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Giovane Sobrevivente Melanina, O Mais Profundo É A Pele!

Giovane Sobrevivente lançou Melanina seu primeiro cd, ele que é ativista e Poeta. Nos colocando para descobrir a nossa ancestralidade e arte!

Giovane Sobrevivente é Coisa Forte!

“A Encruzilhada é o ponto chave para os caminhos da vida, para os caminhos do ser humano. Você quando está numa Encruzilhada, você está num ponto em que você se comunica com todos os seus caminhos, cada raiozinho é um caminho, mas, a opção de seguir por aqui ou por acolá é do ser humano. A Encruzilhada é isso!”

(Makota Valdina)

 

Giovane “o” Sobrevivente falar sobre ele requer uma minucia de palavras precisamente pensadas. Para além de mais um CD no mercado, faz- se necessário voltar um pouco no tempo. Pois, o mestre Garvey em seu legado nos deixou a mensagem que um Homem que desconhece seu passado é feito uma árvore sem raiz. Em tempos de guerras declaradas falar de Áfrika é ser taxado de louco. Rebelar-se contra as mentiras que nos são contadas ainda na primeira infância, onde a “presença escolar” é mais importante que “o conhecimento”, é uma afronta a uma brankkkitude que secularmente pensa na extinção da melanina.

Pensar  em uma politica de segurança precisamente organizada para caçar e matar Pretos, e discutir essa política que nunca atendeu as nossas demandas, onde as mesmas surgiram pela existência de tal modelo, é  mexer num vespeiro se posicionar contra isso, pois, não existe em diáspora uma única pessoa de pele Preta que não tenha sofrido direta ou indiretamente com a violência policial.

A construção de um modelo “Pan-africanista” desconstrói “Todos” os padrões impostos pelo Racismo. Uma neoplasia maligna que vem destruindo sócio e economicamente as células Afrikanas contidas em nossos corpos e memórias. Criando e recriando maneiras de derramar em cada Favela o sangue sagrado dos corpos que trazem na derme o ouro Preto. O conjunto de casas (des) organizadas, para atender a uma demanda social atende por Favela. Esta por sua vez tornou-se um problema social. Um campo minado onde os nossos meninos- homens bombas – se projetam em meio a uma guerra onde só um lado morre. Volto a mim, e retiro o termo guerra, pois, por uma questão lógica percebo que o termo mais adequado para relatar os fatos é “Genocídio”, já que guerra dá ao outro o direito de revidar. E morrer em todas as Favelas é um verbo onde só os Pretos conjugam.

Voltar-me para o CD “Melanina”, é olhar antes de tudo para dentro de minha alma, de maneira que eu nunca conseguiria tal qual uma jornalista escrever uma matéria ou algo do tipo. Ter a sensibilidade para ser a presença do que nos é sagrado, ou você sente ou “nada é”. As quatorze faixas que o compõem, trazem uma harmonia das dores que nos assolam a alma. Onde o Poeta e escritor afronta a sociedade e escancara que estamos cientes de todo mal por sofrer com ele diariamente. Pela amplitude que o CD traz em mim, a facilidade de por os meus olhos em cada faixa e estuda-la de maneira leve, buscando sua essência antes mesmo de uma escolha, é adentrar a Poesia.

Perceber a estrutura enquanto organização de “Melanina” é um ato de extrema sensibilidade. Afinal a critica não nos fora ensinada como algo construtivo, justo por querer nos colocar em ataque diante do nosso igual. “Encruzilhada” nos faz caminho! A mais velha abre o CD mostrando que jamais deve-se parar diante dos obstáculos que surgem.  Nossa cultura antes demonizada hoje serve de estudo para os pesquisadores das grandes universidades que pagam pra ver aquilo que nunca terá preço. A cada um foi dada uma missão e isso é ressaltado em “De volta para o Quilombo”, onde nossas desgraças são vistas em cada passo dado. Acordos com a Brakkkitude não da mais. Muitos dos nossos cooptados por meio dos cargos de confianças, dos favores pessoais e das vendas de alma abrem chagas eternas em nossas memórias. A invocação da ancestralidade por meio da energia traz a cura diária para as doenças que assolam nossas almas que em Diaspora choram o desespero de cada Mãe Preta que enterra suas crias envoltas de rajadas das balas, lombrosianamente pensadas para o fim ao qual destina-se!

