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Negra Jaque: Deus é uma negona que dança #marconaobasta

Negra Jaque: Deus é um negona que dança, um perfil e entrevista com a gaúcha sobre as lutas das mulheres por espaço na cena e na sociedade !!

Porto Alegre, a capital do Rio Grande do Sul, há muito tempo carrega em seu DNA o espírito de luta que o Hip Hop sempre trouxe consigo. Desde a década de 1980, a capital do estado mais ao sul do Brasil, traça uma história muito rica quando se fala em Hip Hop, mas se formos falar em Black Music e suas vertentes, essa história se obriga a recuar no mínimo uma década e chegar nos anos 70. 

Graças à persistência e insistência da juventude Porto-Alegrense, essa jornada não cansa de trazer à tona novos nomes, novos personagens e seguir seu papel de manter em atividade uma cultura capaz de se reinventar ao longo das décadas.

Zhammp, Lica Tito, Malu, são alguns dos nomes femininos que construíram páginas importantes da cena do Rap de Porto Alegre. Mulheres que enfrentaram diversos preconceitos e barreiras para escreverem seus nomes em um universo predominantemente dominado por homens. 

E essa busca por visibilidade e representatividade segue acirrada, às vezes desgastante, sofrida, mas que vem sendo executada por outra jovem da capital capaz de grafar seu nome no Hip Hop gaúcho.

Oriunda do grupo Pesadelo do Sistema, criado em 2007, Negra Jaque se caracteriza pelo forte posicionamento, tão necessário nos dias de hoje. Campeã da famosa Batalha do Mercado de Porto Alegre no ano de 2015, onde teve como premiação a gravação do seu primeiro disco solo Sou, Negra Jaque retrata suas vivências, como mulher negra, periférica, MC, compositora, produtora, pedagoga e inquieta, como se define na descrição de seu perfil no Instagram (@negrajaqueoficial).

Em 2018 veio o disco Deus que Dança, que lhe abriu portas na RBS TV, TV ULBRA, TV UFRGS, Rádio Gaúcha, jornal Zero Hora e duas indicações ao Prêmio Açorianos, como melhor intérprete e melhor compositora. 

O seu mais recente trabalho chama-se Diário de Obá, que já lhe permitiu turnês por Salvador, Brasília e Rio de Janeiro.

Nesse mês tão importante para registrar histórias de superação e auto-afirmação de mulheres guerreiras, o Oganpazan bateu um papo com a Negra Jaque, onde com muita clareza e lucidez ela nos permitiu conhecer um pouco dessa sua jornada em busca da inserção de mulheres negras em todos os espaços que possam e devam ser ocupados. 

Como tu vê a cena do Rap hoje em dia na questão da representatividade feminina? Está diferente de quando tu iniciou tua trajetória?

Negra Jaque – A cena do Rap na verdade assim como a sociedade em um contexto mundial, está passando por um processo de conscientização sobre o papel das mulheres. As mulheres estão mais empoderadas, ocuparam, conquistaram esse lugar de serem donas das suas próprias histórias.

Há 13 anos atrás quando eu comecei era um outro processo, eram poucas e nacionalmente a gente não tinha tanta visibilidade como agora. Tudo que a gente está colhendo hoje de avanço, que na verdade a gente precisa muito, é tudo plantio de muitas mulheres desde as indígenas ao sequestro de África para cá. As próprias mulheres não negras que se juntaram na luta mundialmente por um mundo melhor para todas as mulheres.

Sendo mulher e negra em um estado com uma colonização européia muito enraizada, como é ter essa voz ativa na luta contra o preconceito?

Negra Jaque – Ser essa pessoa me dá um lugar e uma missão. Uma missão onde a gente não tem alternativa de não escolher. Ou tu te isentas e tapa teus sentidos para o que acontece ao teu redor ou tu levanta a cabeça e enfrenta a luta. A gente não tem muita opção. Mesmo a que se isenta continua sofrendo as opressões. Eu escolhi sofrer as opressões mas revidar lutando. É um processo de deixar um legado que eu já construí até aqui, de consciência sobre o que é ser mulher, através da minha música, através da minha atuação como produtora cultural, como ativista. Eu escolhi enfrentar tudo isso e vamos ver o que dá.

O quê ainda falta para o Rap gaúcho ter mais visibilidade fora do RS?

Negra Jaque – Essa pergunta é nosso calcanhar de aquiles (risos). A gente precisa de investimento em produção e em mídia. Precisamos de produtores que se desamarrem do preconceito e enxerguem o Rap como uma forma de girar a economia. O Rap tem um grande potencial econômico, gira uma cadeia produtiva gigantesca que vai da roupa até o beat. Falta essa cadeia produtiva ser fortalecida, através do trabalho de mídia, dos trabalhos dos produtores, porque aqui temos muitos artistas bons e não temos produção que faça isso. Essa é a principal ferramenta para nos levar para fora do estado.

Analisando toda a trajetória de luta das mulheres até hoje, o quanto tu ainda acha que deve ser conquistado? Quais as demandas que ainda precisam evoluir na questão do feminismo?

Negra Jaque – A gente está em um processo que tem muita coisa para ser conquistada ainda. Estamos em um patamar de manter as mulheres vivas. E quando a gente fala de mulher preta, esse lugar é mais obscuro e violento. Então primeiro temos que trabalhar a curto prazo e punir mesmo quem faz essas barbaridades. Acho que a punição ela é imediata, a retaliação ela é imediata. A gente está vivendo um período de extermínio das mulheres. A longo prazo, investimento em educação e em políticas públicas efetivas, que realmente funcionem, de proteção e de elevação da autoestima, empoderamento, construção e desenvolvimento da identidade dessas mulheres que às vezes nem sabem quem elas são e o potencial que elas tem. Precisamos de proteção imediata e investimento a longo prazo na vida das mulheres. Equiparidade de oportunidades também. Acho que esses são alguns caminhos que vão ser eficazes. 

Tua formação é na área de educação. Com tantos retrocessos do atual governo nessa área, como tu lidas no dia a dia para ainda assim poder levar esperança aos que te cercam?

Negra Jaque – Não sei se foi retrocesso ou a gente está se dando por conta. Hoje temos os smartphones para registrar esses processos de extermínio da educação. Existe um plano de manter a grande população sendo escravizada, esse é o plano da educação, a educação tem um plano sim, e ele é de manter as pessoas ignorantes. A escola tem servido de ferramenta de opressão, de apatia, de invisibilizar a realidade do nosso país, de condicionar pessoas. Ela é uma fábrica do não pensamento e eu acho que estamos passando por esse processo que estamos nos dando conta que essas mazelas estão aí e a gente estava com os olhos tapados para tudo isso. Tivemos evolução sim, não estou negando nenhum tipo de evolução, mas a grande população continua à mercê do analfabetismo funcional que serve para nós consumirmos mais e ter acesso a uma distração. Então acho que estamos passando por um processo de ciência do nosso lugar e do lugar do governo e isso sim acho que é ciência da luta de muito movimento social. Então passamos por um processo de conscientização, onde a gente diz: -Cara, a gente veio até aqui, a partir daqui estamos como? E avaliar o como estamos é que está nos dando uma sensação de retrocesso, mas se a gente for olhar, os mesmos caras estão lá governando há mais de 20 anos, começando pela nossa gestão nacional. Então não estamos falando que não teve retrocesso agora, eles sempre estiveram ali e por algum momento eles tiveram um rompimento de algum acordo provavelmente econômico entre eles e agora começaram a brigar e a gente está assistindo o circo. Enfim, acho que isso sempre existiu e hoje a grande população está tendo o acesso a tudo isso.

 

-Negra Jaque: Deus é um negona que dança #marconaobasta

Por Thiago Moura (Gagui IDV) 

 

 

 

 

 

 

 

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