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27 nov 2024




Blog Post

O amálgama sonoro chamado Julia Sprecher
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O amálgama sonoro chamado Julia Sprecher 

Julia Sprecher estréia lançando um registro intenso e cheio de referências sonoras, revelando uma linguagem musical aberta às possibilidades. 

A massificação da internet consolidou virtualmente o conceito de aldeia global. Inexiste um lugar habitado por seres humanos no planeta que esteja fora das fronteiras da internet. Temos uma situação na qual é possível entrar em contato com quaisquer culturas, conhecendo-as minimamente. Não substitui a experiência de conviver entre as pessoas de uma determinada cultura, é verdade, esse meio ainda é o mais adequado pra adentrar com mais profundidade na cultura de um povo.

Entretanto, chegamos ao ponto de ser possível a um músico entrar em contato com o modo de fazer música de qualquer povo sem maiores dificuldades. Nada impede que um músico japonês incorpore elementos de bossa nova, baião ou congado à sua música sem ter que vir ao Brasil para isso. As novas gerações musicais, compositores e compositoras, interpretes, instrumentistas, cresceram tendo contato com praticamente todo o acervo sonoro produzido pela humanidade via internet.

Grande parte dos artistas contemporâneos opta, ou acaba sendo conduzido pelas referências musicais adquiridas ao longo do processo de formação de seu senso estético. Em outras palavras, a partir daquilo que constituiu sua experiência musical, tanto como ouvinte, quanto como compositor ou compositora.

Julia Sprecher faz parte dessa estirpe de compositorxs cuja sonoridade se constrói a partir da alquimia sonora perpetrada pelas mais diversas vertentes musicais. Isso se deve ao fato de ter uma abertura para a experimentação, bem como uma vivência cosmopolita. Embora seja paulistana, “(…) suas raízes musicais cultivadas desde cedo floresceram em Berlim, onde fez suas primeiras apresentações na galeria de arte PUDERAUM.” 

Embora o florescimento tenha ocorrido em terras estrangeiras, a semente fora plantada e germinada em terras brasileiras. Nesse período travou contato com o grunge e o indie, vertentes do rock que logo despertaram o interesse de Julia.  Munida de uma base musical enraizada na cultura brasileira, bem como da imersão no universo do rock, pôde expandir as fronteiras de sua sonoridade a partir das vivências na Europa, Canadá e Austrália, lugares onde estabeleceu parcerias musicais, além de ter feito apresentações.

A experiência como produtora audiovisual, bem como o envolvimento na promoção de processos de criação ligados à arte independente, contribuíram de forma decisiva para que Julia pudesse  ter uma concepção completa de todo processo que envolve a criação de um álbum. Todos esses elementos levaram Julia Sprecher a empreender a construção do seu primeiro projeto autoral, o EP Road Of Choice (2020).  

O tempo passado na estrada permitiu a Julia ter vivências que a colocaram diante de si mesma, levando a perceber mais claramente sua personalidade, seus anseios, dimensões desdobradas através da imersão num processo de autoconhecimento. Para se conhecer é preciso afastar de si, o que em certa medida significa sair da zona de conforto, do seu habitat, cortar radicalmente os vínculos com tudo que lhe é familiar e se abrir para as possibilidades oferecidas pelo ocaso que opera através do novo.

Road Of Choice  é o resultado desse percurso inicial através da estrada do autoconhecimento. A cantora e compositora nos fala sobre essa experiência:

“A partir de então vi que esse sonho poderia sair da ideia e tornar-se real. Foi então que decidi voltar e produzir meu primeiro EP ROAD OF CHOICE que fala justamente sobre a estrada de tornar-se quem você realmente quer ser, assumir a identidade e lidar com os desafios, delicias e consequências das decisões que tomamos em nossas vidas. Um mergulho em minhas dores, viagens e vivências para encontrar simplesmente o começo do longo processo de lapidação da minha própria individualidade. Tudo isso graças aos coletivos e a rede de apoio das pessoas que acreditam na arte independente.”   

Em certo sentido nossa personalidade é moldada, em alguma medida, pelas escolhas que fazemos. Dessa forma a escolha de uma estrada pavimentada por escolhas como imagem que traduz através de imagem o percurso feito por Julia Sprecher durante cada etapa do processo de construção do seu trabalho de estréia.

