Omnira 7×1 part. Luiza Rampazzo (videoclipe) apresenta uma poderosa sátira e ao mesmo tempo mostra como estamos sendo goleados todos os dias
O grupo de rap paulistano Omnira lançou em 2017 um disco, o excelente Grito de Liberdade (2017) que ao que parece foi pouco ouvido pelos admiradores do rap game, mas que alcançou os ouvidos mais atentos ao que de melhor se faz no rap nacional. Uma caminhada bonita e muito forte, onde se alinham letras de insurgência das mc’s Jana D’Notria, Paty Treze e Juliana Sete, a uma produção de primeiríssima grandeza, criativa e original por conta do: DJ Neew.
Neste ano de 2018, ano de copa do mundo e ano de eleições, onde o futuro da nação é decidido, em seu esporte de maior adesão nacional e uma das caras de nossa identidade, e nas urnas, algumas questões tem se colocado. Pois, a verdade é que deveríamos estar refletindo o momento que vivemos com base na história recente do país sem nos prendermos em simplificações.
É bem verdade que muitos brasileiros estão mais preocupados em derramar estupidez nas ideias e posar de censor de admiradores do futebol ou de tocar um foda-se e posar do super revolucionário que não assiste futebol. Propiciando assim, uma analise rasa entre uma e outra questão, levando a frente a polarização que já marcou nossa história recente entre coxinhas e mortadelas. Um signo do nosso empobrecimento e encrudescimento em todas as esferas.
O grupo Omnira preferiu alcançar o equilíbrio e dosar a sua critica sob a perspectiva de revisão histórica, com cara de resenha esportiva que não se furta a critica politica. Entender que o futebol é dominado pelas grandes corporações esportivas não é um esforço intelectual para gênios, e fazer a critica ao futebol moderno não fará de você leitor, um combatente de Serra Maestra contra o capitalismo. Afinal, ele – o capitalismo – atravessa toda a nossa vida, inclusive cooptando, trabalhando e lucrando com a arte mais combativa.
É próprio do capitalismo trabalhar com o descodificar dos códigos e transforma-los em produtos, assimilando-os e fazendo com que mesmo a música mais rebelde e assertiva contra ele funcione ao seu favor como um produto lucrativo. Sendo assim, é necessário que tenhamos consciência de como e de que forma nossa critica funcionará dentro dessa modalidade econômica que é capaz de transformar a tudo em produto vendável.
Se assenhorando da goleada histórica sofrida seleção brasileira de futebol em 2014, na segunda copa do mundo realizada em nosso território, e que recebeu seu segundo desastre como prelúdio do que estaria por vir, o Omnira foge dessa dicotomia boba, entre torcedores e revolucionários. Satirizando o acontecido e mostrando como essa goleada é na verdade uma constante histórica desde da chegada dos portugueses (ruins de bola). E para isso o grupo convidou a rapper Luiza Rampazzo (38 Mil Manos) para participar dessa faixa, que se apresenta pesadona nas ideias, com muito flow e rima para somar.
Se em 1950, o Uruguai foi o responsável por mostrar o nosso racismo ao nos fazer culpar única e exclusivamente o nosso querido goleiro Barbosa como culpado daquela derrota história. Passados 64 anos, presenciamos um movimento escroto que levou nossa presidente ao impeachment, num golpe de estado parlamentar, tocado com o apoio da mesma classe média que estava lá nos estádios da copa xingando a nossa presidente.
Coincidentemente, é o ano 1964 que marca o começo da grotesca e cruel ditadura militar oficial no Brasil, movimento que atualmente tem sua volta sendo pedida – como intervenção militar – por uma grande gama de estúpidos fascistas, que apoiaram o recente golpe vestidos com a camisa da seleção brasileira de futebol, daquela instituição acima de todas as suspeitas: a C.B.F..
É sob o signo dessa conjuntura atual e ao mesmo tempo retrabalhando a nossa história recente, que o single 7×1 (2018) busca nos chamar atenção, para as goleadas que tomamos todos os dias. Desde o nosso descobrimento que não possuímos um time a jogar pelo povo, a buscar selecionar realmente os nossos melhores talentos para a construção de um esquema tático que seja capaz de vencer nossos maiores adversários.
Desigualdade social a números abismais, o genocídio da juventude negra, nosso patriarcado (agora evangélico) que segue barrando pautas necessárias para qualquer estado minimamente liberal, quando nos referimos a questões sobre liberdades individuais. Essas são apenas algumas das questões levantadas pela analise esportiva e social que as meninas promovem. Mas não é só, afinal seguimos apanhando de goleada todos os dias, e nesse sentido listar aqui todos os tópicos, ou melhor todas as porradas que recebemos a todo segundo seria empobrecer o trabalho. Ou por outro lado, seria a série mais bizarra de narrações e analogias entre o futebol e nossa conjuntura politica e social que podem encontrar na fala do governador da Bahia, Rui Costa, o exemplo mais grotesco.
Da mesma forma, o audio visual que trabalha diversas questões, passando pela filmagem mas também nas atuações, é um exemplo excelente de como tratar um tema tão pesado e múltiplo. Utilizando signos múltiplos de liberdade e escravidão mental, seja na maquiagem, seja nas manas a mostrar seus corpos, encontramos na direção e produção conjunta e do mano Zero Fox. Uma mise en scene caprichada, que ficou a cargo de um direção segura e muito forte nas escolhas das cenas incluídas nesse excelente produto audiovisual!
Assista: