Etta James – The Dreamer

Quando era pequeno ouvi uma frase que me fez pensar um bocado (apesar da pouca idade), era algo mais ou menos assim: ”as pessoas levam no rosto as cicatrizes da vida”. Se não era exatamente assim, era algo bem próximo e, apesar de ter se passado muito tempo desde que ouvi isso, por algum motivo lembrei deste episódio e tornei a pensar à respeito nos últimos dias, só que desta vez posso discutir este tema utilizando um ponto de vista um pouco diferente, o musical.

Quantos artistas já não colocaram pra fora, por meio de letras, solos de guitarra ou por intermédio de um vozeirão divino, todos os males por qual estavam passando ou já haviam passado? Centenas deles! Chega a emocionar tanto que por alguns instantes você pensa que  o problema é seu! 
E hoje nós vamos abordar um dos grande ícones da música, uma voz que transmitia mensagens de uma maneira pouco antes vista e que só marcou seu nome na indústria após superar uma vida regida por problemas, questões que acabaram moldando praticamente tudo que esta persona produziu para se consagrar como uma das maiores vozes de todo tempos. Senhoras e senhores: Etta James e seu último suspiro, o belo ”The Dreamer” lançado em 2011. 

Track List:
”Groove Me” – King Floyd
”Champagne & Wine” – Otis Redding
”Dreamer” – Bobby Bland
”Welcome To The Jungle” – Guns ‘n’ Roses
”Misty Blue” – Bob Montgomery
”Boondocks” – Little Big Town
”Cigarettes & Coffee” – Otis Redding
”In The Evening” – Ray Charles
”Too Tired” – Johnny ”Guitar” Watson
”That’s The Chance You Take” – Johnny ”Guitar” Watson
”Let Me Down Easy” – Little Milton

Esse disco era pouco provável. Em 2010 Etta foi diagnosticada com Alzheimer e demência, o que foi o começo do fim, com vários shows cancelados, extermínio das aparições em público e etc. Na época que ouvi falar disso, tinha certeza que a americana não iria lançar mais nada, mas 2011 chegou e ela teve a oportunidade de registrar sua pérola final. Tudo num clima tranquilo, feliz, com seus filhos tocando junto, nada conturbado, muito pelo contrário, um cenário quase que inédito dentro da vida turbulenta que a cantora teve.
Apesar do Alzheimer,  Etta parecia não ter esquecido como entoar o Groove. A musa jamais perdeu o balanço, ela sabia os atalhos e aqui percorre todos, com a calma de uma pessoa diferente. Isso não aconteceu pelos males de suas doenças, mas sim pela experiência adquirida durante todo o processo, algo que fica claro desde a primeira faixa, com swing puro de ”Groove Me” até o final, com um revival intenso de toda sua carreira, passando pelo Blues, Jazz e o Funk, caminhos que ao som de sua voz de unem e acabam servindo como subtítulos para um glorioso sumário de momentos sublimes.

Finalizando uma existência que mesmo com tantos obstáculos, nota-se que musicalmente falando foi completa. Quase perfeita e, que ao som de faixas como o cover de Otis Redding em ”Champagne & Wine”, as ponderações da faixa título ou sua bela versão para a radiofônica ”Welcome To The Jungle”, fica claro que apesar de um triste fim, valeu a pena percorrer este turtuoso caminho.

É realmente revigorante ver que mesmo aos 71 anos a cantora aguentou o tranco.  Temas complexos, como ”Misty Blue”, são dismistificados de uma forma quase mundana.  ”Boondocks” é mais uma track que mostra a essência de Etta, a naturalidade de sua música é notável. A requintada ”Cigarettes & Coffee” e a classuda ”In The Evening” mostram isso, sua voz baila com os verbos sem fazer força alguma para conduzir as melodias!

Mesmo que o disco chegue ao seu final com uma pegada mais veloz em ”Too Tired”, ou até mesmo mais cadenciada como em ”That’s The Chance You Take”, o importante aqui é sentir aquela energia de renovação, apesar de estarmos falando sobre seu trabalho derradeiro.

Quando acaba o disco um sentimento estranho toma conto de todos nós. Ninguém se sente triste, muito pelo contrário, me sinto completamente satisfeito quando a coroa pronuncia seu verso final em ”Let Me Down Easy”. Não só por ser um disco ótimo, mas sim por que infelizmente tudo acaba um dia e ela conseguiu encerrar sua música da maneira perfeita, fazendo de tudo, sem deixar aquele vazio que muitos nomes do entretenimento deixaram, não por falta de talento, mas por falta de tempo.

E isso foi valorizado em tudo que carregou seu nome, acredito (inclusive) que seu timbre seja uma justificativa para tudo isso. Uma súplica que além de reunir o melhor dos mais diversos campos musicais, proclamava a solução de problemas, mas sem desejar o fim e sim novos e melhores tempos.

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