Oganpazan
Destaque, Lançamentos, Música, Notícias

Rima Dela #2 Do Arco Irís ao Preto e Branco!

Rima Dela #2 produção pesada da Soul Di Rua agora em preto e branco, focando a luta num espectro mais restrito, mas tão intenso quanto na #1

As cyphers estouraram  dentro do rap nacional e nesse movimento, muitas se tornaram lendárias, a exemplo dos projetos Favela Vive e Poetas no Topo, que mexeram bastante com o mercado e com a cena do rap nacional. Pra variar, os dois projetos acima tinham apenas homens, no entanto, as minas do rap nacional não dormem e nem se acomodam com a opressão e os constantes movimentos para invisibiliza-las.

Sendo assim, as minas se inseriram nesse movimento, e algumas das melhores cyphers nacionais são sim protagonizadas por mulheres, a exemplo de Machocídio e a Nordeste Mundo Cypher, ainda em 2016. Mas também, alguns outros excelentes projetos vieram a tona, a exemplo de: o EP 4 do Simios (Bruxaria) e o Psicopretas que mostram de forma muito evidente a qualidade e a força das mulheres do rap nacional.

Dentro desse contexto, e é aqui que se insere o nosso objeto de análise, surge no final do ano passado o projeto da Cypher Rima Dela, com a ponta de lança pique Marta, Becca Vilaça na produção executiva do coletivo Soul Di Rua. Um coletivo que vem militando desde 2014 produzindo conteúdo de altíssima qualidade dentro da cultura hip hop nacional.

Em seu primeiro episódio, e aí é preciso ter em vista diversos fatores, a escolha estética e politica privilegiou um bonde de mulheres diversas. Uma escolha que propiciou o dísparo de pautas múltiplas, que atravessavam questões como negritude, racismo e genocídio da população negra, gordofobia, questões LGBT, maternidade solo, invisibilidade das manas e problemas de classe. Elencados com muita qualidade nas rimas de: Issa Paz, Sara Donato, Anarka, Bia Doxum, Brisa Flow, Clara Lima, Alinega e Alt Niss.

O feminino tratado no plural em Rima Dela Cypher #1, fez um barulho entre o público e alcançou um bom numero de visualizações no youtube. As singularidades de cada uma das artistas que deitaram num beat do LR Beats e foram capturadas pela direção de Karú Martins, deixavam muito claramente dito ali, que as minas precisam de mais espaço e estão municiadas para conseguir. Num esquema nois por nois, a equipe de produção do vídeo toda formada por mulheres foi uma excelente iniciativa no rumo de fazer o jogo virar na direção das diversas mulheres que trabalham no rap.

Karu Martins e Becca Vilaça em ação durante as gravações. Diretora e co-diretora, responsáveis pela excelente concepção estética do vídeo.

A concepção estética da segunda cypher do Rima Dela, é algo que precisa ser visto e analisado levando em consideração o conjunto das produções e sobretudo a continuação mesma do projeto. Becca Vilaça e Karú Martins conceberam um roteiro que dialoga de modo exemplar com a situação atual do país, mais centrando suas visões do caos, em duas questões básicas para a compreensão de todo esta conjuntura. 

O golpe parlamentar dado em nossa presidente democraticamente eleita, revelou duas questões que são sabiamente tratadas do vídeo dessa cypher. O nosso machismo, que durante todo o processo de construção do impeachment aflorou em suas faces mais grotescas, mas também o nosso preconceito de classe, o nosso horror a pessoas pobres.

No entanto, é preciso que se tenha consciência de que no Brasil esse preconceito de classe necessita de um recorte racial, e uma vez feito esse recorte, descobriremos que é o horror a pessoas negras quem está por trás da ojeriza da nossa elite politica e econômica ainda de mentalidade escravagista.

E é esse movimento histórico, racial e politico que recebe uma saraivada de tiros por parte do Rima Dela # 2. Nessa edição, a composição ficou enxuta na mesma medida em que focou nos problemas acima mencionados. Participando com a excelência já conhecida de outros trabalhos, foram recrutadas para essa empreitada a poeta Mel Duarte e as mc’s Bianca Hoffman, Souto Mc, Cris SNJ e Killa Bi.

