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Oganpazan entrevista Astro Venga

Conversamos com o power trio Astro Venga sobre seu álbum Transeunte lançado em novembro de 2017.

A Astro Venga é uma banda do ar livre, apresenta-se  nas ruas, avenidas e orlas das cidades brasileiras. A Astrovenga é uma banda em movimento, daí o interesse em se fazer presentes em locais onde tudo está em movimento. O movimento é o motor das transformações, está é a tônica da sonoridade da banda sempre embalada pelo devir. Não à toa batizaram o primeiro álbum da banda de Transeunte. Este espectador em movimento, que encontra a banda onde não se espera que ela esteja presente. Ele para, assisti e segue seu caminho, levando consigo o sentimento de ter se deparado com uma experiencia que lhe retirou da repetição cotidiana e o colocou diante do espanto.

Energizado pelo fluxo de energia sempre em curso, gerado pelos transeuntes, o power trio carioca faz um rock agressivo, intenso e impactante, resultado da exploração das possibilidades sonoras de cada instrumento. Nessa conversa falamos sobre as influências da banda, das músicas, das particularidades do ao vivo e do estúdio, das aspirações da banda e os possíveis rumos que poderão tomar.

Foto de Anne Godoneo

Carlim (Oganpazan): A primeira coisa que me veio à cabeça quando dei o play no Transeunte foi: JIMI HENDRIX!! Então é impossível começar essa entrevista de outra forma que não seja atestar ou eliminar logo essa minha primeira impressão sobre o som de vocês. Pra mim fica evidente a influência do som do cara na música de vocês, mas até que ponto as técnicas e a linguagem musical do Hendrix serviram de matéria prima para o som de vocês? 

Chris (Astro Venga):Ah, que barato! Com certeza o Hendrix é uma grande influência pra mim como guitarrista e também para todos que passaram pela banda. Mas para além da guitarra, acho que alguns pontos muito importantes são a liberdade dele em relação à música, se permitindo passear por diversos estilos, e sua genialidade como compositor, que as vezes me parece não ser tão levada em conta. Em relação à sonoridade também, acho que principalmente pelo uso de pedais de fuzz e wah.

Carlim (Oganpazan): A Astro Venga é uma banda da rua, que gosta de manter contato com toda movimentação que rola pelas calçadas cidades afora. Quero provocar e dizer com isso que vocês são uma banda de registro ao vivo. Como vocês lidaram com a situação de ter que entrar num estúdio e lidar com uma dinâmica diferente daquela mais livre da performance ao vivo? 

Paoli (Astro Venga): Pra gente esse processo é algo natural, que sempre foi algo previsto e até mesmo almejado. Simplesmente porque, apesar da banda ter nascido para tocar na rua, somos todos músicos há muito tempo e a situação de estúdio não é uma novidade. O fato de estar na rua não nos difere em nada dos artistas que não estão. O “Transeunte”, especificamente, é resultado de um processo que a gente já buscava há um tempo, de fazer um disco totalmente diferente do material que já havíamos gravado. 

Foto de Anne Godoneo

Carlim (Oganpazan): Quero aproveitar o gancho da pergunta anterior e perguntar se vocês concordam com essa observação de que vocês realmente são uma banda que tem no ao vivo seu ambiente natural, onde a banda consegue realizar toda sua potencialidade?

Paoli (Astro Venga):: Acho que a gente pode exercer as potencialidades nos dois âmbitos. Fico feliz que a gente toque bem ao vivo e tenha em geral tenha um bom retorno, mas a gente adora entrar em estúdio pra poder elaborar o trabalho artisticamente. A gente realmente faz isso com prazer de se dedicar às filigranas. Enfim, acho que quando a situação é do ao vivo a gente se entrega à isso de corpo e alma, mas o processo de gravação e de fazer um disco não é diferente. No estúdio a gente pode elaborar vários elementos que são trocados por energia ao vivo.

Carlim (Oganpazan): Entendo, inclusive a pergunta foi no sentido de ressaltar, ao que me parece, uma das principais características da banda que é o fato de soar em estúdio da mesma forma que na rua, no ao vivo. Confesso ser decepcionante ouvir o álbum de uma banda e chegar no show e ficar com a dúvida se aquela é realmente a banda que gravou o álbum. Existe essa preocupação de vocês de manter uma conexão entre a sonoridade da banda em estúdio e ao vivo?

