Oganpazan
Destaque, Dicas, Discos, Discoteca Básica, Hip Hop Barril, Música, Resenha

“Por Ventura” completa 10 Anos, disco de estreia do Jamés Ventura segue atual! – Review e Entrevista

Jamés Ventura

“Por Ventura”, disco de estreia do Jamés Ventura segue atual e potente, 10 anos depois, um símbolo do underground nacional!

“Isso é cultura, Jamés Ventura, por ventura” 

Um disco icônico, um artista que segue em atividade como um dos pilares da cultura hip-hop paulista do século XXI e obviamente como influência para o resto do país. Jamés Ventura lançou em 2012 o seu álbum de estreia: “Por Ventura” que neste mês de maio completa 10 anos. Uma marca que precisa ser comemorada, uma obra de arte que precisa ser redescoberta pelas novas gerações, um grafiteiro e MC’s que segue nos ensinando que a resistência inventiva sempre será mais importante que o hype. 

Entre a sorte e o azar à qual a palavra “ventura” remete, Jamés que a carrega como sobrenome artístico, se equilibra como um malabarista das rimas em uma carreira que conta com 3 discos e 3 EP’s, videoclipes e dezenas de participações. Se por aqui houvesse realmente valorização da cultura hip-hop seria um artista incensado, alguém facilmente reconhecido no panteão do rap underground nacional, assim como da cultura hip hop em geral. Pelos serviços prestados, pela longevidade da carreira e da caminhada que já atravessa duas décadas, mas sobretudo, por manter-se atualmente criativo, produzindo. 

Dentro do inexistente cânone do rap nacional underground, “Por Ventura” é um disco que se destaca como uma das produções mais relevantes do ano em que foi lançado, e ainda hoje se mantém atual. O termo clássico poderia descrevê-lo, porém como não existe canône é difícil mensurar quais os discos que influenciaram e quais se mantêm relevantes uma década após o lançamento. Neste segundo aspecto, certamente a estreia do Jamés se encaixa como uma luva.  

Composto por 9 faixas e um remix, o disco apresenta uma ampla variedade de temas e de técnicas, Jamés Ventura leva o disco praticamente sozinho, com a participação em refrões da Marcela Maita, Jeff E e do Rodrigo Ogi. De love songs em chave storytelling: “Queda do Castelo”, a faixas pesadas como “O Rap é Fato” e “Fogo”, a cadência da vivência de um jovem artista negro do hip-hop: “Por Ventura” à afirmação de sua quebrada: “Saudosa Maloca”, o disco desenrola-se macio no play do início ao fim. A ficha técnica reúne um time de primeira grandeza, nos beats: Ogi, DJ Caique, Renam Samam, Scotts Beats, Dario Beats e o remix ficou por conta de Sagat, a mix e a master é obra do Munhoz.

Exercício interessante neste 2022 é fazer o exercício de ouvir de modo crítico: “Odeio Político”, e perceber o quanto é necessário hoje e mais do que nunca, acordarmos para que possamos entender a real estrutura política na qual se funda a nossa democracia branca e burguesa. O audiovisual dessa música é uma obra prima de humor, dando-nos a dimensão da farsa e do teatro do absurdo ao qual somos convocados a participar nas eleições. Vários nomes como Rodrigo Brandão, Ogi, Munhoz, Paulo Napoli, Zorack, Venom, entre outros compõem a propaganda eleitoral enquanto o próprio Jamés Ventura interpreta um desses muitos que em ano eleitoral tenta se chegar pro povão em um audiovisual com excelente produção. 

Outra faixa emblemática dentre tantas, é a “Irmãos de Tinta”, um hino que transforma em rap suas próprias vivências, numa celebração deste importante elemento da nossa cultura. Vale informar que no ano passado essa faixa recebeu a parte 2 no disco do grande Sono TWS. Rua até a medula, a obra de Jamés Ventura segue contagiando os corações que amam o rap, pois possui aquela essência difícil de descrever que é a transformação das vivências reais em arte. 

“Palavra é bisturi com uma lâmina boa”

A substância que está presente em “Por Ventura” pode ser representada muito bem pela faixa inédita que fecha o disco, “Fogo”. Uma das produções do Ogi no disco, um boombap pesado e que também nos remete a música jamaicana, uma das origens do rap, mas liricamente é transmutada por Jamés Ventura no elemento primordial para a vida. O fogo da criação, o fogo que possibilita a vida e a morte, o fogo que gera um ambiente para a comunhão queimando um beck ou ao redor da fogueira.

O melhor de tudo isso é que Jamés Ventura está aí, firme e forte e possui muita lenha para queimar ainda, celebremos os 10 anos de Por Ventura, reconheçamos a importância deste artista para a nossa cultura. Fizemos uma breve entrevista com ele, para sabermos mais alguns detalhes desse momento de sua carreira, e você confere abaixo: 

Oganpazan – Olhando para trás hoje, em que momento da sua vida “Por Ventura” surge? E qual foi a importância desse trabalho de estreia naquele momento, para você enquanto homem e artista?

