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Time Bomb Girls: uma bomba relógio prestes a explodir!!

 

A Time Bomb Girls são três destemidas que partem pra luta sempre com sangue nozói. Tanta ousadia rendeu Las Tres Destemidas, álbum de estréia da banda. 

Time Bomb Girls

Las Tres Destemidas Cap. 1: Quando a música é potência de vida

A Time Bomb Girls pertence a uma categoria de bandas definida pela potência inerente à sua natureza. Bandas que acumulam em si uma grande quantidade de energia concentrada, necessária para explodir em sons com níveis alarmantes de intensidade. A vida se realiza por essas explosões intensas de energia, que a fazem acontecer de uma forma alegre, afirmativa.

Vivemos tempos de negação da vida. Nossas vidas são negadas por um governo de claras inclinações fascistas. Elas são negadas por apoiadores desse governo, que não suportam a ideia de existirem pessoas que desejam realizar a própria existência de uma maneira diferente da deles. Nossas vidas são negadas por uma doença que se alastra graças a ignorância de pessoas que não entendem a gravidade da situação e se comportam como se nada estivesse acontecendo.

Dessa forma precisamos confrontar esse movimento de negação da vida. Portanto, faz-se necessário afirmarmos a nossa existência da maneira que for possível.

A música dentre os tipos de arte é a propulsora da vida por excelência. Quando estamos felizes ouvimos música, quando queremos celebrar algo ouvimos música, quando estamos tristes também ouvimos música. Não entendam afirmar a existência como a busca por uma felicidade inesgotável, mas por vivenciar os momentos da vida, entendendo que fazem parte dela. Afirmar a existência é vivê-la plenamente.

A música das Time Bomb Girls funciona como catalizador da energia que nos leva a realizar nossa existência dançando, balançando, ouvindo sons que nos trazem momentos de alegria, de celebração, em que descarregamos nossa potência vital. Aliás, estimulada pela sonoridade da banda.

Tudo bem, a sonoridade da Time Bomb Girls tem influência de estilos como o garage rock, psychobilly, rockabilly, punk rock, mas certamente a banda não se enquadra em nenhum desses estilos. Há todos eles no som que elas fazem mas nenhum deles é suficiente para defini-lo. Acredito que não, mesmo que a própria banda o defina como punkabilly. 

Las Tres Destemidas Cap. 2: A dificuldade inerente à criação

Por isso iniciei o texto falando que a TBG faz parte de uma categoria específica de bandas, que se definem por terem uma natureza potente. Significa terem em si a capacidade de afirmação da vida, de afirmação da existência. A TBG tem que ser definida pela sua natureza, não por um estilo.

O estilo delas é formado por muitas influências, mas isso não dá conta de definir aquilo que elas estão fazendo. Como seres racionais sentimos necessidade de entender as coisas, por isso estamos sempre tentando defini-las. Enquanto isso não acontece, continuamos essa busca.

Pra alguns isso é um problema, mas há quem acredite que o importante é o processo de tentar definir, não sua concretização. Dessa maneira, vamos seguir acompanhando a Time Bomb Girls e continuar tentando defini-las. Embora tudo indique que elas continuarão sempre dando um jeito de escapar, sempre exigindo que a tarefa de compreender o que elas estão fazendo seja necessária.

Acredito que no momento em que damos conta de entender e definir uma banda, um gênero, um estilo, etc, significa que o mesmo não está em movimento, perdeu sua potência e está inerte. Bom, as Time Bomb Girls estão longe disso.

A prova é o seu álbum de estreia, apropriadamente chamado de Las Tres Destemidas. Trata-se de uma obra que contem uma diversidade sonora. As músicas possuem suas singularidades, porém, mantém uma conexão entre si. Portanto há uma unidade no álbum, que o apresenta enquanto tal.

Particularmente considero esta uma característica fundamental em um álbum musical. Revela uma concepção estética, mesmo que isso não tenha ocorrido de modo racional, planejado. Muitas vezes rola um entrosamento tão radical entre a banda, que este ponto é atingido naturalmente. Será que esse é o caso das TBG? Aposto minhas fichas que sim, baseando-me na forma como a banda se relaciona entre si e com o público.

Voltando ao som da banda. A sonoridade da TBG é uma síntese muito bem urdida de todos os estilos que influenciam a banda. Nesse sentido a TBG realiza sua musicalidade organicamente. Tanto é verdade que não acontece aquela tendência, quase instantânea quando se houve o som de certas bandas, de remeter esta ou aquela música a músicas desta ou daquela outra banda.

Significa que houve a criação daquela sonoridade. Ela não é a mimetização de alguma outra banda que possa ter servido de influência. Claro, do nada não sai coisa alguma, já diria o filósofo. Existe uma base que alicerça a sonoridade da TBG, contudo ela não contamina a estrutura que dali se segue.

