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Game Over Riverside (GOR) – Empty (2017)

Game Over Riverside - Empty - Capa

Empty, novo trabalho da GOR, possui diferentes tonalidades de pessimismo, reflexo do vazio que parece consumir nossa existência. 

Quem mora em Salvador ou visitou a cidade e conheceu a Cidade Baixa experimentou a sensação de parecer ter deixado a capital baiana. Os bairros que compõem essa região ainda preservam muito de suas características originais, pois não passaram pelo processo de “modernização” responsável por padronizar tudo, retirando as peculiaridades dos lugares. A identificação dos nativos da Cidade Baixa com sua localidade de origem é orgânica, isso lhes serve de referencial identitário. Esse sentimento é tão forte em seus moradores que podemos considerar haver um modo de ser próprio de quem é da Cidade Baixa.

As peculiaridades desse contexto sociocultural certamente tiveram sua contribuição à constituição da identidade musical da Game Over Riverside (GOR). Formada por jovens moradores da Cidade Baixa nos idos de 2002, a banda se caracteriza pelo uso do volume e densidade sonora como matéria prima para elaboração de suas músicas.

Podemos dizer que esses elementos constituem o cerne da banda, moldada por diferentes ferramentas, retiradas de estilos rockers diferentes, pois muitas são as influências dos membros da GOR. Elementos do punk, grunge, indie, permeiam suas composições forjando o vigor característico da sonoridade da banda de modo geral.

Em 2016 lançaram Ep que leva o nome da banda, celebrando a nova fase da banda.  Contudo apenas em seu novo trabalho, Empity, a GOR moldou uma sonoridade que reflete a fase pós retomada das atividades. Enquanto o Ep de 2016 estava diretamente ligado aos primórdios da banda, Empity, ao menos para mim, rompe por completo com a fase de juventude da banda.  O novo trabalho é resultado do mergulho de cabeça da GOR nos anseios, preocupações, fruto de vivências experienciadas num cotidiano repleto de responsabilidades. Agora há família com que se preocupar, uma carreira paralela à banda, contas e impostos para pagar e o que pesa ainda mais, uma visão mais ampla, aguçada e crítica sobre a vida.

As letras das músicas abordam temas ligados à vida adulta, encarada a partir de uma perspectiva cuidadosa, próprias de quem já carrega certa bagagem de vivências. Essa cisão mostra a organicidade entre o som da banda e o contexto atual da vida de cada um de seus integrantes. Desse modo os temas do álbum são perpassados por certa dose de pessimismo acrescido de críticas ácidas direcionadas ao modo como a existência é banalizada, transformando pessoas em seres autômatos.

Empty (Vazio), trata disso e não é por acaso que o Ep leva seu nome e abre sua lista de músicas. O vazio existencial retratado pela letra ganha intensidade pelas modulações realizadas ao longo da música pelo instrumental. O tom pessimista dessa faixa é pesado, alguns trechos da letra mostram bem isso:

“Empty/ Your house is empty/ All is empty in the city full of”

 “Vazio/ Sua casa está vazia/ Tudo está vazio na cidade cheia de

A estrofe leva ao refrão:

“Babies ready to die” “Bebês prontos para morrer”

que é martelado constantemente levando a uma intensificação do pessimismo e a um desfecho completamente desprovido de esperança.

Mais uma vez a presença das três guitarras na formação da banda mostra sua relevância. O modo como exploraram esse recurso para encaixar diferentes texturas sonoras revela planejamento cuidadoso na constituição da faixa. As notas destacadas pela guitarra solo ao início da música geram certa sensação de incômodo, levando o ouvinte a entrar em sintonia com o sentido da letra.

Escolhida pra capitanear a divulgação do novo trabalho da banda, Me and My Band apresenta sonoridade mais livre, conjugando leveza e densidade, mistura arriscada, mas que resultou em matizes sonoros vibrantes, alternando momentos de alta intensidade e brandura. 

Aqui também as guitarras roubam a cena imprimindo força à sonoridade da banda, sem criar redundância. Sendo assim, o que poderia gerar certo tumulto no som da banda, acaba se apresentando como ponto de destaque, graças ao modo como a presença das três guitarras se faz e que tem em Me and My Band exemplo perfeito do que estou tentando mostrar.