Chris (Astro Venga): Sempre tivemos a ideia de usar o estúdio como um laboratório de experimentos, timbres e efeitos. Até mesmo para caprichar em detalhes que ao vivo não recebem tanta atenção, somar instrumentos, gravar detalhes e ruídos que nós 3, ao vivo, não conseguimos executar. Mas em geral a identidade da banda é de uma guitarra, um baixo e uma bateria com um som grande, firme, amarrado e pulsante. Nesse sentido, acho que conseguimos entregar um bom resultado, tanto no disco quanto ao vivo. Os shows ainda tem um tempero a mais por conta do aspecto visual, da performance e da energia de estar cara a cara com as pessoas. Isso sim é um desafio na hora de gravar, mas como gravamos tocando juntos, ao mesmo tempo, acho que conseguimos transmitir uma energia bem intensa. Acredito que o disco tem que despertar o apetite do ouvinte para que ele queira presenciar ao vivo e, por sua vez, o show tem que ter novidades e ser uma experiência que surpreenda o espectador, mesmo que ele já conheça o repertório ou já tenha visto outros shows. Tendo isso em mente, sempre nos entregamos de corpo e alma em todas apresentações, seja num grande palco ou na rua, para uma multidão ou um grupo pequeno. 

Carlim (Oganpazan): Existe algum motivo especial pra não serem uma banda com vocal? 

Chris (Astro Venga): Sim! O fato da banda ter sido criada para tocar na rua! Esse objetivo fez com que o projeto precisasse ser compacto, móvel e que exigisse o mínimo de equipamento. Isso tudo sem perder em termos de qualidade de som e musicalidade. A solução, portanto, foi montar um power trio instrumental. Os artistas de rua geralmente usam equipamentos acústicos, como percussões ou sopro, e a decisão foi fazer algo elétrico. Por outro lado, o vocal (para ficar bom) necessita de mais equipamentos; microfone, PA, retorno, mesa de som, pode gerar microfonia, exige passagem de som, as letras precisam ser compreensíveis, etc. 
No nosso esquema é montar, plugar e tocar. Bem do it yourself e quase punk. Talvez o diferencial em relação a outras bandas instrumentais de rock tenha sido por conta de começarmos tocando versões de músicas que não são instrumentais. Os arranjos, portanto, geralmente têm a guitarra, ou até mesmo o baixo, executando as linhas que originalmente eram de voz. O repertório autoral acabou levando essa característica melódica, de ter temas bem cantados e até refrão, mesmo que em músicas instrumentais.

Foto de Rafael Cardoso

Carlim (Oganpazan): Nas músicas das bandas que seguem o formato convencional, que adota o vocal, o que leva à necessidade compor letras para as músicas, conseguimos entender a relação entre a letra e o título da música, o que facilita para o ouvinte ligar a parte instrumental com o conteúdo cantado. Existe essa preocupação de vocês quando compõem, ou seja, vocês compõem as músicas a fim de fazer com que o instrumental expresse aquela ideia contida no título da música? 

Chris (Astro Venga): Cada caso é um caso. Mas geralmente começamos com a parte musical e a partir a música pronta pensamos no que ela nos remete. Ouvimos, refletimos sobre sua estrutura e quais as sensações que ela passa, ou com o que ou quem se parece – e daí vem o título. 

Carlim (Oganpazan): De onde veio a ideia para o nome da banda: 

Chris (Astro Venga): O nome da banda veio de uma alteração da palavra estrovenga, que significa, entre outras coisas, um objeto de agricultura similar à uma foice, usado para cortar cana. Outro significado que dialoga muito com a realidade banda é o de objeto sem forma, algo no meio do caminho, algo inusitado e inesperado, bem parecido com a percepção dos transeuntes que dão de cara com a gente pelas ruas das cidades. 

Carlim (Oganpazan): Vocês acham que o significado do nome tem alguma relação com o som que vocês fazem? 

Chris (Astro Venga): Com certeza! O nome Astro Venga vem da palavra “estrovenga” que, entre diversos significados, quer dizer objeto inusitado, algo no meio do caminho, obstáculo. E esse sentido tem tudo a ver com as intervenções que fazemos na rua, as pessoas estão andando pela cidade e de repente pum! Astro Venga! 

Carlim (Oganpazan): Existe um conceito que norteou a composição das músicas do Transeunte ou foi uma reunião de composições que vinham sendo criadas desde a fundação da banda? 

Chris (Astro Venga): Um pouco de cada. Algumas músicas já existiam há alguns anos e essas músicas acabaram por apontar uma direção e um conceito que as composições mais recentes foram tomando. 