Las Tres Destemidas Cap. 3: Uma pausa pra falar de show

Isso mostra a sintonia dessas três destemidas também no estúdio e no processo de composição. Digo também porque a sintonia no palco já tínhamos constatados faz tempo. E aí eu não posso deixar de abrir um enorme parênteses aqui pra falar sobre a performance da banda nos shows.

Puta que pariu!! Assisti alguns vídeos que trazem parte do show da banda no Goiânia Noise 2019, que me obrigaram a incrementar minha lista de “Coisas que tenho que fazer antes de morrer” com o item “Assistir um show das TBG”.

No show você consegue perceber a conexão das componentes da banda entre si e com a música. Porra, as minas estão claramente se divertindo, as reações no palco são provocadas pela música, pelo que cada uma faz ao longo do show, da execução de uma música, ou seja, estão ali, afirmando sua existência através da música.

Ao mesmo tempo contagiam o público com a energia, gerando todo um clima de celebração integrada entre todes presentes tendo a música como agente catalizador. Destaque pra Sayouri Yammamoto, guitarrista e vocalista da banda, que é literalmente uma bomba relógio! Um coquetel molotov estraçalhando um escudo da Choque!

Caralho! Que potência essa mina no palco!! A voz estridente, porque o vocal é gritado, é eletrizante! Eu aqui de casa, assistindo no YouTube senti o baque, imagina quem tava ali no show vendo aquilo no momento em que acontecia! Então eu já deixo aqui meu pitaco: queremos um álbum ao vivo das TBG!!

Las Tres Destemidas Cap. 4: Um álbum de contrastes, muitas reviravoltas, surpresas e e algumas versões

Mas voltando ao foco deste texto. Las Tres Destemidas é um álbum que expressa essa energia que já havíamos identificado nos shows da banda. O que faz dele uma obra versátil, no sentido de permitir diferentes formas de audição. Serve pra você ouvir trocando uma ideia, pra dançar, pra tomar umas e pensar na vida, pra degustá-lo, pra ficar viajando nas músicas. Enfim, é um álbum que oferece inúmeras possibilidades.

Contudo, em todas essas situações possíveis você sentirá uma descarga elétrica percorrendo seu corpo. Entretanto, o modo como o álbum começa não indica que encontraremos essa descarga elétrica percorrendo nosso sistema nervoso central.

Isso porque elas começam com um western, o que me pegou de surpresa. Sabe quando você cria uma imagem de uma pessoa, ou cria uma expectativa sobre algo e é tudo diferente do que você estava esperando? E aí, como se não bastasse, vem aquele sorriso de surpresa quando o acontecimento foi melhor do que você esperava? Foi o que rolou quando dei o play em Las Tres Destemidas, faixa que abre o álbum e dá título ao mesmo.

Eu esperava algo porradão, garageiro, mas não um western! E eu como fan do Sérgio Leone, o que significa ser fan das trilhas sonoras do Ennio Morricone, quase tive um “trem” ouvindo essa faixa. Fiquei chapado ouvindo essa música porque não só me pegou de surpresa como me remeteu a cenas clássicas dos filmes do Sérgio Leone.

Além do que é um tipo de som muito apropriado pra introduzir qualquer coisa. Porque é uma sonoridade emotiva, que desperta emoções transitórias, de preparação pra algo que vai acontecer ou começar. Porra, não sei se foi essa a intenção, mas bateu muito certo botar essa faixa no início. A levada cadenciada, a gaita com esse timbre mais aberto deu o tom preciso pra gerar a expectativa sobre o que viria a seguir.

Desse modo, quando a primeira faixa estava terminando eu pausei a música e desejei que minha memória das faixas que já tinha ouvido fosse totalmente apagada. Tenho inveja de você que não conhecia nenhuma música que viria a partir dali. Eu fico imaginando o impacto que a pessoa em posse dessa condição teve quando a segunda faixa começou a rolar.

Certamente ela esperava algo completamente diferente do que veio no momento que Quando eu crescer começou a rolar. Porque, venham comigo, imagina como sua percepção estava sendo moldada enquanto você ouvia Las Tres Destemidas.

Acredito que você esperava algo próximo daquele som inicial. E aí vem uma distorção agitando seu tímpano, uma levada mais rápida e aí você toma mais um susto e é jogado pra outro lado. Que sensação deliciosa essa de sentir esse contraste e experimentar essa sensação! Lembro da metáfora do primeiro pico de heroína, aquele momento singular que nunca mais se repetirá e que todo junk procura em cada dose que toma a partir de então. Acredito que seja algo nesse sentido.

