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Rock’s Gringo’s: Stone Temple Pilots, Jack White, Turbonegro e mais

Rock’s Gringo’s traz mensalmente um recorte bem pessoal sobre o que estamos ouvindo e consideramos maneiro do todo produzido no mundo rocker

Nesta edição temos também: Sunflower Bean, Guided By Voices, Hot Snake e Ben Harper & Charlie Musselwhite.

 

A coluna Rock’s Gringo’s traz como proposta abordar as coisas que escutamos durante o mês e que rompe as fronteiras nacionais e que obviamente estejam na prateleira do que se convencionou chamar Rock’n roll. Por acaso nessa primeira edição os E.U.A monopolizou as atenções, com uma rápida fugida para a Noruega.

Nesse mês de Março último tivemos lançamentos de grandes nomes do mainstream rock’n roll, como os novos do Jack White e Ben Harper, mas também o mais novo lançamento do Stone Temple Pilots. Das coisas mais desconhecidas, trazemos os grupos Hot Snake e Sun Flower Bean. Ainda contamos com o peso absurdo e novo em sua carreira dos noruegueses do Turbonegro. Confira:

Stone Temple Pilots (2018)

Após oito anos sem soltar nada novo, muitas idas e vindas nesse meio tempo, eis que os caras chegam com novo material e… não decepcionam. É o primeiro disco sem um dos maiores vocalistas e front lider que minha geração viu nascer e infelizmente viu também morrer.

Após a morte precoce de Scott Weiland, a voz pela qual o STP sempre será lembrado, os caras correram atrás de um novo vocalista e chegaram a gravar e lançar um EP High Rise (2016), com o também já falecido Chester Bennington

A missão de gravar um disco inteiro com 12 faixas e dar conta de substituir Weiland e Bennington, ficou a cargo de Jeff Gutt, descoberto em um reality show chamado X-Factor. Segundo álbum homônimo do grupo, e sétimo disco de carreira, Stone Temple Pilots (2018) não mudará a sua vida. O disco não aposta em nenhuma mudança do que já conhecemos da banda, não traz revolução alguma, mas cumpre a função de lhe manter ligado ao longo dos seus pouco mais de 48:00. Os irmãos De Leo produzem com o esplendor dos veteranos, seguindo parte da cartilha que eles mesmos ajudaram a construir com seu Hard Rock nos anos 90.

O disco é uma acertada troca de punch e melodias ganchudas, passando por belas canções mais românticas como em “The Art Of Letting Go”, que ao cheirar a FM não perde nem um pouco suas qualidades. Gutt é vocalista de méritos, capaz de alternar o que lhe pede cada composição, misturando com tranquilidade o alcance e os registros de voz com a calma e a qualidade de um veterano. De algum modo, os De Leos usam aqui o Gutt como mais um instrumento para transmitir suas criações, depois de mais de duas décadas de desgaste com um temperamental Weiland, isso é um bom e merecido descanso. Um disco para adoradores de hard rock.

Guided By Voices – Space Gun (2018)

Para uma banda que tem seu primeiro lançamento em 1987, ter alcançado seu 32º disco de carreira não é pouca coisa. E tal façanha de algum modo só parece possível hoje, dentro da seara indie-rock e com a direção do sempre genial Robert Pollard.

Os rapazes do “guiados por vozes”, chegam ao seu trigésimo segundo registro de estúdio sem dar nenhum sinal de cansaço e sem aliviar nem um pouquinho a estética alternative rock que sempre foi sua característica primordial e responsável pela verdadeira legião de seguidores que acompanha essa banda de Dayton, Ohio. Se é verdade que o prolífico Robert Pollard nunca parou de produzir ao longo de seus mais de 30 anos de carreira, é fato que fazia um tempinho que não ouvíamos um disco tão bem resolvido como esse Space Gun.

Ele reuniu para a gravação de August By Cake e How Do You Spell Heaven ambos de 2017 a trupe formada pelos guitarristas Doug Gillard e Bobby Bare Jr., Mark Shue no baixo e Kevin March nas baquetas. O resultado é um álbum extremamente encorpado, robusto e floreado com inventividade e muita força suas melodias tortas e a escrita já famosamente misteriosa de Pollard. Guitarras produzindo muros sonoros por onde a poesia do Robert Pollard e sua voz atravessa com uma força absurda.

Ao longo das 15 faixas do disco não nos foi possível identificar nenhum ponto fraco, e mais do que um mero apanhado desleixado de canções, o que temos aqui é talvez um dos melhores discos do Guided By Voices em anos. Vai sem medo, que é viciante!