As guitarras base são executadas usando timbres secos, criando o suporte necessário para as notas longas da guitarra solo, combinando de forma coordenada para sustentar o vocal grave e denso que surge. Essa parte inicial da música é uma preparação feita a fim de receber o impacto vindo com a intensidade da distorção que vem de forma avassaladora. A música ganha vigor quando todas as vozes surgem de forma avassaladora, levando o ouvinte a sair de um ambiente para outro. Temos aqui o uso dos contrastes em diferentes etapas da música, algo que leva o ouvinte a experimentar diferentes sensações e emoções no transcorrer da música. 

Quem ouviu a GOR e conhece o som da banda, sabe que Me and My Band leva marcada em cada nota o traço peculiar da banda, que consiste em criar diversidade sonora usando elementos simples. Geralmente muitas bandas acabam se repetindo, conseguindo fazer apenas em seu primeiro trabalho algo de relevância.

Densidade, peso e sujeira, ingredientes usados para formar a sonoridade de God In a Talk Show. Riffs e andamento provocam angústia, ampliando o impacto da letra que aborda o vazio existencial causado pela ausência de Deus. Efeitos barulhentos em diferentes alturas, abstração tudo caminha na direção da insanidade. Segurar a barra da finitude da existência é barra deveras pesada!

Os questionamentos feitos colocam em cheque os valores humanos que necessitam de uma ficção que os justifiquem. Será que escolhas morais feitas pelo medo da punição ou pela espera da recompensa refletem o caráter ou personalidade de alguém? Se Deus precisa bater em sua porta para você destravar seu coração amigo, sinto lhe informar, ele permanecerá trancado. 

Vivendo sob a égide de um governo instituído por meio de um golpe político não há como se esquivar do assunto, a menos que não se importe ou o apoie.  Paper Planes trás à tona imagens do momento sombrio pelo qual o Brasil passou durante os anos de chumbo, ou serão imagens de momentos que vivemos atualmente?

Certo mesmo é que imagens de repressão por parte do estado sobre a população são colocados e mesmo que tempos atrás acreditássemos que jamais passaríamos por uma situação dessas novamente, fato é que fomos tragados de volta aos tempos de suspensão da democracia. Em tempos quando há pessoas elogiando a Ditadura Militar e mesmo defendendo que esta jamais existiu, músicas como Paper Planes são mais que necessárias.

Roswell aborda uma temática sci-fi usada pela banda para questionar o modo como a propaganda e o entretenimento são usados para moldar nossa percepção da realidade de modo a nos controlar. Os caras fecham o Ep com uma faixa pesada em todos os aspectos. Ritmo frenético, realçado pelos elementos sonoros gerados por cada instrumento, resultando num clima de ansiedade que reflete bem o conteúdo da letra. Trata-se de um ódio direcionado a algo ou alguém que de alguma forma quer estabelecer algum tipo de controle, estabelecendo o que devemos gostar, quais sentimentos, objetivos e desejos devemos ter. A negação colocada por toda a letra mostra-se como forma de resistências a essas investidas. Para expor a gravidade dessa situação, usam versos fortes e violentos. 

A Game Over Riverside compôs uma obra conectada ao momento pelo qual passamos, captando bem o ambiente carregado que nos coloca diante de um futuro incerto. O mal estar gerado em cada brasileiro que se sente dentro de um filme de ficção científica no qual seres e situações já quase irreais, voltam do passado para nos aterrorizar, fazendo-nos pouco a pouco a experimentar novamente o pesado cabresto da falta de direitos civis básicos, está muito bem representado em Empty

Nota: 

 

 Ficha Técnica:

Released August 18, 2017 


Gravado em: André Araújo Estúdio.
Masterização: André Araújo, Sérgio Moraes e Leonardo Cima
Mixagem: André Araújo, Leonardo Cima
Produzido por: André Araújo
Direção: Game Over Riverside
Banda: L.Cima (Bateria), A. Psica (Baixo), L. Miranda (guitarra solo), John-John (Guitarra base e efeitos), S.Moraes (Vocal e guitarra base).
Participação nos vocais: Suzi Almeida (Banda Invena).
Capa e arte: Sérgio Moraes
Tipografia: Ricardo Cidade

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