Em 2003 os Honkers se amontoaram num carro e caíram na estrada pra fazer barulho pelo Sul/Sudeste do Brasil.
As diversas mortes do rock anunciadas ao longo da segunda metade do século passado, sempre estiveram ligadas ao colapso criativo das bandas. Colapso este causado pelas imposições das grandes gravadoras, motivadas pelas exigências de consumo do público roqueiro. O surgimento de um novo estilo estabelecia um novo padrão para o rock, ou, do ponto de vista da Industria Fonográfica, mesmo produto em nova embalagem. Criava-se uma nova tendência de mercado, cuja potencialidade comercial apenas se constituía quando se tornava o padrão do gosto musical ou era oficialmente considerado rock.
O rock morria toda vez que isso acontecia, morria porque seu elemento criador era castrado, seu vigor se esvaia, a rebeldia e a selvageria evaporavam, tudo ficava chato. Esse ciclo se repetia de tempos em tempos, quando um novo estilo se tornava a bola da vez da Indústria Fonográfica.
Woodstock inaugurou os festivais megalomaníacos de rock, o que posteriormente ficou rotulado como rock de arena ou rock de estádio, dando um novo passo rumo a um formato ainda mais lucrativo. Os shows passaram a ser vendidos num formato fast-food, em vigor até os nossos dias. Milhares de pessoas amontoavam-se para consumir banalmente o rock.
Contudo, em paralelo ao mainstream da indústria do rock, sempre existiram as bandas cujos integrantes encaram o gênero musical como estilo de vida, uma forma de estar nessa porra de mundo. Bandas que atraem pessoas em sintonia com essa ideia, que buscam estar em ambientes constituídos dessa vibração intensa de quem vive sob o signo do rock. Portanto, todas as mortes declaradas do rock não passaram de boato.
Há quase duas décadas os baianos da The Honkers mantem acesa a chama da selvageria rocker, tocando onde quer que seu som possa se manifestar. Não sabemos se por opção, por desinteresse ou simplesmente por falta de oportunidade, mas o certo é que os Honkers são a antítese do que comumente se entende por “banda grande”. Geralmente esse rótulo está atrelado ao sucesso comercial e tamanho da popularidade da banda.
A grandiosidade dos Honkers está justamente na impossibilidade de lhes aplicar tal rótulo. Fazem parte de uma linhagem do rock, viva desde os primórdios deste gênero musical, que não se deixa seduzir pelo canto da sereia. Recentemente foi ao ar na internet o vídeo Stop Over Honkers Tour 2003 registro inédito da turnê da banda pelo Sul/Sudeste do Brasil em 2003. Este vídeo mostra quão vivo é o circuito underground de shows de bandas independentes de rock, inclusive expondo suas conexões internacionais.
Somos espectadores da experiência de uma banda ainda jovem (a banda contava 5 anos de idade em 2003) deixando sua cidade natal, Salvador, rumo às regiões Sul/Sudeste do Brasil. Os caras passaram por 4 estados (São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro e Minas Gerais), para 9 shows num intervalo de 15 dias durante os quais foram percorridos 6.000 km dentro de um carro de passeio dividido por 5 caras mais os equipamentos da banda.
Temos em Stop Over Honkers Tour 2003 o registro do cotidiano de uma banda e as situações que fazem parte desse tipo de vivência incomum para pessoas ditas normais, imersas em sua realidade repetitiva. São acontecimentos diversos e encontros repletos de momentos novos, intensos. Entre esses está o encontro com o autossuficiente Rerverend Beat-Man (Suiça) no dia 13 de novembro, que bateu um papo com Sputter antes do início dos shows no Black Jack, em Santo Amaro (SP). Em Curitiba temos Tilindão e Brust chupando cana na casa do Marcon, roadie dos Catalépticos, interagindo com os membros da banda e zoando o cachorro que tava por ali pegando um solzinho. No interior da casa de Marcon, onde acontecem os ensaios dos Catalépticos, rola uma troca de ideia sobre as dificuldades de promover festivais de rock independentes, expondo a realidade que as bandas encontravam naquele momento em Salvador e Curitiba. Sem falar na ideia dada por Marcon sobre o auxílio concedido pelo governo suíço aos Monters, para que fossem tocar naquele evento em Curitiba.
Na volta pra São Paulo eles se hospedam no QG da banda de Pitty e rola o encontro dos roquers baianos na capital paulista. Vem à tona outro aspecto importante da vida da cena independente: a camaradagem. Na capital mineira um encontro inusitado, no meio do transito belorizontino os Honkers encontram Claudão, cuja legenda do vídeo atribui a ele a função de Chefe do Underground em BH. Momentos que marcaram essa tour dos Honkers e que fazem parte da vida de rolês de uma banda de rock independente. Ah, vale lembrar que o Claudão levou os Honkers pra tomar breja num bar chamado Acarajé da Baiana.