Jamés Ventura – Cara eu lembro meus primeiros raps gravados com o Pitoco (Reinaldo A286 ) Dona chica minha mãe tinha um rádio que gravava cassete ai nois gravava nossas ideias ali. Era mágico já ouvir a parada  eu queria mais só q não sabia onde e tal em 2001 foi a primeira vez que gravei no estúdio, saímos com o cd escutamos na quebrada era bem loco ouvir minha voz, eu queria mais daquilo e já tava cheio de letras. Em 2004 eu já tinha as letras desse trampo, escrevi nos beats do “Metal Fingers Vol. 1” e devido a escrita dos muros da cidade já conhecia o Ogi que já tinha uma articulação com a rapa dos beats.

Nessas aí conheci o Caíque e veio o “Rap é Fato” que teve vídeo clipe bem loco e me deu um visibilidade na cena, sem dúvida foi ali que notei a importância que tudo isso tem pra mim, seja meu trampo de estreia ou um rap de alguém que eu gosto me fez artista e viver o respeito ao próximo. O Hip hop é escola grátis, sem preconceito algum foi assim que aprendi.

Oganpazan – Como foi a preparação e a gravação desse trampo? De que modo se deu as composições, a escolha dos beats, seleção dos temas?

Jamés Ventura –  Os beats eu escolhi  ali na calma, lembro que algumas faixas tinham outra batida, chegou um pack do Dario, do Saman, do Caíque, lembrança boa. Os do Ogi eu tava ali direto com ele, ouvia os deles e já dava a multa. 

Os temas é sempre vivência nossa ou de alguém próximo e meio que natural pra mim porque tô vivo nas ruas vivenciando as fitas em geral  que rolam sempre nas ruas.

Oganpazan – Você já falou em entrevistas que suas grandes influências iniciais são o gangsrap. Como se deu a passagem do compor do gangsta para uma pegada underground? Quais eram naquela altura as suas principais inspirações no underground nacional?

Jamés Ventura – Então no ano de 98 quando apenas gravava as fitas cassete rolou um mural no Cambuci, Gêmeos, Vitche, Marcone, Flip, Hebert, Baglione, Nina. Meio que um encontro de graffiti e foi ali que eu conheci o Paulo Napoli que já escutava uns bagulho mocado, ai dali conheci Venom, Leco, Zorak, e toda essa rapa que já fazia a parada ali no início dos anos 2000, e assim rolou essa mescla UnderGangster Hahahahahahha

Oganpazan – Qual foi o impacto e o retorno que “Por Ventura” te deu em termos de cena, profissão etc..?

Jamés Ventura – O impacto foi enorme e eu vejo isso hoje porque ainda encontro pessoas na rua e eles me falam sobre a “Queda do Castelo”, toda eleição alguém me marca em “Odeio Político”. É de praxe, alguém me tromba e manda 1 o “Rap é Fato” Jamés! Dinheiro não fiz muito não mais teve uns shows aí bem remunerado sim e tamo ai ainda pra buscar mais capital!

Oganpazan – De que modo você percebe a memória da cena hip-hop, diversos nomes fundamentais para o nosso rap underground são ilustres desconhecidos, e trabalhos essenciais parecem não serem ouvidos mais hoje em dia, a que se deve essa desvalorização e apagamento em sua visão? 

Jamés Ventura – Mano uma das paradas q tem q ser feita pra esse esquecimento não acontecer nois ta fazendo agora, essa troca de ideia aqui é fundamental porque aquele que for procurar alguns nomes citados aqui já vai conhecer coisas boas lá dos primórdios dessa cena Underground. Hoje é tudo em 1 click é fácil só que existe uma máquina muito bem estruturada pra fazer bombar quem paga, eu acredito muito nos mcs que fazem o trampo e nos sites que dão valor real ao trabalho, não só nos likes porque tem muito bagulho bom com pouca visualização, na real visualização não garante qualidade ! #PAZNAPENHA

Oganpazan – Esse ano você lança o seu quarto disco de carreira, né? O que você sente diante de toda essa caminhada, quais são as reflexões que você faz sendo um homem preto no underground, com uma discografia icônica, se mantendo e seguindo como uma figura fundamental da cultura hip-hop? 

Jamés Ventura – Então mano, muitos vezes tenho que dar meus pulos por falta de show infelizmente os streaming não me ajuda a pagar todos os meus gastos.  O Hip-Hop que eu conheço me mostrou o racismo, me explicou um monte de fitas sobre a vida que eu levo e uma delas foi que somos todos iguais, já me peguei muitas vezes nessa brisa, o meu movimento não exclui ninguém até aqueles que na sociedade me vêem como uma ameaça são super bem vindos em eventos de qualquer que seja o elemento do Hip-hop. Eu sou insistência pura, infelizmente da minha época muitos brecaram a caminhada, eu quero continuar fazendo história e aprendendo com os mais velhos, esse é meu alicerce pra continuar. Enquanto existir hip hop eu vou existir também.

-“Por Ventura” completa 10 Anos, disco de estreia do Jamés Ventura segue atual! – Review e Entrevista

Por Danilo Cruz 

 

 

 

Matérias Relacionadas

Viktor Arkad pediu dupla: “A De Fora é a Minha (2022)” – Resenha

Paulo Brazil
3 anos ago

Wender Zanon e a cena em: This is Canoas not POA/ Entrevista!

Dudu
4 anos ago

Paraíso da Miragem – Russo Passapusso

Bruno Sampaio
10 anos ago
Sair da versão mobile