A revolta diante do que é belo traz antes de tudo “Um sonho” de desmascarar toda essa mentira sustentada por uma mídia que, induz e impõe. Que faz meninas odiarem a sua cor e seus traços reais, que faz o menino desejar não ter os cabelos ou a aparência, já que a mesma não condiz com o que a mídia tem enquanto padrão de beleza. Isso me remete particularmente ao fato de toda e qualquer menina Preta que nasceu na década de 90, desejar ser uma “Paquita brankkka” , para negar e agir exatamente como o plano deseja.

A sensibilidade de compreender o racismo que passa despercebido em meio à pureza das nossas crianças e de nós enquanto crianças, a faixa de número quatro me toma quase que completamente. Antes de tudo a primeira vez que eu ouvi falar de Giovane foi exatamente sobre essa faixa. “Devolva a perna do Saci”, me faz sentir o asco da enganação contida na programação meticulosamente pensada para que as subliminaridades estejam escancaradas, mas não vista. A perna do saci ao ser cortada traz o ato de ceifar-nos de nossas memórias diante da nossa ancestralidade.

“O. s.a.c.i  t.i.n.h.a  d.u.a.s   p.e.r.n.a.s

U.m.a   d.a.v.a  o. p.a.s.s.o   a.f.r.i.c.a.n.o

  1. o.u.t.r.a  c.o.m  o.  t.e.m.p.o,   a.  c.u.l.t.u.r.a   f.e.z   a. r.u.p.t.u.r.a”

(Cuti)

 

Escrever sobre desgraças é sempre muito arriscado na atual conjuntura dessa Diaspora maldita e mal vista em que fomos brutalmente inseridos. Falar de desemprego com um tom poético requer uma sabedoria que só a Universidade da Rua ensina. Compreender o processo histórico onde após o dito fim do “período escravocrata”, traz à tona a discussão enquanto processo indenizatório social. Trocando em miúdos é o não pagamento por cada açoite, para cada gota de sangue que lavou as Amerikkkas. Falar de desemprego é falar antes de tudo de subalternidade, de um lugar onde a chefia nunca nos coube, ou nos é dada quando querem nos por,  um contra o outro. A carta tem dado certo… O maldito plano  de fazer com que não nos reconheçamos em nossa semelhanças. Assemelhar essas atividades sem falar na profissão mais dolorosa e velha em diáspora, faz o sangue ferver.

“T.i.a   A.n.a.s.t.á.c.i.a   e.s.t.á   r.e.v.o.l.t.a.d.a!

T.i.a   A.n.a.s.t.á.c.i.a   e.s.t.á   r.e.v.o.l.t.a.d.a!

E.l.a   f.a.z   o.s   b.o.l.i.n.h.o.s   e.  d.o.n.a   b.e.n.t.a   é.  q.u.e.m   l.e.v.a   a. f.a.m.a

F.a.r.i.n.h.a   d.e   t.r.i.g.o   d.e.v.e.r.i.a   s.e  c.h.a.m.a.r   T.i.a  A.n.a.s.t.á.c.i.a

  1. n.ã.o   d.o.n.a   b.e.n.t.a”

(Giovane o Sobrevivente)

Nossa Princesa Anastacia! Nossa Preciosa Princesa! Posta nas cozinhas das Casas Grandes. Hoje tida como “Casa de Família”, tendo em vista que a casa que não tem estruturalmente aquele maldito modelo criado as nossas custas e costas, não se faz Família. Denominando seu espaço como o da cozinha, sendo a “criada”, que em sua maioria esmagadora é quem “cria” as ditas “crias” dos Brankkkos. A menina que acompanha a Mãe no serviço para seguir seus passos, rebela-se e não quer compactuar com aquele jogo.  Cansada de ser mandada, quer ocupar o mesmo espaço. Mas, como? Se nunca houve nenhum tipo de indenização para com tudo  que sofremos e que continua ocorrendo em cada viela dessa pátria que é tudo menos gentil, ao menos com os Pretos.

