Show da Fé com Galf AC no templo Cremenow Studio apresenta o louvor: “Apóstolos”

Com um audiovisual intimista Galf AC solta o terceiro videoclipe do álbum Botando pra Ver Bicho (2022), o single “Apóstolos”

Galf AC Nem bem chegamos a metade deste ano e o MC baiano Galf AC já soltou uma enxurrada de produções sem deixar a qualidade cair. Artista maduro, caneta nervosa, lírica e flows inventivos, em 2022 o artista tem expandido o alcance de sua arte e ao mesmo tempo estreitado laços com outros artistas e produtores de fora do estado. Essas associações e alianças se conjugam com uma equipe muito bem azeitada, que toca as questões musicais, técnica, imagéticas e audiovisuais de seu trabalho. 

Não é fácil para um artista independente se manter no corre e muito menos se organizar profissionalmente com uma equipe abrangente e talentosa. Porém, ele tem conseguido e o resultado é um deleite para os amantes do rap underground. Versátil, expansivo e diversificado musicalmente, com longa trajetória no cenário underground baiano, Galf AC tem encampado os seus esforços no boombap, renovando o gênero com sotaque próprio.

No último mês de março o artista soltou o disco Botando Pra Ver Bicho pt. II (2022), o clipe da faixa NVBN e duas lives sessions. Essas lives sessions são excelentes exemplos de captura in loco de como a performance de Galf AC tem se preparado para os shows ao vivo. São apresentações que vão muito na contracorrente do que tem sido feito em termos gerais no rap nacional. A captação em uma sala de estar nos convida a uma proximidade e porque não intimidade, com a sonoridade e com as ideias. Quase como se o artista nos pedisse atenção, em um momento onde o balanço frenético e a rapidez se fazem mister.

Divididas em duas partes, a primeira live session “Maré de Março” nos reserva um ambiente mais claro, mais iluminado é composta por 5 faixas, com três delas retiradas do último disco e duas inéditas: “Vanguarda” e “Bandida part. 2”, as duas com produção do Tiago Simões; Já na segunda parte a live session “Ressaca”, o clima é de “esfumaçamento” com uma névoa que faz pensar, onde o convite parece ser o de fazer com que a atenção pedida aprofunde-se mais e mais em um si mesmo, do telespectador. Esse claro escuro presente na live session é muito interessante para dar ao navegante de primeira viagem alguma noção da amplidão lírica, estética e ideológica com a qual Galf AC tem produzido suas constantes “ondas” artísticas.

Todo esse forço nos revela além da qualidade incontestável dos trabalhos, de uma constância invejável e de uma capacidade incrível de não se repetir, uma fé inabalável em si mesmo – na sua arte – mas também no que pode ser o Hip-Hop para além do hype. Ideia a qual já batemos aqui em outros textos sobre Galf e que recentemente o próprio artista expôs com muita lucidez no CarurivisCast. Podemos nesse sentido afirmar, sem medo de errar, que estamos diante de um artista que tem produzido cada vez mais e melhor rumo a um horizonte que está fora de moda: a cultura Hip-Hop enquanto movimento político. 

 O segundo audiovisual retirado do disco, a faixa “TifúGang” apresenta uma sequência de imagens poéticas onde o MC desfia ideias políticas com uma abrangência que vai literalmente ao cosmo. Anti-capitalista, eticamente comprometido com a favela e sabedor das armadilhas – ou dos elos – que a industria cultural tem utilizado para diluir o rap nacional. Galf AC tem produzido linhas que mesclam muito bem uma moral rígida, onde os valores humanos se junta a uma consciência política e racial muito longe dos clichês pautados pelas redes sociais.

“Fluxo de lucro, vazio sem conteúdo, influenciando o retardo de modo oculto”

Manter essa postura, esse ethos onde as ruas se impõem aos holofotes, não significa nenhuma apologia a pobreza mas antes a uma resistência que tem conseguido manter a riqueza da cultura. Suando sangue, para que a arte não seja ditada de fora, onde o público consumidor não se sobreponha aos amantes do hip-hop, é a verdade que o show da Fé de Galf AC tem apresentado. Longe de querer posar de pastor, ou mesmo de querer ser um deus único, síndrome comum mesmo em artistas que se dizem politeístas, Galf AC se apresenta como mais um apóstolo de uma cultura que o edificou e a qual ele escolheu para expressar sua arte.

Isto fica explícito em seu último lançamento, uma faixa que traz um beat bem cadenciado e marcado por um tecladinho soulfull, cortesia de Pivoman, onde o MC destila toda a sujeira e complexidade em críticas que nos remetem ao subtexto que utilizamos aqui como mote. Uma visão de respeito a cultura Hip-Hop, um posicionamento orgulhosamente underground não por prepotência, mas por uma vivência que o construiu e o moldou para isso. Sem falso moralismo, porém sem nenhum traço de arrivismo em sua arte, abraçando e sendo abraçado pelas ruas, pelos que estão nessa pela cultura e pelas verdes consequentemente.

O templo no qual Galf AC congrega atualmente em vigílias inspiradas, o Cremenow Studio e ao sumo sacerdote Tiago Simões, se juntam a Davi Muniz e William Ifé – Mestre Produções nesse círculo de produções profanas. Música, poesia e vídeo fruto dessa coligação, dessa mesma fé carregada de ancestralidade e respeito a melhor tradição Hip-Hop. 

-Show da Fé com Galf AC no templo Cremenow Studio apresenta o louvor: “Apóstolos”

Por Danilo Cruz 

 

 

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