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CD's, Eddir Hazel, Funkadelic

Maggot Brain: a ressurreição do Funkadelic

”Maggot Brain” é minha música preferida. Para este que vos escreve, ninguém nunca conseguiu transmitir tanto sentimento empunhando apenas uma guitarra. A música começa e em menos de 1 minuto você fica completamente alheio ao que está acontecendo a sua volta, todo seu corpo relaxa e nada passa pela sua cabeça. É tão chocante que nada pode ser registrado, é um um transe inigualável, uma letargia alucinógena profunda, uma senhora terapia de imersão.
Durante este tempo tudo vira nada e a guitarra de Eddie Hazel vira tudo. Se estiver conversando, paro, se estiver no ônibus, perco o ponto. Nada, nada, tem seu fluxo contínuo, tudo depende do guitarrista. Assim que ele toca as cordas… NIRVANA… Se existe perfeição ela está aqui, arrepia toda vez. Creio que ninguém nunca conseguiu estabelecer uma ligação tão profunda com uma música antes e quem já ouviu sabe do que estou falando, é a plenitude espiritual alcançada por meio de uma Gibson.
Diz a lenda que George Clinton esperou o ácido bater, trancou Hazel em alguma sala de estúdio e disse para o americano tocar como se sua mãe tivesse acabado de morrer, descobrindo logo depois que era mentira. A ideia era bater e assoprar, criando um motivo para renovação.

Com toda essa trama em mente, o líder P-Funk colocou Eddie no centro da sala e o cercou de caixas, e quando você escuta o ninar de seu feeling não parece que a mãe do guitarrista morreu, e sim a sua. É a libertação om um sentimento de paz após segundos de tormenta.

É devastador, mudou minha vida e é o som mais tocante que um ser humano já criou. É uma das faixas mais abstratas que já ouvi, mas ao mesmo tempo uma das que me fez mais sentido, um paradoxo chamado Eddie Hazel e um sentimento que consegue demonstrar o que é a música, tanto para minha pessoa, quanto para os outros fãs.

Me dedico a esta arte justamente por momentos assim, onde a música não pode ser explicada e o que te guia é o feeling. Teoricamente não existe explicação, mas é aí que busco viver, nessa linha tênue entre o que não entendo e a vertigem brilhante que momentos como esse conseguem me proporcionar.

Essa experiência de não saber o que sentir, como fazê-lo ou em que ordem administrar a dosagem, só conheci com o americano. Escute tudo que ele já fez e terás certeza, poucos sentiam dessa maneira, seja com a acidez do Funk ou com trechos de música, termo amplo usado para caracterizar algo que vai além, e isso aqui vai muito além.

Toda vez que esse som termina, após dez minutos de longos embates filosóficos, sempre acreditei que a banda, e principalmente Eddie, tiravam um tempo do show para descansar. Parece que ele dá tudo que possui no som, dedica todas suas forças e que nota após nota, bend após bend, tenta elevar a si mesmo e acaba criando algo que o exime de todos seus erros.

”Maggot Brain” foi a missão de vida desse senhor dentro do Parliament-Funkadelic, assim como ”From The Bottom Of My Soul” define sua persona quando o mundo conheceu seu som e exemplifica a maneira como o músico gostaria de ser lembrado, nos alertando sempre que escutamos sua música que o que vale é o sentimento, seja ele em grupo ou solo.

”Maggot Brain” é um estado de matéria. Podemos, abraçá-la, sentir seu cheiro e vê-la em tudo que nutrimos apreço. Até a hora do solo parece que sentimos dor, quando este termina sua vida recomeça, seu corpo levanta de um coma. Sua estrutura reaparece mais motivada, encarando a vida de outra forma e se mostrando pronto.

Bem, não sei dizer para o quê especificamente, mas acredito no caráter de cura e mais do que tudo, acredito no criador, vejo uma lacuna imensa em minha vida sem este som, quando posso ouvi-lo é como se o tempo entrasse na era do gelo e me deixasse viver independentemente de qualquer meio. O retorno da guitarra é o meio e Hazel torna-se a mensagem o planeta que habito neste sistema solar de guitarras e texturas de algo que homens não podem explicar.

Line Up:
Fuzzy Haskins (bateria)
George Clinton (vocal)
Billy Bass Nelson (baixo/vocal)
Eddie Hazel (guitarra/vocal)
Eddie ”Bongo” Brown (bongo)
Tawl Ross (guitarra/vocal)
Bernie Worrel (teclado/vocal)
Tiki Fulwood (bateria)
Garry Shider (guitarra/vocal)
Calvin Simon (vocal)
Grady Thomas (vocal)
Gray Davis (vocal)

Track List:
”Maggot Brain”
”Can You Get To That”
”Hit It And Quit It”
”You And Your Folks, Me And My Folks”
”Super Stupid”
”Back In Our Minds”
”Wars Of Armaggedon”

Depois que der pra continuar com o disco (acredite, vai demorar), os caras surgem com um som que ajuda você a retornar para este plano. Temos o Funk suavizado de ”Can You Get To That”, que nada mais é do que sua última chance de restabelecer contato com a Terra. Caso contrário, a Jam volta com tudo e o senhor se perderá por semanas mais. A panela começa a ferver com os vocais de Bernie Worrell em ”Hit It And Quit It”.
Estabelecemos o termostato lá no teto com ”You And Your Folks, Me And My Folks”. Os vocais seguem aquela linha mais tranquila, mas a cozinha se estabelece de maneira frenética, esse disco é um marco. Temos aqui a chance de ver fusão explosiva de Rock com Funk atingir seu apogeu com a mesma propriedade que um coquetel molotov começa um tumulto, e se o senhor duvida, sinta a quebradeira anunciada de ”Super Stupid” e os relatos de um nóia que fez o corre errado.
Em 10 segundos a casa já caiu! É um daqueles riffs que quebram o falante e que caminham funkeadamente, como se fosse um rolê de moowalk mesclando a Jam com a descontração de ”Back In Our Minds”. É um disco intenso, basta apenas se deixar levar, mas o perigo está aí: encontrar o seu limite, uma linha quase inexistente entre espiritualidade e insanidade, algo que divide os seres que não acabam enterrados como a senhora Black Power da capa e os que escutam ”Wars Of Armaggedon” e conseguem trabalhar no dia seguinte.

Parece que cada tema explora nosso lado mais animalesco e a sensação de fixação é impressionante. Depois que o disco acaba o segundo play é automático, a potência do som é quase um tratamento de choque para viciados e o puro néctar do peso e rebolado parece ser a solução para a última dose. São menos de 40 minutos de som, mas alguns ousam dizer que esses serão alguns dos melhores 2200 segundos de sua vida. Veja só a cara da icônica musa enterrada, ela tem areia até a nuca, mas ao som deste clássico o fundo da terra é um paraíso. Em estúdio somos um, ao vivo a conexão é viral. Arde.

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