Ý.è.m.à.n.j.à

M.à.r.à.b.ó   À.y.ó

Ý.è.m.à.n.j.à

(Fragmento de Cântico sagrado para o Orixá  Ýèmànjà na Nação Ketu)

Em Diáspora seguimos século após século tendo que engolir uma falsa cultura brankkka que sempre nos impôs sua religião, demonizando tudo o que culturalmente remete a Áfrika. Todo e qualquer espaço preto é sim, nossa ancestralidade viva. E isso se faz presente nos Terreiros de Candomblé, que apesar de servirem para nos lembrar de costumes passados por meio da oralidade e do Tempo, segue sendo alvo de todo tipo de atitude racista por meio de uma mídia criada para nos fazer odiar nossas raízes, capazes de deturpar algo que atende a um propósito para além desse plano. “A Verdade” sobre a parte que nos move enquanto Afrikanos segue sendo cuidada por meio de mãos Pretas que em sua maioria “Mulheres Pretas”, tal qual nossas sociedades matricentristas antes do Trafico de Pessoas para as malditas Amérikkkas.

 

T.i.t.a.n.i.c   f.o.i   p.r.o   m.a.r

M.a.s,   n.ã.o   f.a.l.o.u   c.o.m   Ý.è.m.à.n.j.à

A.f.u.n.d.o.u!

(Giovane o Sobrevivente)

A cada palavra preta lançada por meio de pequenos gritos diários, damos mais um passo rumo a nossa libertação enquanto Povo  pois, já dizia o Mestre que as correntes do corpo foram arrancadas agora falta arrancar as correntes da mente. Culturalmente  nos foi dado o pão e o circo em meio ao caos que segue cada Homem e Mulher Preta nessa sociedade adoecida. “É Carnaval”, e em meio aos festejos que geram milhões de meios para as sonegações de impostos que disfarçados por  maquiagens, seguem  nossos reais problemas. A violência por meio da segregação nunca foi Afrikana.  Os dados da violência aos homoafetivos traz números absurdos e aceitáveis apenas aos olhos da brankkkitude heteronormativa, que decretou guerra aos que resolveram viver. Mas, quando falamos de Homofobia, devemos levar em consideração que existe uma diferença imensa de como é tratado um Gay branco e um Gay Preto. Sócio e economicamente falando um é aceito por trazer uma sensibilidade, e o outro deve morrer por que além de ser Preto, é Gay.

“Não estamos falando de um estado paralelo, estamos falando de um estado secularmente organizado para matar Negros. A existência de polícias no Brasil, desde o inicio do  séc. 19. As polícias foram treinadas e organizadas para caçar e matar Negros. O modelo de polícia que existe no Brasil é incompatível com a nossa existência”

(Vilma Reis)

A prática de caçar e matar Pretos , está para além do nosso entendimento. A polícia que hoje conhecemos descende  da brigada militar que por sua vez segue os mesmos passos dos capitães do mato ainda no período escravocrata. O mesmo capitão do mato  que era mandado pelo senhor de escravizados, segue em cada viela dessa pátria com o mesmo objetivo de outrora. Perceber-se nesse fogo cruzado e sobreviver a ele é uma tarefa árdua e diária. Perceber os perigos que vem com a noite na favela. Onde o raiar do dia traz a realidade. A morte, as lágrimas… As estatísticas que fomentam a guerra onde só um lado morre.

