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Entrevista com Igor B., que lançou a versão instrumental do álbum “Se Pah (Mesclânia)”

Igor B.

Em “Se Pah (Masclânia)” Igor B. soltou 9 faixas onde o artista baiano radicado em Brasília mostra um pouco mais do seu eletroindie.

Igor B. é natural de Salvador, onde começou a flertar com a música, ainda no final dos anos 1990, em sua primeira banda com amigos da cidade. A Bunekuloko fazia uma funk-rock cru e pesado e agitava a noite de alguns pubs undergrounds de Salvador. Com o fim da banda e aguçado pela experiência, começou a produzir sons solos e ampliar sua gama de referências musicais.

Os primeiros sons solos foram criados durante sua primeira passagem por Brasília, nos idos anos de 2002. Tempo bom, Brasil campeão, novos ares e muito aprendizado. Em 2005, Igor estava de volta na Bahia, atuando na produção executiva para algumas bandas como a Soteropolitanos, e a banda de reggae Aitay, tendo realizado diversos eventos pela cidade conectando com outros artistas da cena local.

Depois de um hiato de cerca de 10 anos, Igor B. retorna ao mundo da música em 2018. Definitivamente radicado em Brasília, começa a interagir e trocar com uma cena que vem movimentando a cidade. Entre 2019 e 2020 lançou quatro singles que culminaram no EP chamado “Na Batida, No Flow”. Durante o período pesado da pandemia, o artista resolveu estudar e se aprimorar ainda mais. Montou um pequeno Home Studio e segue produzindo e lançando sem parar.

Em “SE PAH (Beat Mesclânea)”, seu álbum de estreia, o artista Igor B. apresentou toda a diversidade do seu eletroindie. Flertando com elementos que vão do Rap ao Pop em beats pulsantes e com textos carregados de mensagens fortes entrecortadas por boas doses de melancolia. O álbum de 9 faixas foi composto e produzido pelo próprio, e lançado nas plataformas digitais em 11 de Março de 2022, pelo selo Mondogroove Records.

Agora, quase exatamente um ano depois, Igor apresenta a versão instrumental do álbum, dando uma ênfase maior na sua musicalidade e no seu trabalho como produtor. Segundo o artista, a música instrumental liberta e expande a imaginação, pois convida o ouvinte a criar novas possíveis letras e melodias vocais. Ao longo das 9 faixas, o álbum instrumental vai do funk americano ao rock, passando por sonoridades pops, indies, jazz, sonoridades afros e latinas, além da música brasileira e, obviamente, o bom e velho hip hop. O compositor e produtor interpreta suas canções, tentando sempre misturar elementos vintage com modernos, elementos eletrônicos com orgânicos numa estética pessoal que ele gosta bastante, entre o dançante e o melancólico, misturando diversos elementos sonoros  e referências do universo que o influencia.

Resolvi trocar uma ideia com o Igor B., pra entender um pouco mais suas influências e saber mais como ele pensa a música que produz e a música que escuta. 

Quando você começou a compor beats? Por que sua história remete aos anos 2000 na música, mas e a produção de beats?

Eu comecei na mesma época. Usava um software chamado Reason e outro chamado HammerHead. Mas era uma época de experimentação e hoje acho que foi tudo muito tosco ainda.

O que rolou durante o hiato e o esse retorno pra música?

Esse hiato foi foda… Eu casei, tive filhos e me envolvi em diversas outras atividades fora da música para sobreviver. Sempre vinha um lampejo, uma ideia, mas eu não dava bola e ignorava. O fato é que com o tempo não aguentava mais não criar, não compor… Foi um vazio muito grande quando fiquei sem mexer com música porque é algo que faz parte da minha existência desde sempre, saca? Retomei quando percebi que a coisa estava se democratizando com as novas tecnologias, softwares, a possibilidade de uma carreira independente e sem qualquer obrigação de almejar ser mainstream. Acho que a tecnologia proporcionou hoje tudo ser mais democrático e acessível na indústria da música.

Quais são suas influências na hora de compor?

Nossa… O Beat é Mesclânea porque são muitas influências. Muitas mesmo! Tem a musica da tropicália e os funks brazuca e gringos dos anos 70. Tem algo do Britsh Rock oitentista do The Smiths e do The Cure e a melancolia que vem de lá. Tem algo do manguebit e aquela abordagem livre e criativa. Tem algo do hip-hop que evoluiu em mim depois do funk-rock como uma linguagem mais falada e ritmos mais sincopados, influenciado por artistas como Beastie Boys. Tem algo muito forte de artistas como Beck, MGMT, Gorillaz e mais recentemente do Tame Impala. Como disse… É muita coisa, muita Mesclânea…

Existe alguma diferença nos beats da versão com letra para a nova versão instrumental do álbum, que você lança agora?!

