Oganpazan
Artigo, Destaque, Discos, Lançamentos, Lançamentos do Rap Nordeste, Música, Rap Nordeste, Resenha, Resenha

Xarope MC lança XR777 (2022), um caminho no hip-hop candomblecista

Xarope MC

Recheado de grandes participações e explorando sonoridades, Xarope MC lança o seu segundo disco solo XR777 (2022)

Pioneirismo no Hip-Hop Candomblecista!

Muito antes do candomblé ser exaltado como um modo de ser importante da negritude brasileira e se transformar em capital simbólico na indústria cultural, Xarope MC já levantava a bandeira do Hip-Hop Candomblecista. Junto a outros grupos pioneiros em expor sem meias palavras sua crença nos orixás no rap baiano, o artista oriundo da Baixa do Tubo, no bairro de Cosme de Farias, já “pregava” sua fé. 

Pioneiro na cultura em Salvador, aliado com DJ Gug e Jeferson Negão, Xarope MC fez parte do grande Império Negro, com quem lançou 3 discos que precisam ser redescobertos, Demotape (2002), “Oxente” e “Axé para as Mulheres” são verdadeiros clássicos. Com o fim do grupo, o MC integrou a icônica Eletropercussiva, um grupo que reunia outros grandes nomes como Kiko Mc, Victor Haggar e Roy (Preto Sábio). O único grupo do rap nacional a gravar todo um disco utilizando tambores de bloco afro como bases para as rimas! 

Com uma rápida passagem pelo grupo Fraternidade Maus Elementos, essa caminhada acima descrita que atravessa todo o século XXI até aqui, Xarope MC encetou aos poucos sua carreira solo. Toda a experiência angariada durante esse percurso levou Xarope a começar um projeto com banda que infelizmente por falta de recursos para a manutenção do projeto não pode ser levado a frente. O projeto Xarope MC e Banda Laroyê era arrasador em suas apresentações ao vivo e ali, há seis anos atrás, nos dava a conhecer a voz potente de Aurea Maria, que ainda não era Áurea Sem Miséria, e fazia o backing vocal! 

Escritor da Liberdade, solo e preto pra caralho!

Com um disco composto por 11 faixas e participação do mineiro Djonga, Xarope MC lançou em 2019 a sua estreia solo com o álbum “Preto Pra Caralho”. Apresentando reflexões sobre as opressões sofridas pelo povo negro, trazia ainda outras participações importantes de nomes como Denis Denan, Coruja BC1, Baco Exu do Blues, RJ2, Gaspar (Záfrica Brasil). Pedagogo formado e atuante, “Marcos Vinicius” despeja em sua arte a formação recebida pelas mais de duas décadas de Hip Hop, rua real. 

Certamente, dona Rita Preta está plenamente satisfeita e orgulhosa de ver um homem preto orgulhoso de sua caminhada, um artista que resiste e resistiu a diversos problemas financeiros, mentais e raciais. Ouvir atentamente o disco de estreia solo nos apresenta uma narrativa que expõe os demônios contra os quais o MC lutou e segue lutando. A música Crônicas de um Menino Negro part. 1 é um relato doloroso e emocionante de um Marcus Vinicius vitorioso, de um menino negro que ultrapassou barreiras que não cabem em uma música. 

Ogan, Xarope MC é um soldado de Ogún que segue no caminho da arte independente angariando os ensinamentos com a fé que o candomblé lhe alimenta. Em seu disco de estreia, que conta com a produção de Alex Ferreira e com as artes do grande Zezé Olukemi, o artista de certo modo faz um caminho de reflexão sobre seus caminhos até então. É um bom disco de estreia que apresenta uma sonoridade própria e solar apesar dos temas espinhosos que aborda, contando com percussões de Elton Jackson e muita organicidade em sua construção. Abordando também temas como amor preto, auto valorização da negritude, nomes históricos da pretitude, o disco agrada o ouvinte que procura outras narrativas e sonoridades!

Abrindo novos caminhos, Exu é lindo, vocês que estão com o diabo!

Em XR777, seu segundo disco de estúdio solo, o artista traz uma pegada que visa o futuro, a começar pela capa impactante, onde os signos de um Hip-Hop candomblecista focam em uma estrada aberta. A base de muita potência, se desviando do racismo religioso tema da introdução “Drink com Capeta” e da vida do crime como muito bem narrada em “Alto Falante”, Xarope MC nos avisa sem dizer, os caminhos que ele abriu com muito esforço estão asfaltado, e ele não vai abrir mão de seguir!

Os signos de renovação e de eterna criação estão presentes de modo inequívoco na faixa “Pretinha da Mamãe e Papai”, com participação de DCazz a música traz o lado paterno e atencioso de Xarope com a linda Anaia Malika! Porém, que ninguém se engane, o artista segue combativo, em “Tá Amarrado” junto com Bivolt em um beat do Skeeter, a narrativa contra a branquitude e suas diversas formas de cancelamento, está afiada!

A noção de vivência é algo fundamental para a cultura hip-hop e na música “Suave”, apresenta uma homenagem ao grandioso Roy, artista que foi parceiro e amigo de Xarope MC, mas que nos deixou vítima da depressão. A produção do Alex Ferreira une Roy em espírito a Xarope MC que o presentifica na letra. Em “SSA”, o lado OG do MC se faz presente em beat com forte presença do Trapagodão com produção de Mailow e as percussas de Elton Jackson e Vitinho, o groove é pesado. Nego Freeza aka Exu Ciborgue é o convidado para fechar no feat e além de somar na lírica pesada, completa o aspecto OG da música!

Seguindo a linha do single audiovisual de “Minha Dota”, Xarope MC convida Nego Blue para fechar num pagodinho cheio de safadeza e romantismo. A música “Combinado” é mais uma produção do Alex Ferreira e bebe na veia dos pagodes românticos dos anos 90, eivado de signos de uma lírica que homanageia o amor negro! Importante frisar que o disco possui a direção musical do trio Djonga, Coruja BC1 e do Gaspar e a excelente mixagem e a master ficou a cargo de Kanela. 

O disco fecha com o trap produção do Kanela: XR777, que traz o traplord baiano que Xarope viu literalmente menino: Makonnen Tafari e  com o amigo Jhomp (Nois por Nois). A música que traz três grandes nomes do rap baiano segue a linha de auto exaltação, cheia de bragadoccios que exalam verdadeira vitória. Sejam as vitórias individuais mas sobretudo as vitórias de vida, de vidas consagradas à arte, ao progresso do povo preto, dos quais os três MC ‘s são excelentes exemplares.

O Hip-Hop transborda em trabalhos como este novo disco do Xarope MC, pois esse preto representa um exemplo de trajetória, que em outro cenário seria louvado pela importância de sua história dentro da cultura. É gratificante ver um artista com tamanha história e qualidade seguindo, se desenvolvendo, se renovando, e nos entregando mais uma fez um trabalho importante! Ouçam…  

-Xarope MC lança XR777 (2022), um caminho no hip-hop candomblecista

Por Danilo Cruz 

 

Matérias Relacionadas

Pedro Kief sobrevoando o abismo em seu EP de estréia!

Danilo
5 anos ago

Kpivara, um africano em diáspora no Rap Nacional: Imigrante (2023) – Entrevista

Danilo
2 anos ago

O “Corre do Tesouro” desde Massaranduba CBX, sempre será “Nois Por Nois”

Danilo
2 anos ago
Sair da versão mobile