Pazsado traz Empatia, seu novo disco com produção do DJ B8 em um 2022 onde ressurge com força a nova Golden Era no Brasil
O que diabos é essa nova Golden Era que muito se tem falado no underground nacional e americano? O disco Empatia do MC Pazsado que traz 16 faixas com produção do DJ B8 responde essa questão com maestria. O que se tem chamado de nova Golden Era é nada mais nada menos, que a renovação de um modo que é próprio do fazer rap em sua era de ouro, samples loucos, batidas cadenciadas dentro do boombap, rimas e flows sem estarem engessados em fórmulas pop e agora com muito drumless.
O que se chama de New Golden Era é o reaparecimento no mainstream americano de um modo de ser, de uma existência negra que ajudou a revolucionar os meios técnicos de se fazer música. A cultura do sample, a busca por uma poesia rimada com técnicas revolucionárias, singulares e uma sonoridade suja, com a inserção de loops e batidas com pouca acentuação ou ausência mesmo de batidas, tem chamado atenção de muitos ao redor do mundo, com o sucesso de nomes como Roc Marciano, Rome Streetz e o Griselda, entre outros.
O artista paulista Pazsado é um nome importante do rap nacional que poucos conhecem, mas que seguiram ao longo dos anos no underground, produzindo. E assim como seus parentes estadunidenses, nunca deixou a herança da “Golden Era” morrer. O que se tem chamado de Nova Golden Era é um movimento de resgate e continuação, de renovação de uma sonoridade que nunca deixou de ser feita, ambientada agora na segunda década do Século XXI. E neste sentido, a contribuição que Empatia nos oferta dentro deste movimento é a de nos oferecer um grande disco de rap.
Grande disco de rap pois a noção de “Empatia” em 2022 é algo que continua em falta, e aqui serve de vetor que atravessa todas as 16 tracks presentes no trabalho. A produção de DJ B8 faz brilhar o ouro mais puro de batidas muito bem construídas e que nos ajudam a barrar um pouco o clima de velocidade chapada que é apresentado por outras produções do Trap, do drill e do grime. Existe uma questão temporal e espacial nos beats do boombap que privilegiam um pensamento mais espaçoso e requerem uma atenção mais detida nas ideias e em como elas são apresentadas.
Não há aqui nenhum resquício de causalidade que implique uma qualidade superior entre o boombap em relação às novas sonoridades (trap, drill e grime) mas existe uma outra perspectiva estética e existencial. Lá nos longínquos anos 90 se consolidou um modo de pensar a música, a negritude, a opressão e a história e a política onde os versos e a música buscavam um afastamento das formas standard de produção que se aproximavam do pop. O rap mais underground, o rapjazz buscavam a criação de climas e líricas mais refinadas em suas construções, seja nas ideias ou na música. Mesmo o Gangsta rap buscava em construções sonoras que se baseavam na tradição do soul, funk e jazz para construir as trilhas de suas rimas.
È nesses pique que Pazsado reaparece com um disco novo, após 9 anos do lançamento do bom Pós Tropicalismo (2013). Terceiro disco do MC que conta ainda com o seu disco de estreia O Tropicano Volume Zero Miscelânia (2008) e com EP Menos 10 Graus (2020). MC experimentado, técnico e portador de uma visão política muito adequada aos tempos em que estamos, Pazsado faz um disco que possui público em todos aqueles que buscam refletir sobre a vivência em nossas metrópoles e nas ideias que tem apodrecido o nosso tecido social.
Vivemos hoje um momento político onde a “Empatia” de que nos fala o Pazsado está em falta, pois como todos os sentimentos humanos, ela precisa ser estimulada politicamente. E é isso que as rimas do Pazsado e as batidas do DJ B8 nos estimula, nos impulsiona a pensar, a reconhecer a dor dos outros, num exercício de alteridade que aqui ganham os contornos estéticos de uma obra conceitual que atravessa diversas dimensões da vida humana, diversos personagens e situações.
Ideias que hoje vigoram no espaço público e entre grande parte da opinião pública das redes sociais, e mesmo entre formadores de opinião e rappers, as noções de meritocracia, de uma igualdade sem equidade, de uma pseudo vontade capaz de suprimir todos os obstáculos estruturais, são rigorosamente execradas aqui. E não com argumentos construídos poeticamente, dentro dos espaços sonoros do boombap. É sobretudo, um exercício de real Empatia rumo ao reconhecimento da falsidade desses falsos argumentos vomitados sem nenhuma reflexão.
Contando com diversas participações de peso como: Mascote, Guifer, Arnaldo Tifu, Gabriel Diaz, Thiago Ultra, Rodrigo Tuchê. Fidell e Choco, Pazsado e DJ B8 conseguem segurar o ouvinte durante nada menos que 51 minutos e 21 segundos. Não custa esforço algum, é apenas ouvir sobre determinantes existenciais como o Tempo, como estruturantes políticos como o Trabalho e Dinheiro, diversas situações como o amor e o fim dele, a escrotidão da história colonial. Assim como de personagens que vivem ao nosso lado e muitas vezes não os enxergamos, como os motoboys e os mendigos.
Ouvindo o disco detidamente nas últimas semanas eu diria que este é um exemplar feito para ouvintes maduros, mas isso seria criar um etarismo bobo, pois sabemos que existem os novinhos que castelam essas ideias. Ouvir Empatia é o primeiro passo para conseguir transmutar e unir a Empatia (empatheia Em-Paixão) o que o MC consegue projetar no ouvinte, nos fazendo tomar de modo afetivo e cognitivo esse ponto de partida que lê o social de modo crítico até conseguirmos realmente agir com compaixão (compathos Com Pathos-Paixão).
É uma política possível e necessária hoje mais do que nunca, nosso tempo nos exige esse movimento da Empatia a Compaixão e o rap nacional underground tem feito esse apelo bonito, desde sempre, Pazsado chega atualizado ao presente, com um trabalho bonito, cortesia das batidas do DJ B8, da força das participações e de sua própria compaixão conosco!
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-Pazsado chega ao presente da nova Golden Era no rap nacional com o disco Empatia!
Por Danilo Cruz