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Minas na cena: bate-papo com Priscila Oliveira

Priscila Oliveira conversou com Bárbara Ornellas (Minas Que Fortalecem) e falou sobre sua atuação no underground em cima do palco e fora dele, bem como o papel da mulher numa cena ainda sob forte influência do machismo. 

Na luta dentro do cenário underground desde muito jovem, Priscila Oliveira, vocalista da banda Caloi 10, bate um papo sobre a atuação feminina na cena do rock baiano. Nesta entrevista, trazemos a intenção de pensar sobre o papel da mulher dentro da construção histórica e da atuação contemporânea desse gênero musical e na cena do Underground.

Bárbara Ornellas (MQF): Como você entrou para a Cena Musical?

Priscila Oliveira:  Eu entrei para cena musical muito nova entre meus 11 e 12 anos acompanhando os ensaios das bandas locais da cidade onde me criei, em Dias d’Ávila, região metropolitana de Salvador. No curto período como espectadora montei minha primeira banda de punk rock chamada “Streptomicidio” porém a mesma não durou muito, então logo em seguida eu formei a banda a “Opiun” onde se manteve formada por 5 anos. Tocamos em alguns lugares do interior da Bahia, festivais como “Rock das Aranhas” em Camaçari organizado por Roque Torres, “Campeonato de Surf” em Subauma organizado por Marcos Vidigal, “Festival de música” em São Sebastião do Passé organizado pela prefeitura local, tocamos em Serrinha, Alagoinhas e na cidade Dias d’Ávila por diversas vezes. Nomes como André Luiz e Zé Raimundo, que mantém a cena do rock underground até hoje, me abriram portas no início de tudo, compondo essa equipe nos dias atuais. Assim, trabalhamos com muito amor, tesão, esforços para manter a cena em atividade. Hoje com 31 anos voltando à ativa no formato banda, projeto Caloi 10 onde eu toco violão, guitarra, canto e componho as músicas. Com dois singles de peso nas principais plataformas de streaming “Quimeras e “Cai o Rei” lançada pela “Trinca de Selos” e no gatilho o EP com 6 músicas para ser lançado no final de julho me mantendo em movimento no universo da arte.

Bárbara Ornellas (MQF): Suas bandas não são formadas essencialmente por mulheres, como você se sente sendo mulher rodeada de homens na cena do rock? Conte um pouco a história da formação das bandas da qual você faz parte.

Priscila Oliveira em ação.

Priscila Oliveira: Bom como vocês puderam perceber na resposta anterior não era só uma questão de músicos (quem toca o instrumento) mas de toda uma estrutura movida por homens. Na época que comecei a tocar tinham poucas meninas tocando ou produzindo no rock in roll, elas estavam lá sendo mais de 90% como público. Quando somos jovem não sentimos muito o peso do patriarcado, é tudo muita diversão, então tocar com os meus amigos era fantástico e acredito que eles aprenderão muito mais comigo como integrante de banda, a troca é mútua, mas quando se tem uma Front mulher em uma banda só de meninos, eles sentem um pouco na pele o que nós mulheres passamos de alguma forma. Rola uma evolução ” o que eu não quero ser”, falo com propriedade para com os meus, as bandas pela qual passei tive a sorte de tocar praticamente com as mesmas pessoas. Ronaldo Bogos, grande baterista de Camaçari, Hélio Scheffer que me acompanhou desde os primeiros projetos, meu amigo de infância, Frank Abimael, Wallace Tosta, Zé Raimundo, André Luiz já veio tocar comigo na Caloi 10 e já me colocou em muitos eventos para tocar. Bom, depois de passar pela “Streptomicidio” e a “Opiun” eu me retirei da cena por quase 10 anos por questões pessoais, a maternidade bateu na porta e com ela novas responsabilidades, voltei a ser espectadora mas sem abandonar a cena totalmente. Em um evento que Zé Raimundo fez na Casa da Vovó em que a “Jato invisível” até tocou nesse dia, a galera se reuniu e levantaram a bandeira para que eu voltasse aos palcos e foi o que eu fiz com ajuda de Zé, André e Hélio Montamos a Caloi10. Hoje com nova formação somos: Franco Leão (guitarra), André Luiz (contra baixo), Gilvan(bateria) e eu, Priscila Oliveira ( violão e voz).

Bárbara Ornellas (MQF): Qual a sua visão sobre as mulheres, dentro do meio musical ou não, viverem numa condição social menos reconhecida profissionalmente que os homens?

Priscila Oliveira: Começar ressaltando que a paridade de gênero só será realidade concreta daqui a 100 anos ou mais. Segundo os dados do Fórum Econômico Mundial, é estarrecedor essa realidade. O porquê da importância dos coletivos femininos? A articulação desses coletivos trazem sonoridade e o conforto de não estar sozinha, a importância de perpassar discussões de questões estruturais, racismo, machismo, sexismo e facilitar o acesso a essas informações para que as mulheres tomem seus lugares de direito é de extrema necessidade, a gente só começa a sentir o peso do patriarcado quando começamos a incomodar, uma mulher que não se posiciona é silenciada.

Bárbara Ornellas (MQF): Alguma vez você já teve o trabalho musical desacreditado simplesmente por ser mulher? O que te fez perceber isso?

Priscila Oliveira.