Sunflower Bean – Twentytwo In Blue (2018)

Segundo disco desse power trio formado no Brooklyn em Nova Iorque e que chega de forma bem diferente do seu álbum de estreia Human Ceremony (2016). Uma deliciosa surpresa dessas que você se sente contente de encontrar nesse mar de mesmice e chorume que a internet tem se transformado. Preparado para dar um tempo naquele grupo chato de whatsap? Coloque-o no mundo e prepare-se para ter a voz de Cumming lhe carregando em doces e agradáveis sonhos.

Formado pelo guitarrista/vocalista Nick Kivlen, pela baixista/vocalista Julia Cumming e pelo baterista Jacob Faber, o Sunflower Bean ataca com a maturidade adquirida os problemas que seu país enfrenta hoje. Desde as impressões pessoais sobre as mudanças pela qual passa o clima político nos E.U.A na faixa de abertura “Burn It“, até criticas abertas ao desastre eleito presidente Donald Trump, na faixa “Crisis Fest“.

No aspecto musical o Sunflower Bean se configura como um pop muito bem feito, um rock calcando-se na herança estrutural de um Fleetwood Mac, na fase áurea de Rumors e pitadas de Glam Rock, por exemplo. As comparações são unânimes nos principais veículos de música ao longo da internet, é uma banda que se compromete para uma audição tranquila mas que vai além do meramente agradável. A banda se apresenta muito coesa e os vocais de Cummings seduzem pela doçura. Acredito valer a pena acompanhar essa banda e ver por quais caminhos eles trilharão daqui pra frente.

Turbonegro – Rock’n’Roll Machine (2018)

Agora chegamos a um registro digno do que de melhor a música pesada tem a oferecer. Dos criadores de Apocalypse Dude (1998), Ass Cobra (1996) e Scandinavian Leather (2003), temos essa máquina que ao invés de decolar, nos transporta numa viagem no tempo. E os timers foram ajustados para algum lugar dos anos 80.

O Turbonegro lançou Rock’n’Roll Machine seis anos após seu último álbum de inéditas e ao que parece esse tempo levou os caras a querer experimentar. Essa banda norueguesa responsável por verdadeiras gemas de um verdadeiro Death Punk, chega ao seu 12º álbum (incluindo discos ao vivo) diminuindo o power, mas não decepciona. Atualmente formado por Happy-Tom (baixo), Euroboy (guitarra), Tommy Manboy (bateria), Rune Rebelion (guitarra) e Tony Sylvester (vocais), começam muito bem no esquente para a máquina decolar.

Os caras decidiram nesse disco fazer uma volta a estética oitentista da música pesada, e para isso os teclados de Haakon-Marius Pettersen dão uma excelente contribuição. As três primeiras faixas denominadas como “Rock’nRoll Machine part. I, II e III” fazem uma referência excelente aos anos 80, com peso e urgência. Ainda por cima traz um toque retrô charmoso para as composições, apontando um caminho interessante.

O disco segue muito bem com “Fist City“, “Hurry Up & Die” e a tecladeira volta em “Skinhead Rock’n’Roll” uma das melhores do disco. Ecos longínquos de The Who em “Hot For Nietzsche“, “On The Rag” é outra boa porrada, a introdução dos teclados futuristas em “Let The Punishment Fit The Behind” avisa do ritmo mais lento e moderado mas nem por isso menos cheio de punch. “John Carpenter Power Ballad” parece um balada saída totalmente dos anos 80 e dos grupos de hair metal, enquanto “Special Education” fecha o disco com dignidade. Escute, os caras sabem bem o que fazem.

Hot Snakes – Jericho Sirens(2018)

Antes de falarmos do disco basta dar uma sacada na ficha corrida desses caras para entendermos porque Jericho Sirens já entra na minha lista de melhores do ano. 

Mario Rubalcaba é além do alucinado das baquetas nesse disco, o responsável pelas viagens rítmicas e alucinatórias no Earthless. Já o outro batera Jason Kourkounis tocou em bandas como o Bardo Pond e no clássico Mule. Rick Forberg segura as guitarras e vocais dos seminais e influentes Drive Like Jehu, assim como John Reis que também fez parte do Rocket From The Crypt. Gar Wood segura o baixo dessa rapaziada, depois de larga experiência de estúdio gravando muitas dessas bandas. Levando em conta essa folha corrida de serviços prestados, somente a nossa ignorância não perceberá que se trata aqui de um dream team do barulho.