Foto de Rafael Cardoso

Carlim (Oganpazan): Quais as expectativas da banda a partir do lançamento do Transeunte? 

Chris (Astro Venga): Algumas coisas já foram realizadas, como ter um belo retorno por parte de público e a atenção de alguns veículos de midia. Além disso, fizemos um show de lançamento num palco emblemático, o do Imperator, pelo Rio Novo Rock. Agora o foco é viajar e levar o show para o maior número de cidades possível e começar a trabalhar em clipes e material audiovisual.  Finalmente, trabalhar e material novo que já estamos escrevendo! 

Carlim (Oganpazan): O que a banda em particular e a música em geral representa para vocês? 

Chris (Astro Venga): A banda representa, através da rua, uma opção de sustento diretamente através da música. Também representa uma instituição, algo que criamos que tem personalidade própria, algo assim. Conseguimos criar uma identidade, uma estética sonora que nos puxa pra cima como músicos. Representa também, por ser música instrumental, um grande veículo de comunicação com pessoas de todos os tipos, de diferentes lugares e classes sociais. A música é o que nos move e o foco da vida de cada um de nós. 

Carlim (Oganpazan): Vocês costumam fazer covers de músicas que não fazem parte do universo do rock. Vocês fazem versões de músicas de compositores como Lô Borges, Gilberto Gil, Roberto Carlos e Milton Nascimento. Porque esse interesse pela releitura desse tipo de música e existe o interesse de fazer um álbum de covers apresentando essas músicas a partir da sonoridade da Astro Venga? 

Chris (Astro Venga): Frank Zappa dizia que você pode pegar uma melodia qualquer, seja música clássica ou havaiana, e tocá-la na guitarra. Adicionando um acompanhamento de baixo e bateria, as pessoas vão chamar de rock n’roll. Nesse sentido, gostamos de mostrar que a fronteira entre os estilos é super turva, podemos pegar Luiz Gonzaga e transformar num rock pesadíssim, ou num funk bem groovado, sem alterar uma nota sequer, apenas mexendo com dinâmicas, suingue, texturas e timbres. Isso também mostra que a beleza está em todo tipo de música e que abrir a cabeça nos faz apreciar criações maravilhosas que estão espalhadas por aí. Pra gente não faz tanto sentido uma banda de rock fazer versões de rock para bandas que já fazem esse som. Sentimos que estamos renovando as canções do Clube da Esquina, Roberto e Gil. O fato de serem músicas conhecidas também cria um vínculo e uma empatia com o público, principalmente na rua, e é bem legal perceber a surpresa das pessoas com as mudanças nos arranjos. 

Foto de Rodrigo Matos

Carlim (Oganpazan): A presença de vocês no Rock In Rio juntamente com outras bandas desconhecidas do grande público é algo significativo e que torna o festival mais atraente para quem tem interesse em descobrir novas bandas e sonoridades. Quão importante foi para vocês tocarem neste festival em termos de satisfação pessoal e profissional, e claro, de divulgação do trabalho de vocês? 

Chris (Astro Venga): Já havíamos participado do Rock in Rio 2015, numa iniciativa de trazer bandas de rua para a programação. Mas tocávamos nas entradas do festival e não do lado de dentro. Agora em 2017, tocamos num dos palcos alternativos, com uma estrutura profissional e tudo mais. Portanto foi uma situação mais confortável. Foi muito bom tocar para um público tão grande, tanto para pessoas que não conheciam a banda e adoraram, como pelo orgulho estampado nas pessoas que já nos conheciam, que se mostraram muito felizes de nos ver lá. Bem gostoso esse reconhecimento. Mas queremos mais! Sunset, palco mundo, rs! 

Carlim (Oganpazan): Quais os planos de vocês para 2018? Uma turnê pelo Brasil é uma possibilidade? Cês vão passar por Salvador? rs 

Chris (Astro Venga):  Sem dúvida um dos planos é levar nossos shows e o disco novo para o maior número de lugares possível, dentro e fora do país. Agora em fevereiro já vamos dar uma passeada e anunciaremos novas datas em breve. Sem dúvida ir até Salvador está nos planos, assim como a região sul, mas é preciso uma grande organização em termos de logística para viajar por um país tão grande. Mas estamos trabalhando nisso e esperamos muitas novidades para esse ano!

*Foto de capa por Luiza Machado

A Astro Venga é:

Christian Dias: guitarra 

Antonio Paoli: baixo elétrico

Tutuka: bateria

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