E Quando eu crescer é minha música favorita da banda, até escrevi (aqui) sobre ela quando foi lançada como single em 2019. Isso porque além de ser uma música explosiva tem uma letra forte que aborda a liberdade feminina de um modo bem rocker!! Fazendo referência ao clipe da música Bikini Girls With Machine Gun dos Cramps.

A letra tem um aporte político na medida que afirma a liberdade da mulher de escolher ser  o que quiser ser. Detonando as amarras patriarcais que exigem que elas se enquadrem num formato de mulher que atenda as necessidades dessa estrutura social. A qual se mantém a partir do exercício de posse e controle da vida das mulheres.

Contudo, não faltaram momentos assim. Esses contrastes entre as músicas ocorrem, são muito bem demarcados ao longo da audição do álbum. Outro ponto forte da obra. Por exemplo, a faixa Tell Me. Ela vem depois de Quando Eu Crescer e mantém a carga pesada, te levando através de conduções pesadas e frenéticas.

Não podia ser diferente pois a letra aborda aquela tensão existente quando você se apaixona por alguém e não é correspondido. Todavia a coisa fica boa mesmo quando a pessoa por quem você está apaixonade não percebe e saca que você entregou de bandeja o poder nas mãos dela. 

Fica melhor ainda se não é reciproco. Ah o amor não correspondido!! Não tem coisa melhor pra inspirar obras de arte!! A vida fica muito mais intensa a partir daí. Bom, ao menos pra pessoa que se apaixonou, que a partir daí vai viver uma vida cheia de fortes emoções. Para o prazer e para a dor!

Essa impressão é quebrada quando se inicia Entre Trancos e Barrancos, um country envenenado, cuja letra expõe uma dinâmica existencial conduzida ao sabor do momento. Entra Meu Amor e a pegada ganha um grau a mais de intensidade. Isso porque a levada é mais rápida e casa bem com o tema abordado que é aquele tipo de pessoa que gosto de chamar de vampiro de energia.

Todo mundo conhece um ou mais vampiros de energia. Aquela pessoa que só faz te botar pra baixo e se você abrir a guarda se aproveita de você em muitos níveis. Quando você dá azar de se apaixonar por um vampiro de energia acontece o que está muito bem relatado em Meu Amor.

Cê tentou, meu amor, mirar a sua infelicidade em mim

Você quebrou, meu bem, a alegria que eu tinha e enfim

Você despertou aquela que dormia

Então, quando você cai na real e percebe que aquela pessoa está sugando sua energia, sua psique aciona o mecanismo de defesa, a raiva. Bom, depois disso a gente já sabe o que acontece. Parte-se pra outra.

Save me nos leva de volta ao “barulho” através duma pegada punk rápida e certeira. Muito apropriada para um letra que aborda nossa necessidade de ter pessoas em quem confiar. O que em alguns casos, pode ser uma armadilha que lança a pessoa numa condição de “aprisionamento”, decepção e frustração. Ao menos isso da uma engrossada na casca e em algum momento a pessoa deixa de acreditar nessa merda.

Nesse ponto do nosso trajeto rola uma reviravolta, as TBG metem uma surf music de tempero bem picante que sofre variações ao longo de sua execução. Nanana Surf começa naquele clima anos 50, porém, quebrado no refrão que dá uma carregada no som, que muda mais uma vez quando rola uma subida no tom da música. E aí ela ganha uma tensão e o veneno é jogado pelas distorções e mudança no andamento.

Segue essa alternância até que caem no sprint final da música quando segue na pegada forte e barulhenta até o final. Vale ressaltar que assim como a faixa Quando Eu Crescer, Nanana Song também é da antiga banda da baixista Deia Marinho, as Ave Marias

Não dá pra seguir sem falar da letra. Nanana Song tem a melhor letra sobre cabelo da história do rock. Além de um refrão onomatopeico! E todo mundo sabe que nenhum estilo está completo se o corte de cabelo não está harmonizado com o restante do look! Tá pensando o quê? Oganpazan também é fashion querides!

Fala verdade, é foda quando a gente se importa com a opinião de terceiros sobre nós mesmos! Entendo isso muito bem porque sou assim e sinto na pele as consequências disso. Waste of Time fala a respeito do quanto pessoas assim perdem tempo se justificando para outras ao invés de darem um FODA-SE! sonoro pra quem não tem nada a ver com sua vida. Nessa música rola um contraste, pois embora a letra trate de algo incômodo, o som tem uma pegada bem animada, dançante.

