Mansur Brown é um dos grandes nomes da guitarra jazzística. O britânico passeia com elegância e virtuosismo por diferentes estilos.
Sempre fui totalmente avesso a forma como a música é rotulada hoje em dia. Cada hora surge um novo gênero e cerca de 3 meses depois, ele já conta com outros 3 pares como subgêneros… Fica difícil até para o músico, diz aí, Mansur Brown?
O crítico musical talvez tenha uma maior necessidade de classificar os discos, mas ainda assim, no meio de tantas referências, parece ser até mais difícil definir linhas estéticas do que de fato ressaltar as qualidade de um bom trabalho, sem precisa de fato entrar em tanto detalhe.
Eu acho que esse fenômeno de “hiperclassíficação” (olha eu aqui inventando também) é algo que tem uma grande relação com o momento da música e a abordagem dos artistas de maneira geral. Hoje é mais difícil você achar sons diferentes, de fato originais e que você tenha aquele “click”, sabe? De ouvir e falar: o que é isso?
Não que esses discos ou músicos não existam, MUITO pelo contrário, a questão é que hoje, mais do que nunca, é necessário procurar e filtrar a informação, mas a tecnologia apesar de ser um grande aliado, também pode acabar atrapalhando.
Se você toca guitarra por exemplo, basta ter uma placa legal no PC, contar com uma interface bacana e sair produzindo no Pro Tools. Com apenas alguns clicks é possível soar como o Eddie Van Halen e aí toda a necessidade de passar perrengue, testando e procurando por um som, acaba em 5 minutos.
Todos os perrengues que o próprio Eddie Van Halen passou para tentar criar algo novo, inovador. É por isso que os rótulos são desnecessários, pois ao criar novas nomenclaturas para classificar algo que não é novo de fato, você só gasta termos em latim e segue ouvindo a mesma coisa, só que com outro nome dessa vez.
Na era da desinformação, o primeiro disco do prodígio Mansur Brown poderia e muito ter passado batido, pois o reboliço quanto a qualidade instrumental do surpreendente “Shiroi”, lançado no dia 28 de setembro de 2018, via Black Focus Records, ainda está restrito à europa… E olha que o cara veio tocar no Brasil esse ano já hein.
Conheci o som do Mansur Brown em 2016 quando escutei o “Strings Of Light” do Yussef Dayes e do Henry Wu, na época do duo Kamaal Williams. Um dos temas presentes no disco inclusive é de autoria do guitarrista e me lembro que o timbre de sua guitarra (na faixa “Mansur’s Message” não saiu dos meus fones tão cedo.
Line Up:
Mansur Brown (guitarra)
Dominic Canning (teclados)
Ricco Komolafe (baixo)
Kaidi Akinnibi (saxofone)
O TriForce é mais uma banda do selo Jazz re:freshed, um dos principais labels da cena de UK ao lado do 22a e também da Brownswood Recordings. O TriForce, na falta de apenas um prodígio, conta com 4 deles.
Todos do sul de Londres, mais especificamente de Brixton, o quarteto emula um Jazz Fusion muito trabalhado, além de contar com músicos que apesar de muito jovens, demonstram um domínio técnico assustador e entregaram um belo EP, ainda que a banda tivesse uma média de idade de 19 anos à época do lançamento.
Depois de ouvir muito TriForce, achei que já conhecia a abordagem de Mansur. Vale lembrar que o músico toca com o Kamaal Williams e o Yussef Dayes, isso sem dizer os rolês com o Alf Mist, mas a cada novo projeto que achava no Youtube, escutava um novo Mansur, e é exatamente aí que está o negócio. É exatamente por isso que esse trabalho não só é um dos melhores do ano, como também trata-se de uma aula para os guitarristas que ainda não atualizaram o software e continuam vendo o Malmsteen no G3.
Escutar um disco e ficar em dúvida sobre o que está acontecendo. Essa é uma das melhores sensações que podemos sentir ouvindo um novo play e essa é a energia que perdura enquanto “Shiroi” rodopia em seu próprio eixo.
Com o conhecimento de causa de quem já viu o negrão tocando ao vivo durante o festival da Jazz re:freshed que aconteceu em dezembro de 2017, na Associação Cultural Cecília em São Paulo, posso afirmar que esse cara é de fato diferente.
Suas composições são muito lapidadas nos campos harmônicos. Ele toca com uma semi acústica, mas tira timbres muito incomuns dela, alcançando toda e qualquer nota graças ao seu grande arsenal de dedos.
Mansur é cirúrgico, em dado momento mais comedido, fala pouco, escolhe uma abordagem de poucas notas. Com uma visão holística frente ao som, acredito que sua melhor qualidade seja esse equilíbrio. Ele sabe quando precisa entrar solando com mais fervor, mas também possui grande leitura pra saber a hora do “menos é mais”.
Em uma palavra, defino “Shiroi” como um disco oportuno. Deveras. Ainda que sem informações quanto a banda que tocou no disco, vale ressaltar que o Mansur também toca baixo. Acredito que ele fez todas as guitarras, os baixos e as bases. Se teve outro músico foi na bateria, mas acho que a falta de créditos sugere que foi de fato o trabalho de um homem só.
E por mais que a guitarra seja o prato principal, o que chama atenção é a forte presença do trap nas bases. Essa ramificação das raízes do Hip-Hop embarcaram na lírica de Mansur e se transforma num bola indivisível de Funk, Blues, Jazz e Soul por 11 músicas e quase 45 minutos de um sinuoso groove.
Seja preenchendo um beat na abertura do disco ou valorizando os ecos e a linha de baixo na faixa título, Mansur faz o ouvinte prestar atenção. Com andamentos muito criativos e com grande leveza, o guitarrista parece flutuar frente as sólidas linhas de guitarra e baixo em “God Willing”.
Se o Jazz é a mãe do Hip-Hop, o Trap é filho do Rap e quando o Mansur viu, já tinha virado Jazz. Essas novas conexões que são o grande negócio. Solos siderais sob bases absolutamente improváveis. Ouvindo “Me Up” parece que o Benson fez a guitarra. O cuidado em cada nota é sentido pelo ouvinte, o feeling é grandioso e flerta com tudo. “Mashita” e “Black South” poderiam ter sido composições Hendrixianas se o Trap estivesse na moda nos anos 70.