Não tem diferença. São exatamente os mesmos beats.

O álbum foi todo gravado em home studio? Quais os benefícios e malefícios dessa produção e composição caseira na sua opinião?

Olha, tenho que ser sincero. Hoje é possível fazer muita coisa e produzir um som aceitável em Home Estúdio. Mas à medida que o tempo avança e você vai evoluindo, seu ouvido vai ficando mais exigente. Atualmente, minhas novas produções tem diversas coisas gravadas em estúdios e a finalização da produção também é feita em estúdio. Uso o home mais como um start para criação, captação de voz e pré-produção. Esse álbum é também o final de um ciclo. Uma fase onde eu produzia tudo muito sozinho de ponta a ponta. Hoje já tenho alguns estúdios e produtores parceiros em Brasília e em São Paulo, que trabalham comigo de forma colaborativa e temos alcançado resultados cada vez melhores na produção. Mas acho que o home estúdio é importante para começar o processo e foi muito importante quando decidi retomar o meu projeto artístico porque naquele momento eu precisava evitar custos e ter autonomia para experimentar mais. Isso o home estúdio te dá.

O álbum “Se pah…” mistura vários elementos sonoros e suas cidades, seja a que nasceu (salvador) ou a que vive (Brasília). Quais são as influências e referências da música baiana e quais são as de Brasília?!

Em Salvador eu cresci vendo shows de rock alternativo. Bandas como Dois Sapos e Meio, Lisergia, Inkoma (primeira banda da Pitty), etc. Essa galera já misturava rock com rap com muita influência de artistas como Beastie Boys, por exemplo. Em Brasília eu posso dizer que eu conheci o universo dos DJs, da música eletrônica. Quando vim pra cá a fase do rock oitentista já tinha acabado aqui. Hoje Brasília é a meca dos DJs. Tanto é que tem muito espaço, contratantes, casas. Muito mais que para as bandas de rock, por exemplo. Alok e família são daqui. Eles comandam o Universo Paralelo (evento realizado anualmente em Pratigy-BA), por exemplo.

Tu se considera um artista? Por que?

Sim. Eu sou um artista pela minha necessidade de me conectar com a arte. Não vivo sem criar… Compor letras, canções, beats. Às vezes me arrisco em artes gráficas também. Mas mais do que isso, também consumo arte de diversas formas: música, fotografia, artes gráficas, etc. Gosto do meio, dos assuntos, das histórias por trás das obras. Eu sou incompleto sem arte e sem fazer arte.

Como você vê a atuação do músico ou do artista em um cenário independente tão politizado atualmente?

Acho que a política faz e sempre fez parte. A gente tem que ter opinião e se posicionar sim. Tudo bem que existe essa ditadura de algoritmo que impõe padrões de comportamento, exposição, lacração, mas não é disso que tô falando. Sendo verdadeiro com a sua essência, o artista pode e deve se posicionar na sociedade em que ele vive. Se isso faz parte da sua verdade. Especialmente os artistas independentes que não precisam prestar muita satisfação a uma gravadora, por exemplo.. Mas depende do trabalho que é feito, o público que almeja. Tem gente que faz só entretenimento. Ok, todos fazemos, mas de tantas formas diferentes. Em algumas dessas formas cabem posicionamento político, já em outras talvez não. E ok também. Não é uma obrigação. É uma escolha que precisa fazer parte da sua verdade. As vezes isso pode gerar problemas, como perda de oportunidades, receio em contratantes, mas cada um com as suas verdades e com as suas escolhas, não é mesmo?!

Qual seu objetivo com sua música? Ou como criar um legado no mundo digital cada vez mais volátil?!

Cara… Eu tento não sucumbir a modinhas e criar algo verdadeiramente meu. Original e calcado na minha identidade e nas minhas influências. O desafio aí nesse processo é usar as novas tecnologias para ir construindo um público que se identifique com a sonoridade e com as mensagens que eu trago. Não falo em ser conceitual demais não. Flerto com o pop e não vejo problema em ser acessível para mais gente em alguma medida, desde que eu não esteja me traindo ou às coisas em que acredito, saca?! Enquanto vou fazendo e experimentando, ainda sigo procurando e buscando algo que não encontrei (e nem sei se um dia irei encontrar, pois a busca é que é o gostoso do processo). Tento construir uma marca, uma identidade que  exista para o público que eu conseguir formar, seja ele do tamanho que for, mas que perdure além das modas e, quem sabe, sobrevivam quando eu me for deste plano.

