FERALKAT lançou no dia 25 de novembro o single ‘Existo’, logo acompanhado de um vídeo clipe que você apreciador de uma sonoridade pós punk não pode deixar passar.
O Paraná não para de nos surpreender!!
Desde o momento em que o Oganpazan passou a olhar atenciosamente para a cena musical paranaense, uma miríade de sonoridades e experiências musicais nos foram reveladas. O protagonismo feminino é a grata surpresa. São inúmeras as bandas de mulheres ou que tem mulheres à frente. Entre as quais podemos citar a The Shorts.
Não deixem de ouvir essa banda! Por agora, é o que temos para oferecer sobre a The Shorts, deixá-la como uma dica. Citamos a banda porque nosso foco aqui é o trabalho solo de sua vocalista, Natasha Durski. Assumindo o alter ego FERALKAT, iniciou uma jornada para dentro de si mesma, a partir da constatação dessa ferocidade que deu forma à FERALKAT.
Embora seja uma experiência pessoal, acabamos por nos identificar com as emoções, impressões e sentimentos revelados pelas suas músicas. Porque compartilhamos um mesmo plano existencial, vivemos numa sociedade opressora, que nos estimula a consumir, mas que sequer dá condições para a maioria de nós sobreviver.
Uma sociedade projetada para se aproveitar de nossa vulnerabilidade social para nos obrigar a desempenhar funções que nos aprisionam, nos torturam. Nessa estrutura social planejada pelos donos do poder, somos obrigados a desempenhar tais funções, pois dentro deste arranjo social desenhado para nos controlar, esta é a única forma de sobrevivermos.
Letras densas que refletem nosso tempo
Em Tonight, primeiro single da FERALKAT, já nos deparamos com temáticas existenciais, que se voltam para uma certa melancolia solipsista. Esse movimento de voltar-se para si, para as experiências psíquicas, imaginativas e emocionais próprias, revelam uma tomada de consciência. E me parece que as letras de ambos os singles exploram os efeitos disso.
Vamos retornar ao que interessa aqui, o último lançamento da FERALKAT. Gosto muito da relação orgânica entre letra e música em ‘Existo’. A letra mostra uma consciência desesperada por se dar conta do vazio de sua existência.
Os filósofos existencialistas apontavam para os efeitos nocivos causados pela descoberta de ser uma existência planejada por instituições, corporações financeiras, elites econômicas e castas sociais dominantes.
É desesperador saber que sua existência não é uma obra sua. Contudo, o tom pessimista, por ventura experenciado nos versos iniciais, ameniza-se nos versos que são uma espécie de refrão da música.
Eu canto esse canto que é pra não esquecer de mim
Liberto esse canto que é pra não desistir de mim (2x)
O ato de cantar se apresenta como uma arma contra o pessimismo absoluto. Cantar é uma forma de se manter consciente, em guarda, manter-se firme na luta contra o perecimento. Fica difícil não relacionar a descrição da experiência psíquica presente na letra com o aumento das doenças de caráter mental (ansiedade e depressão) nos últimos anos. Muito por conta da pandemia, mas também pelo aprisionamento das mentes das pessoas em bolhas virtuais.
As consequências dessa captura das mentes através dos algoritmos das redes sociais e ferramentas da internet não é apenas sobre a mente, o corpo também sofre estes efeitos. Fato é que a letra reflete nosso tempo.
Experimentalismo de inspiração eletrônica
O que foi dito acerca do que a letra expressa se aplica também à música. Caso ‘Existo’ fosse instrumental, teríamos despertadas as mesmas sensações e ideias tal qual ocorreu com a leitura da letra. Isso porque a trama sonora costurada por FERALKAT forma um todo beirando o sombrio.
Experimentamos uma imersão angustiante através das tramas sonoras tecidas por FERALKAT. Não consigo deixar de vincular a sonoridade de ‘Existo’ com a sensação nauseante gerada pelos mecanismos de controle que operam sobre nós. Moldando uma existência atormentada pela ansiedade constante, resultante de estímulos administrados pelos algoritmos que nos fazem desejar consumir compulsoriamente.
É nesse sentido que considero ‘Existo’ o escancaramento do que se passa em nossas mentes, o que carregam nossos sentimentos e emoções. E é nesse sentido que afirmei no início do texto haver uma organicidade na interação entre os sentidos e sensações gerados pela articulação entre letra e sons. Daí nasce a “alma” desta música.
Em conversa com Natasha sobre FERALKAT e o trabalho desenvolvido nesse projeto solo, ela disse o seguinte:
A Feralkat surgiu muito da minha vontade de experimentar mais com sintetizadores que é um instrumento que eu gosto muito de tocar, e como eu venho de banda eu sempre penso a música de uma maneira muito orgânica, então acho que isso reflete um pouco na textura do meu som mais eletrônico.
FERALKAT vai por sendas pouco exploradas pela cena independente brasileira. Não tem muita gente por aqui explorando as possibilidades sonoras e compositivas dos sintetizadores em particular e das várias vertentes da música eletrônica. Alicerçada pelos recursos infinitos oferecidos por vertentes sonoras como a synthwave, o dreampop, o synthpop, a darkwave e o shoegaze, além, claro, de toda multiplicidade de sons que fazem parte do universo da música alternativa em geral.
Eu não sou muito de guardar segredo, portanto, vou logo avisando que tem álbum da FERALKAT programado pra sair em 2023. Esses dois singles são aquela dose grátis pra descarregar toda dopamina necessária pra te deixar alucinado por mais e mais.
Eu já estou me coçando pra ouvir o álbum, o problema vai ser lidar com os efeitos colaterais desse desejo até o lançamento.
Ficha técnica do single:
Letra e Voz: Natasha Durski
Composição instrumental e Produção Musical: Natasha Durski e Matheus Reinert
Participação na Composição: Alyssa Aquino
Mixagem e Masterização: Vivian Kuczynski
Distribuição: Believe Music / Gian Uccello