Essa turnê dos Honkers pode ser considerada a turnê de pré-lançamento do primeiro EP da banda chamado Underground Music For Underground People. O Ep só foi lançado oficialmente em fevereiro de 2004 em Salvador. Contudo o Ep já estava na praça e no início do vídeo Brust e Sputter estão mostrando a arte da capa e contracapa do Ep, fazendo seus comentários a respeito das imagens e suas expectativas para a viagem. As caixas recheadas de Eps ficam em evidência e foram junto com os caras pra estrada. Underground Music For Underground People (Coverd by One Overground Band) é um Ep de covers homenageando as bandas que influenciaram em alguma medida o som dos Honkers. Ao longo do vídeo essas músicas são tocadas, uma forma de apresentar o álbum e usar as músicas como trilha sonora do registro.
Confira abaixo a Playlist com as versões originais dos covers gravados pelos Honkers para o Ep Underground Music For Underground People (Coverd by One Overground Band) . Se você passou batido pelo link para ouvir o Ep completo postado no paragrafo anterior clique aqui para ouvi-lo.
Temos que rebobinar parte da fita para voltarmos à chegada dos Honkers a São Paulo para sua primeira apresentação. Sputter troca uma idéia com o Reverend Beat-Man na entrada do Black Jack Rock Bar antes das apresentações começarem. Isso já é o bastante para gerar a expectativa de qual será o line up da noite. Além dos Honkers e do Reverend Beat-Man, os paulistas da Thee Butchers Orquestra, os paulistas da Elektrobillys e os suíços da The Monsters.
Noite regrada a psichobilly, punk, garage rock, rockabilly tudo pra sacudir o cérebro a rodo dentro da caixa craniana. Os Honkers abriram a noite e devem ter dado trabalho às demais bandas para superarem sua performance. Levanto essa hipótese baseado no que é a performance dos caras hoje, quando todos estão beirando ou já passaram dos 40 e se apresentando com a energia de adolescentes.
Em Curitiba, reduto do psychobilly no Brasil, os Honkers se apresentaram primeiramente no Camorra Bar, no dia 18 de novembro, abrindo a noite junto com a banda local Chernobillies. Logo depois veio o suíço Reverend Beat-Man.
Na noite seguinte o show foi no Empório, ao que parece uma casa de show fora do radar, perfeita para soltar os bichos sem quaisquer incômodos. Os Honkers abriram a noite pros locais Faichecleres. Ao final do vídeo vê-se pelos resultados pós shows o que transcorrera durante a noite. Sputter mostrando as costas marcadas por um tombo durante o show, quando uma mina amorteceu sua queda e levantou cuspindo abelhas assassinas sobre o vocalista.
Pra fechar essa noite alucinante, cheia de acontecimentos inusitados, o beijo apaixonado entre um dos membros do Faichecleres e uma mina, que mostra todo seu amor pelo rapaz, lascando-lhe um beijaço logo em seguida à cachoeira de vomito que flui da boca do rapaz para o chão. Amor envolvente e com sabor de punk rock. Vale perguntar: os Faichecleres cumpriram a promessa de vir à Bahia?
Na Cidade Maravilhosa os Honkers param num sebo, não para comprar livros, mas para sua próxima apresentação que rolou no porão do estabelecimento. Na Boca do Sapo rolou na noite de 21 de novembro o evento “Música no Brejo” com os Honkers e os locais Canal 1. Não há registro de nenhuma das apresentações que rolaram por ali e os caras seguiram caminho no dia seguinte em direção de Béuzonte!
Na capital mineira temos apenas imagens dos Honkers interagindo com Claudão no trânsito e à noite num bar ironicamente chamado “Baiana do Acarajé”. Depois dessa acho que o rolê já pode terminar né. Os caras pegaram a estrada de volta para Salvador após a rápida passagem pela Capital Mundial do GALO.
Esse vídeo possui uma peculiaridade, não há imagens de nenhuma das 9 apresentações dos Honkers. Ficaremos com essa pulga atrás da orelha e olhando pelo lado mais interessante: a curiosidade sobre o que é um show dos Honkers. Indo mais além e tentando imaginar como serão os Honkers ao vivo, tocando diante dos nossos olhos!!
Esse vídeo mostra a trajetória de uma banda ao longo de uma viagem, que ainda não acabou, relata uma experiência musical pulsante, viva, sempre imanente. Enquanto existirem bandas mantendo viva essa efervescência inquietante, o rock jamais morrerá!
A formação daThe Honkers durante a Stop Over Honkers Tour 2003 foi:
Sputter: Vocal
Felipe Brust: Guitarra
PJ: Guitarra
T612: Baixo
Jimmy Drummer: Bateria
Abaixo a trilha sonora que embalou a viagem dos Honkers nessa turnê. Nesta playlist encontram-se as bandas ouvidas pelos Honkers na estrada, excetuando as bandas Ativos e Resistentes (BA), Movidos à Álcool (BA) e Los Canos (BA) que vocês podem ouvir clicando sobre os seus nomes.
Playlist da turnê:
- Subsonics (USA)
- Anti-Establishment (England)
- Os Catalépticos (PR)
- Symarip (England)
- Run 229 (England)
- Stray Cats (USA)
- Barracudas (England)
- Ativos e Resistentes(BA)
- Jorge Ben (RJ)
- Ramones (USA)
- Movidos a Alcool (BA)
- Cachorro Grande (RS)
- Cock Sparrer (England)
- IRA (SP)
- Los Canos (BA)
- Thee Milkshakes (England)
- Holly Golightly (England)
- Berimbrown e Gerson King Combo