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27 nov 2024




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Salsalitre, um clipe que já nasce andando
Colunistas

Salsalitre, um clipe que já nasce andando 

Salsalitre, música do álbum Agogô da Ivan Motosserra levou três anos pra se transformar num clipe malicioso, cheio de swing e sensualidade.

Antes de mais nada precisamos lembrar que o clipe de Salsalitre começou sua fase de criação e produção antes do lançamento do álbum Agogô em 2018. São 3 anos desde o processo de concepção, gravação, edição, montagem, etc. De lá pra cá a banda passou por diferentes formações.

Contudo, sempre com os irmãos Gagliano, Rodrigo (bateria) e Rogério (guitarra), como a base fundamental da banda. No clipe, Gabriele Souza empunha o baixo. Aliás, a baixista é membro original da banda e participou de toda caminhada da banda desde sua origem até o lançamento de Agogô. 

Uma das principais características da concepção estética da banda é o referencial vintage. Nesse sentido, a Ivan Motosserra funde elementos dessa categoria com outros mais atuais. Vemos isso no clipe, que mostra a banda indo para uma apresentação. Para chegar ao local onde o som vai rolar, um fusquinha bege é usado como meio de transporte.

Os caras vão tirando os instrumentos do fusquinha e levando para o local que vão tocar: a beira da piscina de um hostel no território dos caras, Itapuã. Eis que a banda aparece tocando com a piscina ao fundo, os hospedes se deliciando no frescor de suas águas. A montagem feita por Rodrigo Gagliano intercala diferentes cenas até chegar ao clímax do clipe. Mostra situações distintas, a banda chegando pra se apresentar, dos caras tirando os instrumentos do carro, dos caras verificando o óleo do fusquinha, tudo isso girando em torno das cenas que amarram tudo mostrando a banda tocando.

Antes de falar do clímax do clipe vamos trocar aquela ideia sobre Salsalitre. Trata-se de uma música que nos leva por diversas ambientações. O faz através das mudanças rítmicas, das diferentes ornamentações usadas pelo conjunto instrumental, pelas inúmeras camadas sonoras presentes ao longo dos pouco mais de 4 minutos de sua duração. Todavia, essa diversidade de elementos poderia levar de fato a certa bagunça, porém a banda foi certeira na elaboração dos arranjos, na costura desses elementos e na dosagem de seu uso. 

Juntamente com isso, existe ainda outra característica fundamental para entender toda potência dessa música. Refiro-me ao cuidado dispensado à expressividade. O uso bem feito das dinâmicas de modo a criar efeitos sonoros em diferentes partes da música. A meu ver, contribui para que Salsalitre ganhe esse grau de excelência. 

Na introdução Rogério usa o que alguns guitarristas chamam de pica pau, que consiste no dedilhado pontual das cordas fazendo as notas soarem secas. Ouve-se apenas a guitarra, cujo dedilhado vai explorando diferentes alturas das notas gerando uma tensão no ouvinte. A partir de então, este passa a ter a sensação de que algo irá acontecer. Diga-se de passagem, essa sensação é fundamental par ao clímax do clipe. 

Sem frustrações, a sensação é confirmada, algo acontece, ouvimos o toque dos timbales feito por Rodrigo, despertando de imediato o swing da salsa. Logo depois é dissipado pela marcação forte do baixo e da batera que constroem a base de fundo para que a guitarra realize suas funções melódicas.

Destaque para a participação de Tadeu Mascararenhas que explora bem o timbre sombrio do órgão Palmer X22, construindo arpejos ao fundo, imprimindo diferentes intensidades a esta parte da música. O uso de um efeito, que me parece algo próximo ao chorus, enfatiza certas passagens, dando caráter dramático à música.

Do mesmo modo, temos que destacar a brilhante e inspirada de Adriano Vaz como organista canastrão. Atuação que não apenas reproduz os movimentos do organista sob as teclas de seu instrumento, passando em todas as suas cores, a sensação de se estar diante de um instrumentista legítimo. Mas também, uma atuação que transmite a canastrice do personagem muito bem alimentada pelo clima criado pela execução do órgão feita por Tadeu Mascarenhas. 

Voltemos a falar da música. A repetição dessa primeira parte da música, feita com mais ênfase, funciona como uma preparação que nos leva a uma ambientação mais leve.  Usando ritmo mais cadenciado e dedilhados explorando notas esparsas, resultando na leveza que precede o turbilhão prestes a estourar.

Baixo e bateria assumem o protagonismo e uma onda de graves toma conta da música, sendo entrecortada por arpejos rápidos da guitarra e os acordes longos do órgão. Após esse interlúdio, tocam uma vez mais a parte da marcação e aí chegamos à explosão orgástica dessa música.

De repente o som abre, a sensação que dá é de chegarmos em um lugar descampado, aberto, onde há liberdade para se movimentar. Exatamente isso o que ocorre, pois entra o solo do órgão que fica livre pra se locomover pelos espaços gerados pelo campo ritmo/ harmônico gerado pela guitarra, baixo e bateria.

Desta forma a banda vai aumentando a intensidade dessa sonoridade a cada segundo vencido. Ao fim do solo do órgão, a guitarra entra numa selvageria absurda, desembolando um solo cheio de bends licks bem acentuados, que se dissipa repentinamente e chegamos ao momento sublime.

Aos poucos a suavidade vai dando lugar ao swing e de repente estamos sob os movimentos sensuais de uma salsa quentíssima. Cujo balanço contagia nos fazendo um verdadeiro convite ao prazer. Precisamos ressaltar a importância do uso das congas e timbales nesse trecho. Suas acentuações rítmicas enfatizam a sonoridade caribenha, deixando marcante sua presença, fazendo o contraponto com a guitarra, órgão e baixo.

Chegamos às condições para que seja desembolado o clímax do clipe. A câmera foca a piscina, opta-se por uma tomada em câmera lenta. Imediatamente somos levados a esperar que uma bela e sensual modelo surja aos poucos. Expediente já batido em peças publicitárias, filmes, clipes, etc. que exploram e objetificam o corpo feminino. 

Entretanto, somos surpreendidos, pois aos poucos o que a cena vai revelando é algo mais parecido com o Monstro da Lagoa do que com a Isadora Ribeiro na icônica abertura dos anos oitenta do Fantástico. Ivan sai da piscina e assume a frente do palco iniciando sua dança sensual ao som da salsa envenenada da banda.

A partir daí o clipe passa a girar em torno da performance de Ivan. Até mesmo esquecemos que tem uma banda ali, atrás dele. O dançarino rouba a cena. Temos que fazer mais um destaque nesse clipe. O entrosamento ordinário entre Ivan e Adriano muito bem captado pela câmera quando Ivan passa dançando atrás do organista. A dupla consegue transmitir muito bem o clima faceiro da música através de seus movimentos sedutores.

Foi uma espera longa, mas vocês podem ver que valeu a pena. 

 

Ficha Técnica:

 

Direção de fotografia e imagens por Adriano Vaz
Edição por Rodrigo Gagliano
Música do disco “Agogô”, gravado, mixado e masterizado por Tadeu Mascarenhas, no estúdio Casa das Máquinas em 2017.
A banda nessa época era
Rogério Gagliano – Guitarra
Gabriele Souza – Baixo
Rodrigo Gagliano – Bateria
Ivan, o Motosserra – performances dançantes.
Participação de Tadeus Mascarenhas no orgão.
Dublador de organista: Adriano Vaz.
Filmado no terraço do Hostel Salvador (cenas com a banda) e na praia de Itapuã (cenas com o Fusca).

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