Thais Badu Começa a erigir um altar para a música negra direto do norte. a rapper surge com um histórico evidente de qualidades múltiplas!!
Em 2018, a cantora, compositora, atríz, musicista clássica amadora e portadora de mais uma série de talentos: Thais Badu, lançou dois singles solo. Até aí, nada de novo, afinal a quantidade de lançamentos diários só aumenta ao passar das semanas. No entanto, com um pouco mais de esforço, buscando conhecer um pouco melhor a dona desse vozeirão, que rima e canta com bastante qualidade, trazendo em suas composições: suas lutas, suas esperanças, suas angústias e também os seus amores, uma história se revela surpreendente. Nos espanta, ao mesmo tempo em que nos mostra uma artista tecnicamente pronta pra estourar a nível nacional. O que entre outros obstáculos não é tarefa fácil, pois essa postulante a nova estrela da música popular brasileira, vem de lá de Belém, tá tudo bem, cês vão lembrar da Gabi Amarantos, mas eu devo lhes avisar, não estamos diante do mesmo nicho artístico. Estamos falando do rap, e se você que está lendo tem o minimo de conhecimento da cena rap brasileira, deve saber que Belém do Pará é reconhecido nacionalmente no campo da música pop pelo seu Techno Brega.
Thais Badu é como muitas outras artistas, muito bem preparada, estudiosa, portadora de um talento enorme, mas por diversas razões ainda não encontrou o seu lugar ao sol na industria cultural. Assim como diversos outros artistas do rap de Belém do Pará, Thais está distante do eixo, e ao mesmo tempo, distante da região nordeste que passou a ser mais olhada pós-Sulicidio. Porém,.a artista não desanima e segue fazendo o que todos que buscam viver seus sonhos precisam fazer, lutar pra melhorar.
Durante anos, há exatos 7 anos de carreira profissional como cantora e compositora, a paraense acumulou uma bagagem musical que é invejável, se apresentando com diversas bandas, grupos e projetos. Essa caminhada te levou a dominar diferentes linguagens musicais fazendo-a passear pelo rock, pelo pop, pela MPB, pelo reggae e pelo carimbó, entre outros.
Associe-se a essas informações o fato de que desde a adolescência Thais Badu buscou estudar música, o que te levou aos estudos de canto lirico, do violão clássico e a dois anos de canto coral. Sabemos, é bem verdade, que o estudo não substitui o talento, mas essas informações aqui colocadas, serve-nos para vermos melhor, que o talento bem informado, é importante.
Em 2016, Thais Badu se junta a outras manas no coletivo Crew das Minas, uma iniciativa que visava a união de mulheres que produzem músicas dentro do recorte de periferia (reggae, rap, hip-hop). A proposta previu a promoção de eventos, mas também oficinas, bate-papos com comunidades carentes e a tomada de espaços na cidade de Belém. Com o intuito de promover o comércio criativo, gerando assim renda e desenvolvendo o mercado autoral feminino local.
Todo esse currículo, nos traz à primeira produção solo lançada esse ano pela artista, já plenamente assentada dentro da cultura hip hop. Numa excelente parceria entre a Thais Badu, que se associou ao forte trabalho do coletivo OCaribé Selo, foi dela a honra de estrear a série Retrato Falado. É bom que se fale, a produtora O Caribé Selo é a única no Brasil a equiparar homens e mulheres em suas produções, nessa série Retrato Falado, confira abaixo a participação da artista.
O single Altar (2018) contou com a produção do beatmaker B.Habib e fará parte do EP Sou Preta, com lançamento previsto para o mês de outubro. E a tomar as produções lançadas pela artista, ela vem trazendo algumas características que foram incorporadas ao seu trabalho ao longo dos anos.
Na sua lírica e no seu canto, é perceptível uma gama de influências que vão do R&B ao Reggae, associando a beleza e sensualidade do primeiro nos termos musicais de sua construção, com a combatividade e as metáforas da natureza provenientes da música reggae. O single Altar possui seis minutos e cinco segundos, o que é um exagero haja visto o tamanho padrão das músicas atuais no cenário do rap.
