Na trilha para o lançamento de seu disco solo ICYERENKEZO com produção do mestre Pupillo, Nego Freeza lança o single A Gente Pulsa!
Nego Freeza está nos momentos finais do cozimento de seu disco de estreia junto ao produtor pernambucano Pupillo. O disco, que tem previsão de lançamento para o final de Setembro, apresentará ao público um trabalho singular de um artista que possui uma história fundamental para se compreender o tanto de qualidade que o rap baiano e nacional guarda, abaixo da superfície.
Em mais de 25 anos de carreira ininterrupta com a banda OQuadro, um dos maiores monumentos do rap nacional, ao longo de 1 demotape, 3 discos, uma mixtape e uma série de audiovisuais, o que Nego Freeza desenvolveu é grandioso. A grafia da vida que esse homem escreveu desde os tempos na sua pequena Ipiaú, Ilhéus com seus parceiros de banda e atualmente radicado no Recife, condensou o que se verá em ICYERENKEZO.
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Com o single “A Gente Pulsa”, o público mais atento já pode perceber que as mais de duas décadas dedicadas à arte, estão condensadas em lírica, flow e sobretudo em uma cosmovisão invulgar. Nunca é só música, não é? O poeta guarda e expressa uma vivência – no sentido forte do termo – que dá conta de sua relação com o mundo, o sentido que ele atribui ao caráter global de sua existência e a forma de tradução incomensurável de tudo isto, em forma de arte.
Nego Freeza consegue com o single condensar não apenas a densidade do disco que está sendo produzido, como toda a sua caminhada e aquisições até aqui. Liquefazendo um bloco de experiências, encontros, ideias e pesquisas incessantes em forma de música rap. Reverenciando no profano e pensando a partir de África a experiência que também é de nós todos.
Do alto da experiência que apenas grandes mestres da cultura conseguem alcançar, Nego Freeza não sucumbe a termos fáceis, clichês de marketeiros, que transformam a negritude – na corrida de ratos da indústria musical – em meras palavras de ordem. Colocando a música no centro de um movimento de nascimento da própria humanidade em África, historicizando nossas experiências cotidianas e do sagrado, Nego Freeza substancializa e torna leve essa torrente e todos os seus obstáculos.
Depurar a força da música para além de formas estandardizadas hoje em dia onde qualquer manifestação do novo é rapidamente cooptada, não é tarefa fácil. “A Gente Pulsa” é único neste sentido, ao nos trazer uma amostra à altura do que o disco ICYERENKEZO em breve apresentará em modo full. Para, os mais atentos, a geografia traçada sob a diáspora pelo MC é outro ponto essencial, na Senzala do Barro Preto, em Kalakuta ou em Trenchtown, A Gente Pulsa, mesmo em cativeiro, mesmo no buzão lotado, sofrendo ou amando, sendo expropriado ou tornando-se milionário, a gente pulsa.
A produção musical de Pupillo, hoje um dos mais destacados produtores musicais do país, é a metade desse movimento ao trazer elementos diversos na construção do beat. Ao selecionar uma tonalidade rítmica e suas quebras, a textura, linhas de baixo, claps e bumbos, o produtor criou um híbrido próprio com a complexidade simples que a música transmite. A faixa conta também com o Carlos Trilha tocando um synth que nos remete às referências de base da construção musical da cultura Hip-Hop.
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Lançado pela gravadora Cachoeira Music, o single A Gente Pulsa recebeu um audiovisual que representa muito bem a proposta do som. Contando com a participação do mestre Samuel Negão (Faces do Subúrbio) e da dançarina Gabi Carvalho, entre a cadência das congas de Samuel e o bailado de Gabi, temos o Nego Freeza capturado em pleno exercício de emissão musical e poética, com a direção da braba Luiza Accetti.
Nada é por acaso, e nos parece que a diretora Luiza escolheu um ambiente controlado para as performances, preferindo planos onde os artistas fossem focalizados sem muito glamour e ou encenações. O resultado é um registro audiovisual performático de uma canção que em sua essência reclama simplicidade, convidando o ouvinte a automaticamente ouvir e pensar, se divertir e educar-se, sem os penduricalhos do star system. Afinal, é fácil perceber quando um corpo de baile é mera distração e quando um corpo dançando encarna a proposta estética expandindo-lhe.
Quando tratamos de música hoje é preciso desacelerar e sobretudo como sempre buscar pensar o que faz algo ser aquilo que é. O lançamento da primeira faixa do disco ICYERENKEZO nos convida a refletir sobre o estatuto da música preta atualmente, isso é um fato presente na lírica e na sonoridade apresentada em “A Gente Pulsa”. Mas também, nos remete aos seus criadores, seja ao Pupillo e seu trabalho pouco comentado no rap nacional – Edgar, Criolo – seja com Nego Freeza e seus mais de 25 anos de carreira.
É fato, que fazer esse exercício hoje não é simples, dada a inalcançável quantidade de produções, e diga-se de passagem, excelentes produções que são lançadas todos os dias. O problema certamente não é a qualidade, mas sim o volume de dados, a se analisar. E em termos de arte, o tempo e a atenção necessários para maturar em si mesmo o que é proposto. Neste sentido, Nego Freeza facilitou-nos o trabalho ao lançar o single “A Gente Pulsa”.
Não por simplificar mediocrizando, mas por apresentar o mais rico possível de modo simples, pela capacidade de tradução e de apresentação de temas amplos e complexos de modo facilmente compreensível. A história negra, a força de sua música em África e na diáspora, mas sobretudo a sua singularidade – uma das possíveis traduções para a palavra inglesa single – a sua individualidade automaticamente coletiva, algo realmente único hoje em dia.
-Nego Freeza lança “A Gente Pulsa” ou porque um single não é apenas um single!
Por Danilo Cruz