Faz algum tempo que não escuto um disco de rock com tamanha urgência e sem nenhum sinal de tatibitati, apenas porrada do inicio ao fim sem freio e sem piedade. Algo que está no DNA dos primórdios e nas melhores expressões do rock and roll; Apesar desse gênero musical ter alcançado tamanha complexidade que hoje fica difícil falar nesses termos, sem parecer um xiita. Escute a faixa de abertura e saberá o que lhe espera ao longo de toda a bolacha. I Need a Doctor abre o disco como o verdadeiro anúncio da hecatombe pelo qual seus ouvidos vão atravessar.

Depois de 14 anos sem lançar nada essa é realmente uma volta a se comemorar, especialmente por se tratar sem sombra de dúvidas do melhor álbum dos caras. Tudo está no seu devido lugar, as guitarras não nos dão descanso, numa rifferama desgraçada até nas menos espancadoras como é “Death Doula”.  A bateria assume a força primal de forma autêntica em faixas como “Death Of A Sportman”. “Candid Camera” é onde você ouve a potência e o groove do baixo em ação nessa ode da podreira torta. Os vocais estão sempre ali alguns centímetros acima do barulho como um outro instrumento de emissão da expressão de fúria e violência que o disco transpira. Ouça muito alto que é bom pra caralho.

Jack White – Boarding House Reach (2018)

Se você é minimamente familiarizado com as produções do menino Jack, suspenda um pouco seu juízo de valor, e o seu gosto já pré construído e escute o disco. Você perceberá rapidamente que está diante de algo que procura se distanciar do que o artista produziu até o presente momento. 

É sempre interessante perceber um produtor da arte arriscar-se a sair de um território conquistado ao longo de anos de luta. E Jack White em seu novo disco arrisca pesado, procurando outros ares para sua música. Em alguns momentos estranhas construções sonoras nos atacam, para em outras localidades nos sentirmos deliciosamente referenciados e apesar do novo local, possuímos algumas referências daquele espaço tempo. Foi assim que o nosso passeio por Boarding House Reach (2018) se deu, com o bom e velho espanto que nos leva a pensar.

Se é fácil perceber a força do Blues-rock, seu amor por Bukka White, lendário cantor dos country blues norte americano embebendo e influenciando sua música. Nessa nova empreitada, o lance é o funk, o soul e o gospel as grandes influências que percorrem o disco. Você encontrará também uma baladinha, um faixa que lembra um rap e ecos do bom e velho rock de arena, mas é o Funk/Soul quem melhor hegemoniza o disco.

A faixa de abertura “Connected By Love” talvez seja a única que lhe dará um cheiro do que antes o artista produziu. Porém se pularmos para o swingado, mega groovado quase rap “Ice Station Zebra“, você provavelmente não encontrará elemento de comparação em sua obra. “Over and Over and Over” é outra faixa onde a funkeação come solta, não sei não, mas me pareceu uma homenagem ao RATM. A percussão em alta voltagem swinguistica é outro dado muito interessante nesse disco, em faixas como “Everything You’ve Ever Learned” e “Respect Commander“, com suas construções diferentes encontram coloridos novos para música de White.

Um disco para ir aos poucos descascando como uma cebola.

Ben Harper & Charlie Musselwhite – No Mercy In This Land (2018)

Em time que está ganhando não se mexe, nesse caso, na dupla que ganhou o Grammy, com o excelente Get Up (2013). Uma parceria que inevitavelmente nos remete aos grandes Sonny Terry & Brownie Mcghee ou Muddy Walters & Little Milton

Recentemente, me questionava, ainda continuo a me interrogar, sobre as velhas formas de se fazer música sobreviverem de modo integro, envolvente e forte artisticamente. O blues sobrevive e Ben Harper & Charlie Musselwhite poderiam ter gravado esse disco em 1954 ou em 2038, o efeito dado o resultado apresentado, será sempre o mesmo. Música clássica negra, que nos pega pelo estomago e nos prende como faziam outros artífices do gênero. A devoção que possuímos pelos pioneiros não pode nos nublar a visão e reconhecer a imensa qualidade de um álbum como No Mercy In This Land (2018).

Canções como “Trust You To Dig My Grave” são a expressão mais plena do blues, a cantar o azar, o sofrimento, a dor das perdas, dificilmente não se emocionar. São dez faixas que superam o disco anterior da dupla, num disco mais variado em suas expressões, que passam também pelo gospel e pelo R&B. Ben Harper há algum tempo alcançou aquele status de artista capaz por trafegar com excelência por diversas expressões da música negra, do rock ao reggae, do blues ao rap. Charlie Musselwhite, talvez seja um pouco mais desconhecido, mas é um dos grandes gaitistas vivos e para quem não o conhece merece uma passada pela sua extensa e excelente discografia. Que venham mais discos dessa dupla. 

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