Priscila Oliveira: Sim já tive meu trabalho desqualificado por diversas vezes. Certa vez em um festival eu fui convencida a não tocar e fui comparada de forma pejorativa a Yoko Ono, eu não entendi na hora o que tinha acontecido comigo. Dias depois eu tive um choque de realidade, foi quando passei a me inteirar nessas questões de gênero. Já ouvi que “não cantava bem”, já ouvi que “mulher gorda não toca guitarra”, já ouvi que “não teria capacidade de lançar um EP”, já ouvi que “mãe não faz rock”, já ouvi que “a minha idade não estava apropriada para eu voltar a ter banda”, já ouvi de tudo um pouco! Quando passamos a entender a engrenagem poderosa que é a força da mulher, esses tipos de comentário machista fica menor que um microrganismo desconhecido.

Bárbara Ornellas (MQF): O domínio masculino é evidente na sociedade, e isso não é diferente no meio musical, como você vê a atuação feminina no rock baiano?

Priscila Oliveira: Eu vejo a atuação feminina dentro do rock baiano muito forte porém pouco divulgada, a gente precisa de mais, temos grandes nomes dentro do cenário histórico underground, Sandra de Cássia a quem tenho o máximo respeito e admiração é um nome a ser lembrado sempre, o vocal de grande personalidade na “Ulo Selvagem” uma banda de 1987, fundadora do palco do Rock ! Olhe o peso, força e resiliência que essa mulher traz! Tenho certeza de que não foi fácil. De uns tempos para cá passamos a ver mais mulheres atuando indiretamente no cenário, elas estão nas mesas de som, fotografando as bandas, escrevendo fanzines, como a queridíssima Adriana Dibby, uma das primeiras mulheres a escrever fanzine de banda de metal no cenário do Rock na Bahia. A grande Pitty é um exemplo a ser lembrado também. somos capazes, grandes e poderosas.

Bárbara Ornellas (MQF): De repente para muitos, algumas garotas começam a se aventurar com uma guitarra, um baixo nas mãos ou o microfone nas mãos, o que isso provoca realmente no mundo do rock baiano e no rock nacional?

Priscila Oliveira: No meu ponto de vista isso não foi de repente, estamos aí com a guitarra na mão ou contra baixo, ou microfone, ou com muitas ideias na cabeça nos movimentando faz tempo. Tanto no rock baiano, nacional ou mundial e em diversas outras áreas. A maior batalha acredito que seja o reconhecimento, eu não sei o que provoca, mas espero que provoquem mais acolhimento oportunidade e reconhecimento para que se fortaleça a visibilidade.

Bárbara Ornellas (MQF): Existe sexismo na cena do rock baiano? Se sim, o sexismo na cena musical, no que diz respeito ao estado da Bahia, se torna mais evidente através de que práticas?

Priscila Oliveira: A hipersexualização feminina infelizmente ainda nos ronda no rock ou em qualquer outro cenário musical, se tratando de Bahia então… infelizmente! Ela está aí! Ela existe e é estrutural. A redução da mulher a fetiche masculino é bizarro em qualquer gênero. Atrapalha na visibilidade para reconhecimento de excelência em seus trabalhos em geral. Sendo limitadas a groupies ou a sex symbols muita das vezes.

Bárbara Ornellas (MQF): As mulheres que sempre estão separadas das suas iguais por diferenças econômicas, sociais e culturais que afetam, entre outras coisas, sua maneira objetiva e subjetiva de sentir e vivenciar a dominação masculina, como isso acontece no meio do rock baiano? Como você percebe que as mulheres tratam outras mulheres que atuam na mesma cena?

Priscila Oliveira: Essa dominação masculina ela passa por diversas vezes de uma forma imperceptível até porque a alusão criada de que tudo é natural e normal no universo masculino é constante. Antigamente existia mais essa rivalidade entre as mulheres mesmo que velada né! O patriarcado precisa dessa rivalidade e confusão. A mulher ser vista como instável, parcial e louca é de importância para que a dominância masculina persista.

Bárbara Ornellas (MQF): Quando pensamos em compositoras do rock baiano, algum nome te vem a cabeça? Essas mulheres são reconhecidas como compositora? Elas também são intérpretes? Há diferença do reconhecimento da intérprete para a compositora na cena do rock baiano?

 Priscila Oliveira: Gal Costa, Pitty, Xênia França nomes que me vem a mente de primeira. Muitas dessas que citei não são reconhecidas como compositoras, não é o ponto forte de visibilidade, e todas são intérpretes também. Quando chega em ascensão você não é tão prejulgada quando canta músicas de outras pessoas. No circuito underground do rock baiano a credibilidade para quem faz rock autoral é maior é mais forte, rola uma aceitação melhor e existe um preconceito com as bandas cover sim mas isso é outro “stories”.

Bárbara Ornellas (MQF): Com ações mais diretas, como as mulheres que participam como atrizes da cena musical podem melhorar sua atuação e diminuir qualquer forma de discriminação que possa existir?

Priscila Oliveira: Acredito que a união entre as mulheres é algo forte que precisa continuar sendo consolidado. A informação de fácil acesso também é uma chave de grande importância para que os coletivos cheguem a essas mulheres, para que nos empoderem dando poder as nossas falas, dando força a nossa existência, dando visibilidade a nossas forças, luta e Arte.

Torna-se nítido através da fala de Priscila Oliveira que o Rock Baiano tem representantes que estão atentas as configurações sociais que têm o intuito colocar a mulher cada vez mais em evidencia na Cena Underground, mostrando quanto a força feminina faz parte desse mundo.

Para conhecer a sonoridade da Caloi 10, vale conferir o vídeo abaixo ou procurar pela banda nas principais plataformas digitais.

 

Ouça abaixo o último single da Caloi 10.

Mais sobre das Minas Que Fortalecem no Oganpazan. 

MINAS QUE FORTALECEM.

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