Is Dead, o trio entrou no estúdio da dupla Adrian Younge e Ali Shaheed (Linear Labs) e gravou um dos pontos altos da primeira leva da lançamentos do selo.  

 

Track List:
“Ao Redor do Samba”
“Sumaré”
“Cat Jump”
“Fall Afternoon”
“Friendship Samba”
“Apocalíptico”
“Pulando Corda”
“Quiet Storm”

Quando vi o nome dos brasileiríssimos João Donato, Marcos Valle e Azymuth no elenco da Jazz Is Dead, fiquei ansioso para observar as paletas musicais que seriam exploradas. No disco de João Donato, é possível perceber como Adrian e Ali tentaram gravar um registro que conversasse com as influências afrocubanas do pianista, além de seu vasto conhecimento das linguagens brasileiras.

Já o disco do Marcos Valle, fugiu dos grooves dançantes que tem sido a tônica de seus lançamentos recentes – principalmente via Far Out – e mostrou os dotes do compositor cantor, com enfoque nas suas raízes na Bossa Nova/Samba Jazz.

Ambos os discos surpreenderam, mas o trabalho do Azymuth está um degrau acima, pois nenhum vinil ou CD da banda, seja ao vivo ou de estúdio, consegue soar nem remotamente parecido com o que foi eternizado no quarto lançamento da série. Isso mostra o arrojo deste grupo que é um dos maiores berços das tradições brasileiras.

Adrian Younge e Ali mostraram um conhecimeno bastante respeitável sobre música brasileira. A dupla selecionou 3 artistas versáteis e foram fundamentais na hora de gravar discos que funcionam como elos perdidos nas discografias do Marcos Valle e do seu comparsa, o Donatão. Mas o caso do Azymuth é ainda mais interessante, pois esse disco não se assemelha com nenhum outro projeto do trio. A chave dessa gravação são os timbres e os novos elementos presentes no groove instrumental da banda, além da forma como eles lidaram com essas novas diretrizes.

É uma experiência e tanto ouvir esse play. É bonito de ver caras como o Mamão e o Alex (com mais de 70 anos de idade), se reinventando dessa maneira. O som de baixo do Alex nesse disco é algo inédito na discografia da banda, assim como a bateria do Ivan e as teclas do Kiko. Como se isso já não fosse suficiente, o trio ainda aparece contracenando com diversos elementos musicais que não eram de praxe em seus esforços anteriores, como a adição de guitarras, xilofone e metais, por exemplo, que permeia todo o play.

Os primeiros segundos de “Ao Redor do Samba” já revelam muitas coisas. Adrian e Ali sacaram que o que o groove do Azymuth funciona muito bem em trio, logo, criar um plano de fundo musical com mais recursos elevaria a capacidade de groovar do grupo. A guitarra já apresenta o cartão de visita e tema após tema outras nuances ganham força.

Em “Sumaré”, por exemplo, o groove de baixo e bateria mostra o entrosamento telepático entre o Ivan e o Alex, mas o timbre dos instrumentos é único e os detalhes de percussão ao fundo (outro traço marcante do projeto), ajuda a trazer um preenchimento que enriquece a experiência, justamente pela riqueza dos timbres de instrumentos que não são usuais na abordagem do grupo. Azymuth com wah-wah. Quem diria?! Repare como o groove da sessão rítmica caminha para o Hip-Hop, quando em outros carnavais, o Samba doido do Trio iria sentido Partido Alto.

O trabalho do Kiko merece menção honrosa, pois a maneira como ele encaixa as teclas no molho, ambienta as propostas muito bem – destacando a interação com novos elementos – sem necessidade de tocar 1 milhão de notas por segundo, muito pelo contrário. O trabalho percussão e os metais engrandecem a atmosfera das faixas de maneira categórica.

Em “Fall Afternoon”, os primeiros segundos do tema remetem ao puro suco da Bossa Nova. O sax sublinhando o tema é a cereja do bolo. Um dos discos mais longos da série (superando a marca dos 40 minutos de duração), esse play mostra também como o Samba ainda é fio condutor de muitos experimentos do grupo, como é possível perceber nas células rítmicas de “Friendship Samba”.  O groove da sessão ritmica é 100% Brasil, mas é com “Apocalíptico” que o grupo se consagra.

Tema épico que estava presente no disco que apresentou o elenco que faria essa primeira leva de gravações, essa faixa mostra o por quê do Azymuth possuir uma base de fãs que se renova ano após ano. O groove tem a essência do trio, mas o desenrolar do tema mostra a importância do núcleo da Jazz Is Dead para envolopar as ideias e repaginar a música sem perder a essência. 

É impressionante como o grupo toca solto. Essa sessão rendeu muito e a duração do disco mostra isso. Escutar o Azymuth é como andar num elevador panorâmico. A vista sempre vale a pena, mesmo que você precise verificar se o mesmo encontra-se parado netse andar. “Quiet Storm” marca o fim do disco, mas também conclui o renascimento do grupo. Uma novidade estética marcante, depois de ouvir esse trampo fica difícil não imaginar um volume 2 com a Jazz Is Dead.

 

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