O cantor e compositor de jazz José James lançou no dia 20 de janeiro o álbum On & On, um tributo à genial cantora e compositora Erikah Badu.
Um nômade da black music estadunidense
José James vem buscando costurar em sua música elementos do universo jazzístico clássico com diferentes desdobramentos da black music estadunidense. Ponto fora da curva, talvez seja Love in a Time of Madness (2017), álbum no qual o cantor e compositor enfatiza a linguagem do rap contemporâneo, com beats mais pesados e carregados de grave e musicalidade trap.
Podemos defini-lo como um nômade da black musica estadunidense, sempre percorrendo as trilhas deixadas pelos antepassados que por ali deixaram seus rastros. É nesse sentido que ele percorre, através de seus álbuns, em particular aqueles dedicados à obra de um artista específico, as trilhas por eles deixadas.
Lembrando que cada viagem através da trilha desbravadas pelos viajantes originais, carrega consigo suas particularidades. Viajando por diferentes trilhas, abertas por diferentes nomes da história do blues, do jazz, do r&b, da soul music, do funk e do rap com todas as suas diferentes ramificações, foi coletando as especiarias sonoras para temperar suas composições.
E se fez uma trilogia
On & On fecha uma trilogia de tributos prestados pelo cantor e compositor José James. Em 2015 lançou Yesterday I Had The Blues, em homenagem à Billie Holiday, em 2018 Lean On Me, uma homenagem a Bill Withers e fecha essa trilogia com On & On, que rende tributo à diva Erykah Badu.
Inclusive, o próprio título do álbum vem do título do single de mesmo nome que causou o impacto meteórico de Badu na indústria fonográfica na virada do século XX par ao XXI.
Vale ressaltar a participação das jovens sax alto Ebban Dorsey de apenas 18 anos e Diana Dzhabar.
James e sua banda gravaram On & On, a música, em uma tomada. Na mesa de produção James alterou e adicionou elementos, misturando improvisação com produção e não deixando dúvidas de que On & On é uma gravação de jazz.
O piano em cascata, saxes e sinos que iniciam a abertura de “On & On” são arranjadas de forma a construir uma atmosfera de texturas abstratas, uma sonoridade que nos remete à capa e nos faz perceber a homenagem a Alice Coltrane.
O arranjo de James para esta faixa do álbum tem toda a arrogância casual do original; James soa tão à vontade e que está em seu habitat que ele poderia estar se inclinando e balançando o tempo todo.
Vou jogar na sequência a apresentação feita tendo no cast as músicas do álbum. Fiquem atentos às características do arranjo da música On & On que descrevi acima. Acredito que seus contornos fiquem mais perceptíveis ao assistir o vídeo. E claro, atenção à participação da jovem Ebban Dorsey e seu sax alto.
Assistindo a performance da música de abertura, você consegue ter uma concepção geral do tipo de sonoridade que James construiu para o álbum. Não é por acaso que ele escolheu uma música de tamanha importância para a obra de Badu, para abrir e batizar seu álbum.
A banda formada para esse trabalho foi muito bem sucedida em seu desempenho na execução dos arranjos do álbum. Principalmente James, que deve ter se sentido em casa ao preparar os arranjos para músicas impregnadas de influências do jazz e do soul. Ambos os gêneros são o ponto de intersecção entre a música de James e Badu.
Nesse sentido, ouvir James empregar uma linha melódica extremamente jazzística ao cantar uma música intempestiva como Green Eyes, visa ressaltar os contornos de jazz ali presentes.
Lembremos que na versão original de Badu, o arranjo na primeira parte da música se liga muito mais ao jazz carregado de blues da Billie Holiday. Só depois ela vai ganhar diferentes desdobramento ao longo dos seus 10 minutos.
James opta por uma abordagem ao sabor do cool jazz, próximo ao estilo do Chet Baker, para depois dar início a desdobramentos suaves, com temperos eletrônicos e recheado de emoção.
Além da já citada On & On, José James explora outros singles conhecidos de Erykah Badu, tais como Didn´t Cha Know, além de faixas de álbuns amados pelos fãs da cantora como o excelente New Amerykah Part Two (Return of the Ankh) (2010) onde James foi catar a faixa Out My Mind, Just In Time.
Os tons suaves das linhas melódicas cantadas por James se diferenciam dos tons altos de Badu, porém, consegue manter a essência das canções através de seus arranjos e suas interpretações.
Todo álbum que rende tributo a um artista gera narizes torcidos e muita desconfiança. Não tive essa reação com esse novo álbum do José James porque ele mesmo quebrou este meu preconceito com Lean On Me. E certamente, qualquer um que conheça e aprecie a obra da Erykah Badu verá que suas joias musicais foram cuidadosamente manipuladas por José James.