Após um hiato de mais de uma década sem álbuns de estúdio, o Rammstein lança uma descarga elétrica de alta voltagem.
O nome do álbum, Rammstein, é mais que apropriado por se tratar da retomada da pujança e do vigor sonoro característicos da banda em seus melhores trabalhos. Geralmente os álbuns são batizados com o mesmo nome da banda nos primeiros trabalhos, por isso simboliza tão bem a aura que paira sobre as performances e composições que fazem parte do set list do álbum. Também a capa se mostra uma metáfora acerca do que a banda apresenta aqui. Um fósforo intacto, simbolizando o início, a sensação de terem se deparado com a mesma sensação de 25 anos atras, quando a banda dava início à sua trajetória.
Geralmente a metáfora mais apropriada após duas décadas e meia de carreira seria de algo que represente o desgaste das carreiras das bandas, usa incapacidade de se reinventar, de encontrar novas motivações para compor e buscar uma nova sonoridade. Nesse caso a capa deveria retratar um palito de fósforo desgastado até próximo de sua extremidade inferior. Contudo, estamos diante de uma obra cuja simbologia está ancorada na realização daquilo que representa.
Podemos acrescentar que a banda ao dar esse passo “para trás” dá dois pra frente. Isso porque alem de recuperar a intensidade original, conseguiu agregar certa elegância e graciosidade à sua sonoridade. Uma ouvida, mesmo que rápida de Rammstein, leva-nos a perceber o aumento do alcance dessa mesma sonoridade, além da presença de texturas experimentais, aproximando-se de álbuns do meio da discografia da banda como Mutter (2001) e Reise, Reise (2004).
A Rammstein mantém seu núcleo sonoro intacto. A natureza melódica e pesada se conserva principalmente pelo protagonismo do tecladista da banda, Flake, que em Rammstein, se destaca em comparação com os álbuns anteriores. Enquanto a dupla de guitarristas nos fornece uma nova coleção de riffs efervescentes e viciantes, o uso das diferentes vozes do teclado eleva a densidade das músicas.
Os sintetizadores são a peça fundamental deste álbum. Quando apontamos para o tom experimentalista do álbum nos remetemos ao modo como o instrumento foi usado nas composições. As pitadas de euro-techno presente em faixas com “Auslander” e “Radio” geram sentimento nostálgico pois nos remete de certo modo à sonoridade de outros alemães, os do Kraftwerk. A batida em determinados trechos da música se concentra num bate estaca que nos joga num clima de have.
Em termos de temática o álbum segue o viés da crítica social. Batem em questões centrais que afligem o mundo contemporâneo como nacionalismo (“Deutschland“), religião (“Zeig Dich“) e exploração sexual (“Auslander“, “Puppe“). Enquanto Auslander (Estrangeiros) aborda o turismo sexual, Puppe (Boneca) aborda a prostituição infantil e a pedofilia. Esta faixa em particular tem clima bastante tenso ao longo da primeira parte da música até alcançar intensidade e partir para uma interpretação mais agressiva, colocando-nos diante de uma atmosfera torpe.
Radio faz crítica à política de controle individual usando a divisão da Alemanha após o desfecho da Segunda Guerra Mundial como metáfora para a situação na qual vivemos em nosso tempo. Na Alemanha Oriental, controlada pela União Soviética, o rádio virou um instrumento de luta contra a repressão do estado. Isso porque o radio representava o acesso à informação livre da influência do estado. O rádio permitia às pessoas que viviam daquele lado do país terem acesso a informações s sobre o que acontecia para além dos muros, tanto concretos quanto invisíveis, que cerceavam a liberdade dessas mesmas pessoas.
Geralmente o passar do tempo só melhora o sabor do vinho e do Whisky, fortalece as amizades e desgasta a capacidade criativa das bandas, tornando as sonoridades cansativas e desinteressantes. Ocorreu o contrário com a Rammstein, que só fez melhorar ao longo dessas duas décadas e meia. Seu álbum homônimo é uma obra de excelência, antenada com seu tempo e disposta a entregar aos fans de música, além de uma necessária reflexão sobre questões que afligem o mundo contemporâneo, músicas com sonoridades distintas e vibrantes.