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Discos, Resenha

Loud Hailer – 2016

Loud Hailer mostra que entre os dinossauros ainda caminhando sobre a Terra, Jeff Beck é o espécime que seguiu se adaptando às mudanças do ambiente ao seu redor.

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Caras, quando um vovozinho, desses que começaram a fazer rock´n roll há 4, 5 décadas atrás, lança algo novo (considerando o tempo histórico) divide o mundo do rock em duas partes. Uma delas fica eufórica, as fraldas geriátricas ficam cheias, a comoção é geral por mais um morto ser trazido à vida. A nostalgia se eriça, uma vez mais o passado é cultuado num altar de ouro. Do outro lado os incrédulos, esperando outro álbum massante, com gosto de pão dormido. De qualquer forma, quando um grande nome da música, do rock´n roll em particular, na estrada há décadas, ou que simplesmente deixou sua sepultura para mais uma vez se fazer ouvir, anuncia uma turnê ou lançamento de um novo álbum o que encontramos é sempre mais do mesmo. Música de barzinho. Música para compor o ambiente, trilha sonora para conversas hidratas com cervejas ao longo da noite. 

Os Rolling Sones são o maior exemplo de banda zumbi, cujo som ao vivo não empolga, com performances dignas de shows de cassinos em Las Vegas. Elvis Presley, ao menos teve a descência de continuar sua carreia no lugar apropriado, quando nada mais tinha a acrescentar ao rock´n roll. Há décadas seguidas os Stones tocam o mesmo repertório. Não passam de burocratas do rock, exercendo um trabalho sem sentido, desnecessário, pois nada acrescenta à música. Simplesmente por já terem feito tudo que tinham vontade de fazer em cima do palco ou em estúdio. O último álbum solo de Keith Richards, por exemplo, é legalzinho, porém não há nada de interessante ou criativo ali. Reprodução constante do que é Keith Richards desde os anos 60. Keith Richards mimetizando Keith Richards, Stones mimetizando Stones, nada além disso. Existem muitos outros exemplos por aí, mas fiquemos no caso dos Stones, por ser o mais ridículo.

Contudo existe um dinossauro que caminha sob a Terra completamente saudável, vivo, muito longe ser um fóssil. Jeff Beck conseguiu se adaptar às transformações do ambiente ao seu redor. O  rock passou por mudanças profundas desde os anos 50. Poucos seguiram essas transformações, a maior parte chegou ao ápice de sua evolução e daí foi direto para o museu. Aqueles que sentiram necessidade de se adaptar, pois ainda queriam se conectar as gerações que vinham surgindo, conseguiram se renovar e a cada período temporal deixar o casulo e nascer sob uma nova forma.

Loud Hailer, novo álbum do guitarrista é a prova empírica disso. Os últimos álbuns de Jeff Beck mostram o interesse do guitarrista em buscar recursos que refresquem seu som. Busca que o leva a se desvencilhar do mofo de sonoridades guardadas em baús perdidos entre as quinquilharias do porão. Nada de recorrer a formas e estruturas empoeiradas, a menos que estas possam ser reutilizadas para criar algo novo.

Loud Hailer desbrava novos territórios levando a trilha, a carreira do guitarrista, ainda mais adiante, ao invés de permanecer andando em círculos, explorando os limites do seu condomínio. Jeff Beck expande os limites de sua veia experimental em Loud Hailer.  Sua sonoridade é reavivada através da incorporação em sua banda de membros pertencente a muitas gerações depois da sua. Os vocais são assumidos por Rosie Bones, enquanto Carmen Vanderberg divide as guitarras com Beck. Ambas, bem mais jovens que o guitarrista, possuem uma banda chamada Bones. Jeff Beck não as convida apenas para contribuir com seus respectivos instrumentos musicais, mas para compor as músicas do álbum. Ouçam o trabalho delas com a Bones e verão que participaram diretamente na constituição da sonoridade de Loud Hailer. Doaram a Beck sua visão acerca da música para que Loud Hailer pudesse nascer jovem e não velho como se fosse o Benjamin Button.

A parceria firmada com as jovens rockers levou Beck a explorer novas possibilidades sonoras através da sua guitarra. Temos um Jeff Beck interessado em produzir sons ruidosos e abstratos, buscando como matéria prima, é verdade, tanto a psicodelia experimental dos tempos de Yardbirds quanto o peso e cadencia arrastada do Jeff Beck Group. Porém, não as tiras do baú para limpar a poeira e mais uma vez colocá-las na cômoda da sala. Elas são elementos usados para produzir um novo barulho, uma sonoridade que tem o traço do bom e velho Jeff, mas como sabor remoto, bem lá no fundo.

Rosie e Carmem representam a conexão de Jeff Beck com o rock da segunda década do século XXI, o desejo de se misturar com tudo que está na ordem do dia do interesse de quem começou a fazer rock nesta década. Nada do visual ultrapassado do roqueiro dos anos 60/70, na verdade há uma busca em rejeitar tudo que represente o que alguns ainda insistem em chamar de “verdadeiro rock”. Nada de saudosismo, Beck olha pra frente, pois à sua frente uma nova geração de rockers estão desbravando e ele quer fazer parte disso, não mais como pioneiro, mas como coadjuvante.

Loud Hailer representa a vontade de Jeff Beck em fazer parte do novo, sabendo que o protagonismo não lhe pertence mais. Numa completa posição de humildade, própria de quem possui a sapiência da velhice, o cara se integra a um projeto sem impor a sua autoridade. Apenas as faixas 3 (Pull It) e 8 (Edna) não tem participação de Rosie Bones e Carmem Vanderberg.  Os títulos das músicas e as letras revelam preocupações atuais, nada de letras retrô ou que pareçam uma viagem no tempo, tentando resgatar a hoje carcomida postura rocker de 45 anos atrás. Vê-se logo serem letras escritas pela dupla feminina, uma vez que abordam temas como a crítica a mídia de massa, ao entretenimento vazio dos realitys shows, a perda da inocência e males que afligem a sociedade contemporânea. 

Loud Hailer logra sucesso ao tentar se apresentar como um álbum que reflete a sonoridade do rock dos anos 2010. Isso por não soar como um revival, mas opta por usar bagagem musical pessoal como uma maneira de se fazer soar de uma forma diferente. Pra variar, Beck tocando é surpreendente, ainda mais quando se apresenta numa sonoridade nova, traçando caminhos que levam ao afastamento daquilo que já foi feito por ele.

Beck segue inquieto, curioso, deixando-se guiar por um instinto exploratório. Isso o leva a fazer performances no álbum dedicadas a preparar o terreno para que os holofotes recaiam sobre Rosie Bones. Permite que sua vocalista se guie pelo norte indicado pelos riffs intensos e disformes de sua guitarra, impulsionando os vocais, através de rajadas rápidas, porém certeiras, de seu instrumento. Há momentos no album em que a sonoridade do passado surge com alguma intensidade, a ponto de nos remeter ao velho Jeff Beck. Contudo não vão além de reminiscências, rapidamente encobertas pelo vigor da pegada de Rosie e Carmen.

 Nota:  

Ficha Técnica:

Lançamento: 15 de julho de 2016

Duração: 45:04 minutos

Selo: ATCO

Produção: Jeff Beck e Filippo Cimatti

Banda:

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