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Jovem Esco e a sua linha de fuga no Hip Hop – Free Esco

Em novo disco Jovem Esco abre sua caixa de ferramentas e junto a diversas participações, constroi uma linha de fuga a mais no Hip Hop.

O disco Free Esco (2020) está sendo minha porta de entrada para o trabalho do MC e produtor Jovem Esco. Desde que alguém nos recomendou o seu disco no twitter algo me levou a salvar o disco no spotify e tenho escutado esse trabalho de modo atento, sendo aos poucos tragado para o universo que o MC construiu nesse seu último trabalho. Sendo assim, esse texto é um reflexo desse processo, se restringindo a tratar deste disco em específico e não de sua obra como um todo. Um recorte parcial de uma obra que já possui várias outras produções como Califa Cinza (2018) e Degustando flores (2019). Além de singles, participações e audiovisuais!

Tendo começado a escutar sem informações prévias do disco, e com uma catarata avançada nos dois olhos, foi literalmente a audição que foi aos poucos me informando sobre a construção estética do disco, ao mesmo tempo em que ia me apresentando o artista. Só em um segundo momento tivemos condição de mensurar o tamanho da coisa, o que mencionamos aqui pois não foi a escalação de primeira do disco do Jovem Esco que definiu nossa atenção e admiração. Num primeiro momento a coesão entre lírica, ambiência e sonoridades, aliada ao grande contingente de participações nos chamou atenção.

Para o Free Esco (2020), há uma tropa que com suas singularidades somam numa intenção subjacente ao disco como um todo, liberdade que como tal está mencionada no título do disco. Essa tropa possui alguns dos nomes mais singulares do rap brasileiro atual: niLL, Yung Buda, William Luis, MC Versa, Makalister, Victor Xamã, LUCVSFIG, Zudizilla, Beli Remour e Victor Moraes.

Todos ao seu modo, colaboram com a idéia central do disco e ao mesmo tempo fazem o Jovem Esco brilhar em toda sua versatilidade. Reunir tantos MC’s de estilos tao marcantes e diferentes entre si, poderia ser uma desvantagem porém, apenas para quem não tem lenha pra queimar. E como fica bem escuro ao longo do disco, Jovem Esco joga nas 11, com tranquilidade. Para mais uma surpresa nossa, todas as produções do disco são da lavra do próprio Jovem Esco, com a colaboração de Edilson Dourado que inseriu sintetizadores e alguns instrumentos, além de ter feito a mix e a master na Goldened Music.

Todas as faixas tocam de algum modo em temas que nos remetem a luta pela liberdade, pela dignidade que são desde sempre a missão primordial do Hip-Hop, assim como a diversão. Se é verdade que dentro da indústria cultural a cultura hip-hop segue sendo esvaziada e se tornando palatável para uma classe média branca; Ela – a cultura hip-hop – continua sendo um vetor de fuga das armadilhas preparadas por um racismo estrutural em qualquer favela do país. E não é exagero algum perceber como Free Esco (2020), totalmente embebido de cultura hip-hop, não é apenas música rap e Jovem Esco não é um desses cosplays de bandido. Dessa forma, estamos diante de um artista sabedor de sua história, o MC coloca para fora seus “dons” e “medos”, fugindo ativamente do fakegame.  

Dessa forma, a modernidade das produções do Jovem Esco, a escolha das participações e suas linhas formam uma máquina de guerra que arrasta e leva adiante visões de luta dentro da cultura hip hop. Com faixas dedicadas a diversão, reflexões sobre si mesmo, visões sobre o jogo, com poética singular, mas sobretudo com uma consciência fina e aguerrida diante do sistema. Palavra gasta é bem verdade, mas nem por isso menos atual.

A consciência racial e social do Jovem Esco nos é apresentada aqui constituída de análises poético-críticas cada vez mais pertinentes, sobre esse mesmo sistema. Utilizando linguagem pop, trap, plug etc, para através dessas sonoridades contemporâneas demonstrar a força de sua arte. E é nesse sentido que Free Esco (2020) se permite liberdade artística, mesclando artistas de norte a sul, com líricas bem diversas entre si, sonoridades do trap, mas não esquece do “conteúdo combativo”.

Ao longo das 11 faixas que compõem o álbum e os seus 47min e 56s, as rimas e batidas se desenrolam com suavidade, convidando à reflexão e ao balanço. Jovem Esco mostra-nos a possibilidade de se fazer um disco moderno em suas visão sonora e política. onde substâncias alucinogenas não são alienação, onde sexo não é misoginia, onde referência ao crime não é jogo de cena e o amor não é clichê. Não há apelação em nenhum momento, antes muita sensibilidade ao tratar dos temas a que se propõem. Há algo de melancolia nas músicas, assim como há em suas linhas um espécie de doçura, ele não sobe o tom em momento algum, poético e frio em certo sentido, cônscio daquilo que busca fugir, pois talvez já tenha encontrado.   

Para muitos jovens no nosso país, a música rap acompanhada da cultura hip-hop é uma saída de um destino traçado antes de seus nascimentos. É sempre a descoberta do prazer e da responsabilidade da criação e a tomada de consciência de seu lugar no mundo, a abertura para a possibilidade crítica. Para muitos, é a descoberta da sua negritude e de tudo que esse tornar-se pode lhes acarretar. Porém, sabemos o quanto viver de música é um desafio gigantesco, sobretudo num país que não valoriza novos artistas.

Esse terceiro disco do Jovem Esco, nos aponta essas dificuldades e ao mesmo tempo as possibilidades concretas de construção coletiva. Free Esco (2020), além de ter a participação de vários MC’s, cita em seus versos dois MC’s: Felipe Ret, Vandal e ManoWill, em homenagens que nos mostra a possibilidade de ser artista, não ter alcançado o reconhecimento merecido, mas não se transformar em um ególatra escroto (termo tautológico)!  

O disco do Jovem Esco é reflexo também de uma caminhada dentro dessas questões que ele cita, de uma fuga ativa diante das armadilhas do sistema. Sua poesia é ainda hoje e mais do nunca necessária, pois mira nas Traphouse (resgate como se dizia antigamente). Daí, o que denotamos de uma afirmação do tamanho de Free Esco (2020), é muita consciência musical, um senso estético apurado para conseguir compor um disco com tantos convidados e luta, muito luta. Um disco para de algum modo medicar as doenças que cercam a cena, mas também os nossos e nossas que estão aí à mercê da guerra às drogas, de um sistema carcerário degradante, atualmente do desemprego em alta e de uma recessão econômica galopante. 

Em suas linhas ao falar de si mesmo, Jovem Esco sempre está no coletivo, pois homem negro consciente de seu papel, e por vezes clamando a voz do povo. Canta versos com excelência melódica e poética, produz batidas instigantes, escreve imagens poéticas que estão longe dos clichês constantes do mainstream. Free Esco (2020) é um disco que precisa ser escutado…

– Jovem Esco e a sua linha de fuga no Hip Hop – Free Esco

Por Danilo Cruz  

 

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