A estrada sonora por onde essas minas desfilam uma lírica pesada ficou por conta do Grou que produziu um boom bap muito classe, por onde as minas bateram de todos os modos possíveis. Temos assim a gênese estética e politica apresentada na forma de um roteiro que recua de algum modo até um perspectiva gangsta rap, para produzir uma critica áudio visual necessária no cenário atual. Enquanto o rap game se furta a criticas mais severas sobre a nossa conjuntura politica, as mulheres seguem no front, pois por tudo dito acima, a luta é o que lhes resta.

Para essa luta, o vídeo é bastante didático em suas intenções e no modo como apresenta-se em seu desenvolvimento, a começar pela fotografia. Se no primeiro video a pluralidade de pautas demandou um contingente grande de mc’s e a paleta de cores estava aberta. Nessa “segunda parte” o preto e branco foi criativamente escolhido pois assim fica mais claro sob quais divisões se está falando.

A abordagem dos temas é introduzido pela professora Mel Duarte com um spoken word capaz de escurecer as ideias e criar a revolta e atenção necessárias pra luta. Movimento que recebe a continuação da resistência coletiva encarnada nos versos da Bianca Hoffman, que produz um agenciamento coletivo de lobas capazes de botar terror não apenas nos pastores, mas de fazer as ovelhas perceberem que estão rumo ao abate. 

A formação de quadrilha segue com o financiamento encarnado pela Souto Mc, que dentro desse bang atua nas rimas e na semiótica do clipe como aquela que reconhece o roubo e a exploração histórica sofrida pelo nosso povo e vai financiar a retomada do que é nosso por direito. Para tal, é necessário recrutar um guerreira experiente, e nesse pique Cris SNJ uma das lendas do rap nacional ainda em plena atividade e cada dia mais pesada, nos aparece na pegada general Okoye

Tão bonita quanto, igual na  habilidade da general Okoye, é a experiência nas lutas dentro do cenário hip hop brasileiro, que faz com que a Cris SNJ seja aqui e onde mais estiver, um signo muito forte de tudo que o hip hop pode representar. Mulher negra, a milianos no rap a “personagem” dela traz a sabedoria da luta racial, desde o movimento dos direitos civis americanos, até a construção da força do rap nacional.

E então o plano vai ser executado, trazendo-nos com excelência a execução fabulada de uma pauta que segue do individual ao coletivo com a força que poucas vezes observamos. Killa Bi, é a responsável pelo fechamento da ação e o faz com maestria, sequestrando um macho escroto que ao preterir, tomar o que era de uma mulher, colocou todo o futuro de um país em suspensão. Aqui a vítima é o Michel Temer, no entanto, e esse é o jogo que fascina, esse macho branco escroto está em toda parte. 

Esteve nas casas grandes estuprando mulheres negras, é o chefe das grandes empresas que negociam nosso futuro e nos exploram, são os políticos que assaltam diuturnamente os cofres do país, estão nesse momento na Russia (um amostra no estrangeiro) gravando vídeos nojentos contra mulheres. Está em mim como parte da minha construção subjetiva e das minhas atitudes enquanto homem, é o modelo e o padrão que estrutura a sociedade patriarcal e branca em que vivemos.

E nesse sentido, essa complexidade colocada as claras pela parte dois da cypher Rima Dela é uma verdadeira aula para todos e todas que tiverem a dis-posição de entender quais são os sentidos da luta. O coletivo Soul Di Rua continua de parabéns por seguir produzindo visibilidade e arte ás guerreiras do rap nacional. Obviamente, as artistas envolvidas também, estão de parabéns e seguem levando a tocha da luta que o hip hop empreende desde o seu inicio, igualdade e inclusão a todas as minorias oprimidas.

Assista:

 

Matérias Relacionadas

Vivendo do Ócio divulga o clipe de Radioatividade

Bruno Sampaio
10 anos ago

Oganpazan entrevista Bike

Carlim
2 anos ago

Ativos Resistentes lançam single, uma prévia do novo álbum

Carlim
1 ano ago
Sair da versão mobile