Chama atenção a solidez desse registro, cujos elementos constituintes são bem urdidos, evitando pontas soltas. Vê-se a construção de uma estrutura bem planejada, a aplicação de um método composicional seguro, pautado por escolhas estilísticas apoiadas em concepções estéticas bem definidas. Claro, toda essa elaboração seria artificial, corpo sem alma, caso não houvessem fortes emoções, a presença de forças instintivas em ação, bem como traços comprobatórios da presença de inspiração.

Ambos os fatores são perceptíveis ao começarmos ouvir Road Of Choice. Antes de falarmos das músicas vale dar um panorama da sonoridade deste álbum. Trata-se de um trabalho que agrega elementos de diversas vertentes musicais. Contudo a forma como Julia pensa a aplicação de seu método composicional, o que poderia ser apenas um amontoado de diferentes sonoridades, ganha forma a partir de escolhas minuciosas acerca de onde cada elemento será introduzido.

Há presença de vertentes distintas do rock, elementos de psicodelia, lofi, soul, reggae, jazz e trap. Ingredientes combinados a partir de intenções determinadas pelo resultado que a compositora espera alcançar. Nesse sentido, Road Of Choice é um caleidoscópio sonoro, marcado pela diversidade de sons e estilos. Precisamos destacar a potência vocal de Julia, além da sua versalidade enquanto cantora. Tais características permitem aplicar modos de cantar que sejam apropriados a cada um desses diferentes estilos. Ou seja, Julia não canta de forma homogênea, caso contrário haveria sentiríamos desconforto ao ouvi-la cantar um reggae a partir de um estilo vocal incompatível com esse gênero musical. 

Em Itś Ok, o dueto entre voz e baixo acústico desenha linhas melódicas bem urdidas cuja suavidade nos seduz, colocando-nos no clima pro que virá a seguir e se desenrolará até o final da audição. One Of A Kind é uma balada iniciada em clima suave, com arpejos no violão, que aos poucos vai ganhando intensidade até chegar em um ápice do clímax, o qual perde intensidade, conduzindo o clima novamente à suavidade. Uma vez que a letra trata do vai e vem de uma relação amorosa, somos levados a considerar que esse movimento na música que vai da suavidade à intensidade e novamente à suavidade, traduz as idas e vindas dessa relação, bem como pode representar esses dois amantes fazendo amor.  

Girl é um reggae suave com momentos de groove, encerrado com uma quebra rítmica, que tira o ouvinte do clima confortável da música, para deixá-lo desconcertado. A cadência do reggae acaba e os movimentos articulados já não são mais possíveis devido a quebra rítmica que coloca fim a essa cadência. Seguimos por IN My Adventures adentrando uma atmosfera mais agitada, uma levada  funkeada que nos leva a movimentar o corpo com swing. 

Road Of Choice é um western que desperta de imediato a sensação de estar guiando pela estrada rumo a um destino incerto. A letra aborda a experiência ligada à transformação e à descoberta. Na música, os elementos escolhidos geram a sonoridade perfeita para despertar as emoções e sensações ligadas a este momento de transição e a tomada de consciência sobre si mesmo. Moon Walk é uma balada intensa, carregada de efeitos dramáticos consegue afetar o ouvinte de modo contundente. Encerra o Ep a música Thoughts Unsaid The Forgotten, cuja pegada revela um balanço soul, que gera certo  swing, que em determinados pontos da faixa vem carregado por elementos mais pesados.

Desde já aguardamos por quais estradas as novas escolhas de Julia Sprecher a levarão. Ao que parece esta artista está em constante movimento, sempre em busca de novas paragens, sob a influência nômade da busca constante por se redescobrir. 

Ficha Técnica de Road Of Choice:

Julia Sprecher – Composições, Vocais, Guitarra Acústica / Elétrica 

Nikolas Chacon – Arranjos, teclados, flauta cherokee, guitarra acústica /elétrica

Bruno Bertassoli- Bateria

André Khaled – Baixo

Captação – Pangea Tunes (Mauro Rabello Filho)

Selo Fértil

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1 Comment

  1. ALlan fernando

    muito bom meu caro.

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