As Incríveis Histórias De: Underground Superhero Vs O Terrível Ladrão de Loops, rimas do Akira Presidente e beats drumless (Barba Negra)!
Já em Êxito, disco lançado em 2020, Akira Presidente na primeira faixa daquele trabalho rimava em um beat construído através de loops, sem bumbo e caixa. Mas assim como no anterior Nandi (2019) – sobre o qual escrevemos, clique aqui – misturava sonoridades ao longo do disco. Seu último lançamento é o mais bem acabado esteticamente de uma sequência de lançamentos, todos dentro da sonoridade do boombap.
Esse movimento começou com os EPs “Melhoria Tape, Vol. 1(2021)”, seguiu-se com “Boombapkilla (2022)” onde todas as faixas são produções do MAD GUI e desembocou no “Omertà (2022)”. Título retirado do livro de mesmo nome sobre a máfia italiana do autor Mario Puzo, muito conhecido no Brasil por seu best-seller O Poderoso Chefão, dirigido no cinema por Francis Ford Coppola e roteirizado pelo escritor. Neste trajeto, além do já provado talento, da firma familiar que cresce em participação, o MC carioca mostra bastante coragem, ao se afastar do trap.
Afastar-se aqui não quer dizer outra coisa, nestes últimos trabalhos Akira tem buscado uma sonoridade que disseram alguns estava morta e ou não possui o mesmo apelo comercial que o Trap, o que é fato. E neste sentido, esse movimento acima descrito é digno de nota, afinal, o mercado cultural é algo que muitos “MC’s” levam em conta na hora de produzir e ou convidar participações.
Diferente do seu último disco que teve todos os beats assinados por CHF, neste As Incríveis Histórias De: Underground Superhero Vs O Terrível Ladrão de Loops, além de ter todos os beats assinados por um mesmo produtor é assumidamente um disco de parceria criativa. Akira Presidente convidou o cabeça cara Barba Negra aka Terrível Ladrão de Loops, outrora conhecido como MC Ralph, para produzir mas também para rimar.
E quando falamos de cabeça cara, não estamos usando nenhuma hipérbole, pois estamos diante de um dos melhores e mais destacados produtores do atual cenário do Boombap no século XXI. Não bastasse já ser um excelente MC, o pesquisador e alquimista de loops e batidas, tem alguns – vários trabalhos dignos de nota – e se você não ouviu os dois projetos discos do Braselda (2021), se não teve o prazer de passear pelo imaginário sonoro e poético de O Pirata em Tokyo Vol. 1 e 2 (2022) o último disco do Mattenie (2023), na boa, nem puxa conversa, vai abrir a porra do seu streaming e ouvir.
O Boombap no século XXI, quando loops viram ritmo!
Como dissemos acima, O Terrível Ladrão de Loops produziu todo o disco do Underground Superhero na pegada do drumless, retirando-lhe qualquer cama elástica de proteção – bumbo e caixa – para que o MC pudesse encaixar no beat. Esta tendência de produção que permeia todo o disco do Akira Presidente, como muitos já sabem, vem de grupos como o Griselda e do grande Roc Marciano, entre diversos outros nomes.
No cenário do melhor dos mundos possíveis no rap nacional, as pessoas entenderiam batidas como possibilidades rítmicas e beats como territórios sonoros onde cabe à lírica e ao flow povoar com qualidade poética e de entrega, com ideias, sentimentos, percepções e conceitos que coadunem com a cultura hip-hop. Felizmente, existem muitos nomes criadores que tem pensado desta forma e o novo segue surgindo diuturnamente no cenário do rap nacional de norte a sul. Apesar da ignorância e da indústria cultural, que muitas vezes quer colocar um determinado jeito de fazer como hegemônico e a indústria consegue e tem feito isso.
Ao longo das 10 faixas Akira Presidente e Barba Negra, apresentam o que muitos têm chamado de Pós-Rap, ou New Golden Era com maestria em todos os quesitos, acima elencados. E nos mostrando como essa forma de produção – o drumless – segue a tradição apesar de retirar – a bateria – em teoria, pois na prática os loops “repetem” circularmente o andamento, tal como na tradição negra de percussão, as melodias recortadas e montadas em loops mantém nossos pescocinhos balançando, mesmo sem o bumbo e a caixa.
E nessa nova toada que tem sido incorporada por muitos MCs nacionais, oxigenando o cenário do rap underground nacional, o Underground Superhero convida o MC Ralph e juntos dão aula em “Ghostface”. Juntos a um nome que precisa de mais atenção no cenário do boombap nacional – e um disco nessa pegada – que é a Killabi, onde ela tem feito participações, tem esmerilhado com sinceridade. Na seguinte, o casal Akira Presidente e Ainá mostra “cumplicidade” poeticamente, para além do íntimo e do cotidiano. E recebem, o Barba Negra aka MC Ralph que por sua vez rima para a sua amada.
De modo geral, Akira Presidente atropela os beats com uma fórmula que lhe é muito própria e que de certo modo foi plasmada no supracitado Omertà (2022). Pelo menos desde Nandi (2019), Akira tem incorporado uma espécie de gangster dos trópicos, que luta contra os inimigos e protege e reverencia sua família. Certamente, desta forma pode parecer algo clichê, mas o MC possui uma caixa de ferramentas grande o suficiente para variar sobre este universo – próprio – para além de uma mera cópia.
Sobretudo, porque se está falando de uma família preta, família esta que trabalha junta também, o que certamente não é fácil. Mas que pelo visto, só tem fortalecido os laços desta “Famiglia” brasuca. Isso fica explícito na liberdade criativa exemplificada na doce canção sobre amores desencontrados como em “Estado de Espírito”, um dos melhores beats do álbum. Seja em word plays, nos braggadocios, em punchlines e ou multi silábicas, Akira eleva o seu próprio nível.
Rimando sobre o crime, sobre as conquistas materiais e ao mesmo sem recair no “loop idiota da meritocracia ou da mera ostentação”, que as crianças do rap retroalimentam, vomitando deep fakes subjetivas. O Terrível Ladrão de Loops segue se superando em beats muito criativos como em “S.A.D.E.”. A linda Nandi participa da classuda Refúgio do Herói, outro exemplo de como fazer o tema da “famiglia negra” variar dentro da própria obra do autor, o Father, rimando como pai, ouvido pela filha.
Enfim, essa parceria entre Akira Presidente aka Father e o Terrível Ladrão de Loops aka Barba Negra ou MC Ralph, é um dos excelentes discos do ano, o trabalho vem enriquecer um cenário já bastante diverso e com muitas boas produções. No meu melhor mundo possível é foda-se o rap game, gostamos da conjunção e, não do binarismo ou, por isso busco não recair nas bobagens de eleição e etc… Escutem!
-Akira Presidente e Barba Negra em loops e punchlines, o boombap no século XXI
Por Danilo Cruz