Contenção 33 segue na Guerra cotidiana de ser hip hop na Bahia, um grupo de caminhada sólida que reflete e lhe mostra o rap em Salcity
Para muitos jovens em nossas quebradas a vida tem gosto de bala, algo que não faço ideia do que seja, mas que já ouvi dizer que é o gosto de pólvora do tiro tomado, gosto que vem na boca após ser alvejado. O Contenção 33 é grupo de larga e elegante caminhada no Rap Ba, mas que segue na força da resistência, sempre se reconstruindo e o mais importante, sempre nos transmitindo um rap que é “guerreação” contra o sistema genocida da juventude negra.
O grupo que começou em 2013 com um bonde grande que reuniu Dark Houdini, Febre, Torre e High. um Wu-Tang Clan nervoso, com a linguagem das ruas encarnada e só com linhas longas de ideias agravantes. Essa trajetória está registrada na mixtape Ruas Sujas (2017) com requintes de qualidade, com versos que transpareciam os resultados das políticas de genocídio do estado racista em que vivemos. Calcando seu trabalho numa sonoridade que caminha para o campo de um rap mais oldschool e palavras diretas, sem abrir mão de construções poéticas impactantes.
O Contenção 33 vinha naquela altura com hits estourados que até hoje estão na boca de várias quebradas, não é pouco comum passar pelas ruas e ouvir a rapaziada ouvindo músicas dos caras. Existe um problema na relação do hip-hop com a indústria cultural que muitas vezes não é percebida. Muitos sucessos nas favelas não alcançam os números que são expostos na internet, a ilusão dos números não mostra o respeito e a consideração que a arte muitas vezes conquista. E ao mesmo tempo, a proximidade e esse mesmo respeito, não vira idolatria, por que esse reconhecimento vem de um senso de que estamos diante de um igual, e por isso não podemos ou não devemos “pagar pau”.
Dentro desse registro, o Contenção 33 é muito próximo, é um de nós que vive a rua, que está nas favelas lutando todos os dias na guerra que o estado nos impõe. Os seus shows pela cidade são sempre espaços de união e o bate cabeça é daquele jeitão, sempre um momento que quem vive o rap baiano, soteropolitano, sabe como funciona. No ano passado, os grupo reformulado com DJ Belle, Joe, High e Torre, lançaram mais um trabalho memorável com o EP Vida do Avesso (2019).
O disquinho que já começa com a querida DJ Gug, riscando numa colagem com trechos do Racionais MC’s, Nois por Nois, Sabotage, falas da Marielle Franco e Martin Luther King, é composto por 8 fortes faixas. Discurso de resistência, de resgate, com flows e linhas pesadas, que também não deixaram de ser sucesso local. O EP que conta com participações de Áurea Semiséria, Dois As e Fashion Piva, é um registro que ainda trouxe junto uma concepção audiovisual muito bem trabalhada. Apesar das saídas do grupo, que poderia levar o público a pensar na queda de qualidade do trampo, pelo contrário, os manos vieram com um trabalho bastante coeso, com uma produção melhor esmerilhada, e persistindo na guerra!
Dentro do disco com produções muito bem pensadas e um roteiro audiovisual que contou com a colaboração de Henrique Oliveira, Tailane Muniz, Marcos Musse e Ícaro Luan. Essas colaborações junto ao talento nato dos caras fez com que eles conseguissem elevar o nível do discurso e das produções. Se em Ruas Sujas havia uma descrição poética muito bem executada sobre o cotidiano de quem tá nos corre louco e as laranjadas, em Vida do Avesso há o acréscimo de ideias de organização política. Menções ao movimento Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta. A faixa homônima (Conteção 33) presente no EP é uma outra pedrada que alcançou mais de 30 mil visualizações.
Recentemente, os caras soltaram mais dois audiovisuais que mostram o quanto eles prosseguem na luta, dois singles que os mostram seguirem na Guerra. O Contenção 33 é um fruto das trincheiras de Salcity e se você gosta de ideias agravantes é um dos grupos que você precisa conhecer. Primeiro saiu o single Judas, com a participação do mano Shook e que com esse título nos leva a pensar bastante. Quando falamos de quem lucra com a cena do rap e se arvora sem nenhuma raíz, fomos tachados de fodo amigo.
Mas como bem colocou no começo dessa faixa o mano Torre, os piratas da branquitude que entraram no barco para ficar com o espólio para si só, e repartir com os brancos tão mais do que manjados. É triste, mas é a regra, marionete de branco seguirá sendo o pária de um contexto que nunca foi o dele, e que também nunca foi de interesse para além do interesse de capitalizar em cima. Tá tudo dado… O CTC 33 tá esperto e segue firme com um trampo bonito e íntegro, gangsta pode pá! O audiovisual veio por uma produção da Uzicam e é um bagulho que desceu no melhor pico, real original!
Na última semana os caras soltaram mais uma pedrada com a música Guerra, mais um bom audiovisual que traça o contexto em que estamos mergulhados dentro de nossas favelas e que o CTC 33 consegue transformar em música e poesia. O sobrevoo que aparece nas filmagens com direção de Igor Cavalcante. é feito pelos caras com o rap, e a posição deles diante dessa corrida de ratos, é a de se colocar nas lajes e nos becos. Sem roer a corda, o grupo tá firme, resistente, no meio da guerra, são soldados nesta guerra sem deixar de levantar os problemas que o rap enfrenta em nossa sociedade.
-Contenção 33 segue na Guerra cotidiana de ser hip hop na Bahia!
Por Danilo Cruz
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