Você tem ídolos? Você quer ser referência?!

Sim. Alguns ídolos. Chico Science foi um deles, Tom Zé, Caetano, Gil, Fagner, Marcelo D2, Criolo, Black Alien, Beck. Eu gostaria de um dia ser referência sim. É um puta reconhecimento para o trabalho. Ser ídolo eu não faço questão. Acho que sou muito falho pra isso.

O que fazer pra ser uma ivete sangalo ou uma Marina Sena (Pra trazer pra um nome mais atual)?!

Não tem fórmula. É uma mistura de música boa, bem produzida e carisma, que chegou num público certo no momento certo, com os recursos certos. Uma conjunção de fatores que vai rolar pra alguns e não vai rolar pra muitos. Mas o fato é que pra rolar tem que se estar na pista. Fazendo um trabalho, lançando, diversificando, construindo identidade, etc.

Recentemente, tu lançou uma versão de “Buraco de Bala”, som do primeiro álbum da banda Eddie. Como se deu a liberação do som e que outros sons você pensa em lançar ou fazer versões?

A liberação foi tranquila porque os direitos estão na mesma distribuidora. Só foi registrar direitinho o fonograma, creditar a obra e os autores, etc. Não quero dar spoiler, mas esse ano ainda vai ter uma versão de uma música de Fagner que foi gravada nos anos 70.

O que você gosta de ouvir que você acha que não tem nada a ver com o som que você produz?

Essa boa… Vão rir de mim, mas eu gosto muito de ouvir Phil Veras, Castello Branco, Cícero, Edgar, Tagore, Glass Animals, Foster The People. São sons que costumo ouvir, mas que não tem nada a ver com o que eu faço. Pelo menos eu acho né?! Me diz aí o que vocês acham.

Em que álbum você queria ter tocado ou com qual artista?

Queria ter feito beats para o Beastie Boys no álbum Il Communication e para o The Prodigy no álbum The Fat Of The Land. Queria ter feito backing vocal no álbum Sea Change de Beck. Queria ter sido roadie no álbum Nó na orelha, que Criolo fez com Ganjaman. Queria ter escrito alguma letras junto com Morrissey no álbum Louder Them Bombs do The Smiths. Queria ter gravado uma feat com Chico Science… Na loucura da minha Mesclânea, eu “sinto vontade de fazer muitas coisas”.

Voltando pro Hip Hop Br. Como você vê essa necessidade de topo do hip hop brasileiro ou mundial?!

Na real acho que é esse tipo de coisa que desgasta uma indústria e banaliza boas ideias. Ao querer ser topo, você subverte a lógica da criação. Foca mais no produto e menos na arte, Mais no que você acredita que o público quer e menos no que você sente a real vontade de fazer. Acho que o exemplo recente bom sobre isso é o do Rashid. Na minha opinião, ele quis tanto que ele se perdeu no seu último álbum. Não falo de números. Falo de passar uma ideia, uma verdade e não de ser um mero produto… Acho que às vezes a vontade de crescer te leva a lugares que você pode se perder de você e acho que esse é o começo do fim. Isso não quer dizer que você não deve procurar crescer, se desafiar, ousar…

Mas isso precisa ser parte da sua verdade mesmo. Precisa fazer algum sentido no todo da sua obra também. Vou além: Precisa ser gradual para as pessoas irem entendendo que é verdadeira e irem se acostumando com outras nuances e camadas da sua própria identidade… O hip-hop tá virando uma indústria de vaidades, Que infelizmente muitas vezes só fala de ostentação, carro, arma, etc. Abriu mão da sua função social de criticar a sociedade, a forma que as pessoas vivem, etc. Muita fórmula clichê, mas tem muita gente foda como Criolo, Djonga e BK por exemplo. Que cresce, mas continua passando uma verdade sinistra…

Você pensa em um novo álbum para 2024. Já existe algum material? Ou alguma ideia ou tema pro trabalho?!

Sim. Vai rolar um novo álbum e já tem muito material em fase final de produção. Pra chegar lá, vou lançar alguns singles pra ir fazendo essa transição dos beats para uma sonoridade mais orgânica. Com mais guitarras presentes. Um peso dançante e ao mesmo tempo melancólico. Letras e líricas mais poéticas. Tô amarradão na direção que estamos indo e fico na esperança de que a galera goste. rs

-Entrevista com Igor B., que lançou a versão instrumental do álbum “Se Pah (Mesclânia)”

Por Diego Pessoa (Hominis Canidae)

 

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