Sarathy Korwar libera sons diversos gerando um micro universo sonoro, tão diverso quanto o próprio cosmos.
Sarathy Korwar nasceu nos Estados Unidos, mas cresceu nas cidades de Ahmedabad e Chennai na Índia. Viver e crescer na Índia foi determinante em sua formação musical. Talvez seja exagero afirmar isso, mas a falta desse elemento em sua vivência pessoal tiraria de sua música o elemento que a impulsiona.
Aos dez anos de idade começou a estudar tabla, encantou-se pelos instrumentos percussivos. Na Índia conheceu sons milenares exóticos aos ouvidos ocidentais. Estruturas musicais que não se encaixam no molde musical ocidental. Polifonias que mexem com a audição, quebrando o referencial sonoro que o Ocidente consolidou através de sua dominação geográfica e cultural. Em meio à cultura indiana a barragem se rompe, o fluxo sonoro se espalha, uma nova porta perceptiva se abre.
Ao mesmo tempo que crescia dentro dessa cultura estrangeira, dentro de sua casa conhecia os arautos da música ocidental, em especial John Coltrane. Ouvindo Day To Day, seu álbum de estreia, lançado em 2016, percebe-se o interesse de Sarathy pelo experimentalismo, bem como o interesse pela riqueza sonora presente na etnicidade musical. O domínio desse campo em particular aliado ao modo refinado como explora o arcabouço sonoro da cultura indiana , fazem de Day To Day um registro surpreendente.
Ao explorar a multiplicidade sonora oferecido pelo universo da percussão dentro da cultura indiana, Sarathy assimilou ingredientes peculiares, pouco conhecidos e explorados dentro dos limites da música ocidental. Temos até aqui apenas um dos componentes de seu estilo musical. Interessado pelas técnicas de gravação e produção musical, Sarathy tornou-se produtor, permitindo ter habilidades que vão além de compor suas músicas e tocar instrumentos.
Vivendo em Londres foi atraído pelas novas possibilidades que a música eletrônica poderia lhe oferecer. As imersões musicais pelas esferas percussiva e eletrônica levou Sarathy Korwar por experiencias bastante díspares, separadas temporalmente e culturalmente. Misturar esses campos tão distintos, unir mundos tão longínquos sem gerar algo bizarro, é tarefa das mais complicadas. Por aí existem tentativas malsucedidas de combinações cujos resultados são sonoridades frias, desprovidas de emoções, impedindo que o ouvinte seja seduzido pela música. Fusões resultantes da concepção simplória de que basta misturar estilos para alcançar um som expressivo e original.
Bem orientado por um senso criativo afiado, Sarathy Korwar consegue sintetizar os elementos eletrônicos, do jazz e da música tradicional indiana habilmente, produzindo sonoridade peculiar e marcante.
Marcante em Day To Day, a atmosfera envolve o ouvinte, seduzindo devido à sua constituição leve, de efeito relaxante, meditativo. Somos levados a uma experiência dissolutiva, aos poucos, na medida que imergimos nessa atmosfera sonora, vamos sentindo a materialidade do mundo sumir. Deve-se tal efeito à constância sonora ao fundo, fazendo vibrar quase ininterruptamente notas longas, recurso que produz a atmosfera característica citada anteriormente. Dreaming, Eyes Closed e Hail, que formam o núcleo do álbum possuem toda essa característica.
Dentre as características culturas dos Siddi, grupo étnico que faz parte da população indiana, estão as heranças do islamismo e do iorubá. Por isso a forte presença da polirritmia no álbum, responsável por imprimir-lhe o caráter vibrante.
Vozes são usadas em faixas como Bismilah e Karam percussivamente, gerando pulsações ininterruptas, alternando intensidade. Bismilah sustenta boa parte de sua reprodução em levadas rítmicas iorubás usadas no afrobeat. Contrastes marcam Day To Day colocando as músicas num constante processo de alternâncias.
Mawara – Transcendence faixa que encerra o álbum devolve-nos ao mundo material ao investir em ritmos efusivos produzidos por instrumentos percussivos dos timbres mais variados. Inicialmente o clarone é usado como instrumento de percussão complementando as batidas produzidas por baquetas cujos golpes são desferidos em algum instrumento de madeira de formato cilíndrico. Formado o pano de fundo, o sax soprano aparece num improviso dispersivo, emanando notas em todas as direções, no melhor estilo free jazz.
Day To Day mostra que as possibilidades de combinações sonoras no jazz são infintas. Possibilitando o surgimento do novo em mil faces, rompendo formas e fórmulas liberando o diverso para tornar o mundo um lugar de constante renovação.
Ficha Técnica:
Selo: Ninja Tune – ZEN230, The Steve Reid Foundation
Local: Reino Unido/ Europa
Lançamento: 08 de julho de 2016
Gênero: Eletrônico, Jazz, Folk, World Music
Estilo: Free Jazz, Fusion
Arte de Capa: Joe Durnan
Direção de Criação: Dominico Angarano e Ruth Goller
Bateria, Tabla e Eletronicos: Sarathy Korwar
Guitarra: Giuliano Modarelli
Masterização: Tony Dixon
Mixagem: Nick Woodmansey
Piano e Teclados: Al MacSween
Sax Tenor e Clarone: Shabaka Hutchings
Vocais: Jaideep Vaidya e Salim Gulammohommad