Acima de tudo, quem num gosta dum rockão com solos de guitarra secos e diretos à moda Johnny B. Good? Se você num gosta bom sujeito num é, tem problema de cabeça e não sabe dançar o twist. Sobrancelha Selvagem é esse tipo de música.  A letra mostra como uma sobrancelha, quando é selvagem claro, pode mudar o mundo ao seu redor. Nada além disso precisa ser dito.

Quando a relação chegou ao ponto de ser uma sequência interminável de capotadas incríveis tá na hora de dar um Let´s Go na vida né! Move On é um countryzão de pegada punk que te bota pra se movimentar e seguir em frente. Não importa o que aconteceu pra atravancar a sua vida, adianta o lado o quanto antes e segue em frente. Vamos logo pras próximas capotadas, atravancadas e tretas. Afinal de contas o que é a vida senão uma contínua atividade de solucionar tretas e seguir em frente até a próxima?

Que no caso é Caranga Infernal. Aqui você confere a versão das Time Bomb Girls pra música da Roberto Terremoto e Seus Abalos Sísmicos. A versão original tá no álbum Busão From Hell (2016), excelente álbum de rockabilly. Como toda boa versão que se presa, a feita pela TBG reelabora a música, imprimindo sua marca sonora nela.

Confere com a muda e Not a sad song haviam saído anteriormente no formato Ep em 2019, meses antes de Quando Eu Crescer ter saído como single. Fiz uma matéria sobre esses trampos da banda que você pode conferir clicando aqui.

Bom, terminamos o setlist de Las Tres Destemindas, mas ainda temos algumas coisas pra falar. Vamos a elas.

Las Tres Destemidas Cap. 5: Sempre julgue um livro pela capa

Esse papo de que não se deve julgar o livro pela capa talvez funcione como metáfora moral, mas no sentido literal, na maioria das vezes, a capa reflete o conteúdo. Seja do livro ou de um álbum musical. A arte concebida por Henrique San traduz em imagens o que é o álbum da banda em termos sonoros.

Desse modo, o estilo do cartoom escolhido pra compor a capa expressa a ideia de Las Tres Destemidas, como uma aventura que as componentes da Time Bomb Girls vão viver. A banda inicia uma nova fase e sabemos que nesses momentos há uma sensação de se lançar ao desconhecido. O que dá o tom aventureiro a este novo momento da banda.

Cada quadrinho mostra um momento nessa aventura explosiva das tres destemidas. Destaque pra fonte usada no anúncio da “história” e sua disposição no quadro. Lembra muito os filmes as apresentações dos gêneros de ação dos anos 50.

Las Tres Destemidas Cap. 6: Uma aventura ainda no começo

Uma banda formada pela trindade sagrada do rock, baixo, guitarra e bateria, merece respeitosa reverência. Ainda mais quando as integrantes fazem jus a este sacrossanto formato executando visceralmente seus instrumentos e reverberando um som eletrizante.

As TBG é uma banda recente, mas de integrantes veteranas na música. Juntas iniciam uma nova caminhada, que certamente renderá muitas aventuras e esperamos, muito mais lançamentos como este.

Las Tres Destemidas é um álbum que deveria ter sido lançado a quase um ano atrás. Porém saiu quando era pra sair, quando nada mais restava a ser feito a não ser lançá-lo. O álbum sai pelo selo Monstro Discos, respeitado selo musical responsável por lançar importantes bandas da cena underground. Mostrando a moral da jovem banda em meio a cena.

São 13 músicas das quais 9 são inéditas. As faixas “Not a Sad Song” e “Confere com a Muda” remixadas ganharam novas versões e foram remixadas por Manoel Cruz, que produziu o primeiro disco da Nitrominds.

Las Tres Destemidas sai dentro deste contexto social caótico engendrado pela pandemia do covid 19. Aqui no país agravada graças à condução genocida operada pelo governo federal representado na figura execrável de Jair Bolsonaro.

Diante deste quadro a banda lança seu álbum de estreia se servindo das redes sociais e plataformas digitais para fazê-lo ter o alcance merecido. Las Tres Destemidas está disponível no Spotify, Deezer, Apple Musical, TIDAL, Napster, além claro, no formato físico que pode ser adquirido pelo site da Monstros Discos ou via direct das redes sociais das Time Bomb Girls.

O álbum foi gravado no estúdio Porto Produções Musicais por Raul Zanardo, com produção de Matheus Krempel (The Bombers) e Alexandre Saldanha (Reverendo Frankenstein e Spitfire Demons). A capa e o design do CD ficaram por conta de Henrique San, nome conhecido da cena underground.

Como bem disse a baixista Déia Marinho: “É pólvora pura!!”

Time Bomb Girls é:

Camila Lacerda (bateria e voz)

Déia Marinho (baixo e voz)

Sayuri Yamamoto (guitarra, gaita e voz)

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