Entre recordações e anseios, Thais Badu constroi um especie de storytelling mesclando vivências amorosas do passado e desejos para o futuro. Ao narrar essa história em primeira pessoa e ao colocar os acontecimentos e desejos nesse cruzamento temporal, a compositora produz um reflexão amorosa.
Reflexão que coloca em jogo uma série de questões que perpassam não apenas os afetos, mas sobretudo, coloca em cheque o modo de ser que adotamos hoje. A pressa que as correrias do dia a dia nos impõe, a vida dentro do contexto urbano e suas declinações caóticas, mas sobretudo, a força da decisão ética que faz ou não um relacionamento dar certo.
Mas recentemente, no mês de julho, Thais Badu lançou o segundo single que traz o título que nomeará seu EP, “Sou Preta”. É uma forte declaração de independência, saca só:
A afirmação da identidade negra no Brasil, é sempre e em todos os casos, uma denuncia. Thais Badu tem plena consciência disso. Em “Sou Preta”, a artista paraense produz um bonito “grito” cantado contra explorações, humilhações, não reconhecimento e uma série de obstáculos que mulheres negras encontram na sociedade em geral. Thais Badu, particulariza também ao trazer sua vivência artística como lugar de fala para essa afirmação/denúncia.
Em cima de um beat que traz elementos da reggae music, produção caprichada do mano Dubalizer a rapper solta a voz mesclando um flow com pitadas de dancehall e ragga. Sobre a técnica acima citada, é notório como Thais Badu, negocia com bastante habilidade dentro de diversos enfoques musicais, que trazem um apelo pop ao seu rap, mas que nunca perde a verve combativa.
É comum dentro da cena hip hop, hoje em menor proporção, mas ainda permanece, uma fronteira nítida entre música para curtir e música consciente. Thais Badu parece querer rasurar essas fronteiras, um pouco na linha do que vem propondo com sucesso, a paranaense Karol Conká. O video clipe também traz uma bonita afirmação do seu lugar de origem, a cidade de Belém do Pará.
Com a produção de Samantha Quemel e Anna Batista, que responde também pelo nome de Anna Suav e é uma das boas rappers da nova cena do Pará. A direção ficou a cargo da própria Thais Badu, e o videoclipe começa em um movimento de câmera que busca a artista em meio às palafitas de sua cidade. Afirmando sua origem periférica e racial, mas tudo isso envolta a uma aura de beleza e alguma descontração musical, em contraposição a letra dura que é cantada.
Fugindo do estigma que durante muitos anos obrigou mulheres a se masculinizarem para serem aceitas dentro da cultura hip hop, Thais se apresenta no clipe com um figurino deslumbrante, sensual e até em alguma medida dialogando com a cultura local. Ao mesmo tempo, essa afirmação de um ser negra, vem junto com o respeito a outras diferenças, e assim, podemos ver no clipe, manas e monas juntas. Em tempos de pautas extremamente separadas, Thais Badu traz também em seu trabalho a importância da transversalidade das lutas.
Acreditamos que é extremamente importante para quem curte novos sabores na música rap, estar atento a essa nova cena do rap paraense, pois as produções que vem nos chegando de lá, traz trabalhos muito bonitos, principalmente nas produções do OCaribé Selo, que vem apresentando novos formatos de produção e uma gama muito grande de bons artistas do rap local.
Dentro dessa cena, Thais Badu é figura de proa, pois passou muito tempo estudando e se preparando para conquistar uma autonomia, técnica, mental e consequentemente artística, que ninguém pode lhe tirar. Aguardamos agora as cenas dos próximos capítulos, mas principalmente estamos de olho do EP Sou Preta (2018) que vem às ruas em outubro desse ano.
Abaixo, uma música chamada “Minha História” gravada ao vivo, um resumo musicado de tudo que dissemos acima: