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27 nov 2024




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Leo Franciozi & D4CRVZ um Elo (2020) fluindo no tempo!
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Leo Franciozi & D4CRVZ um Elo (2020) fluindo no tempo! 

Leo Franciozi & D4CRVZ um Elo (2020) fluindo no tempo em ritmo de rapjazz, a dupla soltou um grande trabalho condensado em meras três faixas

 

Na última semana o rapper da Baixada Fluminense, D4crvz, e o beatmaker e produtor paulista, Leo Franciozi, lançaram em parceria o EP Elo. O trabalho, que conta com três faixas com beats de rapjazz de primeira qualidade, traz o tempo sob diferentes prismas como motivação para reflexão sobre si e sobre a arte. A escolha da sonoridade por si só já é um fato bastante inusitado e ao mesmo tempo corajoso por parte do Leo, já que o cenário atual do rap tem se afastado cada vez mais do rapjazz. Mas ouvindo outros trampos do Franciozi percebe-se que ele é um desses guerreiros do underground, que permanecem não se apegando aos modismos para continuar desenvolvendo um trabalho original e com identidade própria como produtor. Algo que me agrada muito já que eu me amarro em rapjazz e comecei a ouvir jazz por causa do RAP. 

Há alguns meses atrás eu escrevi uma resenha sobre a mixtape do  D4crvz, O Menino Gabriel, e a escrita dele me atraiu bastante. Me chamou a atenção a ponto de eu escrever a resenha de bate e pronto, algo que geralmente não acontece, depois de ouvir a mixtape algumas vezes. Era um trampo bastante pessoal e introspectivo, que falava muito sobre ele. Composições nesse estilo tem o seu valor por criarem um tipo de identificação muito particular, com elementos que não são exatamente objetos da coletividade, mas que tocam fundo a individualidade de muitos. E dessa vez não foi diferente. Eu disse para o Danilo, que me mandou o EP pra ver se eu gostaria de resenhar, que esse trabalho conversou profundamente com o momento atual da minha vida, em que o tempo vai ter um papel fundamental. E foi isso que eu achei louco no EP e que me fez querer escrever sobre ele. Mesmo não tendo uma vivência de artista eu me identifiquei com todas as faixas. 

A primeira música do disco de nome Balu, em referência ao personagem de Mogli, traz uma perspectiva interessante de se manter são e centrado frente a um mundo cada vez mais dinâmico. D4crvz exemplifica essa resistência, entre outras coisas, através da vivência e da carreira no RAP, ao destacar o quanto parte da cena de RAP se modificou, movida por tretas, polêmicas e a vontade de ser mais que os outros, e o quanto é preciso se focar em princípios que não façam parte do espírito dessa época e sim de valores mais fundamentais, exemplificados através da máxima dita por Balu na trilha sonora de Mogli “Somente o necessário”. Os versos que destacam bem essa intenção na música são

“Ouvi alguém batendo na porta, eu tô deitado, preguiça. Chamou meu nome, fui ver quem é, nada importante. Triste notícia que ninguém vive de rap, vive de tretinha. Fechei a porta fodeu, vou morrer de fome. Essa tá mastigável. Acho que tá claro…” 

que mostram o quanto a produção artística do Léo e do D4crvz, e do underground de maneira geral, não leva em conta as bobagens que parte do mainstream força na cena de RAP, que gera hype para os envolvidos e para a parcela da mídia que fomenta isso, mas focam na produção artística como forma de se alimentar, de um ponto de vista subjetivo, com a satisfação do fazer artístico, mas também de um ponto de vista objetivo de se sustentar com a própria arte, sem a necessidade de reafirmar valores com os quais eles não concordam. Esse é um tema bastante relevante e que precisa ser mais discutido, o quanto artistas underground, em um cenário em que parte do RAP flerta com a indústria cultural de massa, têm a possibilidade real de viver de RAP de forma estruturada, e não como exceções à regra. 

A segunda faixa do disco ao meu ver foca bastante na questão da criação artística. Mais uma vez a questão do tempo surge, no sentido de que os objetos de reflexão sobre os quais nós escrevemos estão em constante mutação, e nós nos modificando com eles e de alguma forma também por influência deles, para nos adaptarmos a novas realidades. Por esse prisma, produzir algo passa por absorver o novo que surge com o tempo e modificar nossas visões sobre aquilo que é velho pra nós, em termos de conhecimento e vivência, mas que também se modifica e precisa ser reciclado, como diz o rapper.

Embora eu também tenha me identificado com essa noção de desenvolvimento da escrita, imagino que compor uma música tenha muito mais dificuldades envolvidas do que escrever uma resenha como essa, já que a temática é mais aberta e as combinações de ideias possíveis são muito grandes, além de toda a questão musical e estética presente na composição. D4crvz usa a imagem de um quebra-cabeça para ilustrar essa dificuldade de pegar temas, ideias e terminar com algo conciso e com uma unidade que faça sentido. Um labor que segundo ele exige muita observação, paciência e café. 

A terceira e última faixa traz um love song sobre relacionamento e términos. Situação em que os pedidos de perdão surgem a cada segundo e mesmo a música é um motivo para pedir perdão novamente. O beatmaker utiliza um sample de Travelin’ Light, canção interpretada por grandes cantoras de jazz como Billie Holiday e Ella Fitzgerald. Na canção original a intérprete diz que está leve como a brisa porque seu amor foi embora e levou seu coração. É interessante como Léo compõe o beat com um sample que casa bem com a temática da letra. Aqui o tempo surge como uma forma de curar o sofrimento causado pela separação e pela distância ou, como diz o D4crvz, “Me priorizo só pra ver se eu esqueço. Semanas passam rápido, as horas lento. Eu tô ficando suave, é só questão de tempo”. 

D4crvz e Léo Franciozi são dois manos que quem curte o underground precisa conhecer e dissecar as discografias. Dois artistas com muito talento, com trabalhos bastante originais e com uma visão muito particular sobre arte. Uma visão que talvez esteja perdendo espaço nos dias atuais, mas que tem uma importância central no underground.

Arte da capa do EP por Joaquim Macruz

-Leo Franciozi & D4CRVZ um Elo (2020) fluindo no tempo!

Por André Clemente de Farias

 

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