“U.m   d.i.a   u.m   h.o.m.e.m   b.r.a.n.k.k.k.o   m.e   f.a.l.o.u

Q.u.e   n.o   B.r.a.s.i.l   s.ó   t.e.m   b.r.a.n.k.k.k.o,   b.r.a.n.k.k.k.o

M.a.s,   q.u.a.n.d.o   e.u   o.l.h.o   e.u   t.o.d.o   c.a.n.t.o

E.u   v.e.j.o   o. b.r.a.n.k.k.k.o   d.o.m.i.n.a.n.d.o   t.u.d.o”

(Giovane o Sobrevivente)

Olhar em volta e perceber que tudo se faz mentiras nesse país. A cor de uma pátria lavada com sangue e mortes não condiz com a realidade da maioria esmagadora que finge ser minoria. Os olhos verdes e cabelos lisos tomam as redes de alienação em massa, destruindo e distraindo toda essa gente que desejou ou deseja ser mais claro e limpar a família dos resquícios Afrikanos. O Povo vem sendo dominado em todos os campos mas, o mais eficaz dentre todos é o domínio da mente. Seguimos adoecidos com a mistura racial… A preta se chama morena ou mulata, o sonho é casar-se com alguém mais claro tornou-se normal,  alisar os cabelos para parecer bonita, apertar o nariz para não parecer achatado. Ser tudo, menos a Verdade!

“É.  p.o.u.c.a   m.e.l.a.n.i.n.a!

É.  p.o.u.c.a   m.e.l.a.n.i.n.a!

J.e.s.u.s   C.r.i.s.t.o   n.o   E.g.i.t.o

S.o.l   d.e   q.ua.r.e.n.t.a.  g.r.a.u.s

C.a.b.e.l.o   a.l.i.s.a.d.o,   n.a.r.i.z   a.f.i.l.a.d.o.

A.i.n.d.a   t.e.m  g.e.n.t.e   q.u.e   a.c.r.e.d.i.t.a”

(Giovane o Sobrevivente)

Yeshua, o Cristo Negro, também foi embranquiçado. A sociedade brankkkas jamais aceitaria um salvador com a derme escura. Logo foi muito fácil criar um homem com aparência social aceitável. Isso serviu também para a demonização e mentiras criadas em torno do que se faz sagrado nas religiões de matriz africana. E a sociedade exclui, taxa e veta toda e qualquer possibilidade de envolvimento emocional de duas pessoas de religiões diferentes, mas, caso uma delas siga o candomblé… Separa, ou pelo menos existe a tentativa. As crianças sentem –se coagidas em usar seus “fios de contas” e tudo o que pode ser considerado não cristão. Pois, isso pode lhes custar a vida.

“Ò.n.í.s.à.u.r.è    s.á.ù.à.s.é

Ò.n.í.s.à.u.r.è   Ò.d.è.b.è.r.í.o.m.à

Ò.n.í.s.à.u.r.è

B.à.b.à.s.à.u.r.è   s.á.ù.à.s.é

B.à.b.à.s.à.u.r.è   Ò.d.è.b.è.r.í.o.m.à

S.á.ù.à.s.é”

( Fragmento de cântico sagrado para o Orixá Osàlà- Nação Ketu)

 

“Respeite minhas contas, Brankkkas”

(Giovane, o Sobrevivente)

As rodas que cercam nossas vidas, sejam elas do candomblé, da capoeira, ou mesmo o ventre materno, nos traz a sensação de proteção e aconchego de casa. Pois, em nossos espaços trazemos as energias ancestrais e a força que a melanina tem quando junta. Nas rodas seguimos o fluxo do transe, onde o mal não nos pode alcançar.  Mas, ao acordar para a realidade nos deparamos com as tristezas da alma, e as chagas abertas em nossas mentes. Mas, o coração Preto vai sempre buscar uma roda para acalmar-se e fortalecer outro coração, que feito um tambor jamais deixa de pulsar esperança de dias melhores para nosso Povo. Jamais esqueceremos que no dia de 13 jovens foram brutalmente assassinados em mais uma favela desse  país. O crime segue impune. Aqui quem mata com aval do estado está sujeito a proteção e a promoção é certa.

Parafraseando Inquérito

“Em diáspora, quem não tem sangue de Preto nas veias

Tem nas mãos”

Por Mara Mukami X

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