Liniker estreia arrombando a cena musical com seu Ep “Cru”.
Existem muitas formas de estrear um trabalho, e o cantor e compositor paulista Liniker encontrou uma forma bastante interessante. Lançou de uma só uma vez seu Ep (Cru) e ao mesmo tempo três vídeos das músicas presentes nesse Ep.
Dessa forma conseguiu viralizar um dos vídeos, o especial Zero, que em pouco tempo chegou a 1 milhão de visualizações. O Ep recebeu o nome de Cru, por ter sido gravado ao vivo, mas o que percebemos tanto no disco como nos vídeos é que a arte de Liniker, seu corpo, já está plenamente cozido, assado, marinado e o banquete é nosso.
Percebemos em muitos lugares os jornalistas situarem Liniker como uma promessa. Mas entendemos que essa pequena obra de estreia já é (pela sua singularidade e qualidade artística) uma realidade. Seu timbre de voz e suas três primeiras composições podem até ser promessas, mas se o são seriam antes promessas de felicidade para quem tiver a sorte de degusta-las.
Liniker possui um canto daqueles que não podem ser comparados aos aspirantes a cantores que muitas vezes vemos causar frisson no The Voice Brasil, pois isso (o canto) não se conquista pela beleza de uma voz.
Aquela rouquidão e presença de palco não podem ser ensinadas. Elas são conquistas apenas dos que conseguem definir um estilo singular. Estudante de teatro, possui uma presença de palco impressionante em seus movimentos e na sua “montagem”. Nos vídeos vemos o cantor vestido de saia, blusa feminina, enormes argolas, batom e um imenso turbante. Liniker é um artista pronto pra entrar em estúdio e nos mostrar até onde ele é capaz de ir, mas temos certeza de que ele pode ir muito longe.
Em tempos de reação homofóbica generalizada, quando estarrecidos vemos a cada dia bandeiras reacionárias sendo defendidas por políticos em rede nacional, a estreia de Liniker, do seu corpo político revolucionário é uma lufada de ar fresco, seja pela sua sexualidade explicita, pela sua voz apaixonante, pela verdade de seu ser, ou pela postura orgulhosa de Divo.
Transgressão em mode soul e funk originais, emanando amor. Lacrando em sua estreia, provocando um enorme sucesso, tombando todos os julgamentos morais com a força de uma estética deliciosamente transgressora, abençoado pela força da música. Preto e gay, cheio de swingue e groove. Potência pura!
Zero:
Seria possível que uma música já consiga nascer como um clássico? Sim, vimos isso acontecer milhares de vezes na história da música, e apenas aquele saudosismo insosso é capaz de negar que Zero não seja já uma das melhores composições da soul music brasileira.
Tudo está no lugar em que deveria, com o começo sussurrante e doce das três lindas backing vocals, os primeiros acordes do baixo até a entrada da banda em conjunto, com o trombone desenhando lindamente a melodia junto com todos os outros Caramelos.
Para enfim sentirmos em todo seu esplendor a rouquidão e o tom médio grave da voz manhosa de Liniker, expressando a sua composição, com um apelo sensual maravilhoso. Cantando uma paquera que deu certo, ao mesmo tempo nos conquista e sentimos o transpassar de sua arte sem condições de defesa.
Louise Du Bresil:
Os Caramelos, banda que acompanha o cantor, deixa claro nessa segunda música toda a sua potência quando falamos em groove. A canção é um funkão sinistro em que o Liniker se solta numa construção melódica muito bacana.
O Willian Zaharanszki swinga a guitarra com o wah wah, o baixo grovando tudo de Rafael Barone, a bateria do Guilherme Garboso segurando o ritmo com competência e destreza, Márcio Bortoloti soprando suavemente o trompete na primeira parte da música e riffando bonito em seguida quando a canção flerta com um ragga contagiante e safado.
A música nos fala de uma travesti, amiga do Linker, a qual ele visita para dar um xêro. No vídeo percebemos como o cantor é capaz de nos contagiar também com a alegria e irreverência do seu canto, além do molejo característico que ele apresenta no vídeo, ao se sacudir.
Caeu:
O soul volta a carga total aqui, cantando uma paquera seguida de um amplexo delirante. Essa última da tríade lançada nos coloca a questão do quanto o talento do rapaz é fantástico. A música talvez possa figurar como uma mistura das duas primeiras, mesclando a leveza de Zero à força balançada de Louise du Bresil.
Uma sensualidade homafetiva que, como todas as outras formas de amor, podem ser sentidas como nossas. As composições de Liniker comunicam sua vontade de se expor, de colocar pra fora seus desejos e nos convence de sua qualidade e singularidade. Demonstrando a diferença de sua persona e de sua arte.
A banda sempre certeira, produz a cama onde ele deita com a naturalidade de um veterano da música. Seu pedido, para nos bagunçar na verdade, é retórico. Ele nos revirou sem pedir licença.
Esperamos para breve um disco cheio e uma apresentação em Salvador – não necessariamente nessa mesma ordem. Enquanto isso recomendamos vivamente a audição dessas três músicas para nos preparamos para o que vem em seguida. Liniker está entre nós e nós gostamos muito de sua presença.
Baixe o Ep aqui.