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Entrevistas

Oganpazan entrevista Cintia Savoli

Cintia Savoli certamente é uma das melhores mc’s da nova geração, uma voz que pinta sempre com cores fortes seus sentimentos e ideias. Escondendo muito bem a doçura e o carinho com que lida com todos a sua volta. Uma mulher simples e complexa, cheia de nuances como um jardim. E paradoxalmente todo peso e rebeldia que suas rimas traçam são fruto maduro e bem cuidado dessa outra faceta escondida, e que aparece numa espécie de palavra valise: Bruta flor. Título do seu primeiro e muito bem sucedido disco, conjuga perfeitamente o que acima tentamos em vão explicar.

Uma cantora que possui sólida formação, seja nos aspectos técnicos para a utilização de seu instrumento – a voz – seja nas ideias contestadoras sempre dispostas a problematizar quaisquer que sejam as injustiças. Brasiliense radicada em Salvador encontrou aqui terreno fértil para ingressar de vez na sua vocação aliando-se a outros grandes nomes da cena para que sua arte pudesse repercutir por todo território nacional.

Atuante dentro da cultura e do movimento hip hop, consegue como poucas e poucos aliar teoria e prática, numa militância que vai desde a formação de outras mc’s para a cena até os resgates de manos e minas que se encontram encarcerados. Generosidade que não encontra local onde não queira derramar-se, ela, também professora de música atuante em áreas pobres do nordeste brasileiro. Enfim uma verdadeira guerreira que o hip hop teve a sorte de encontrar, mas que já flertou com o reggae de raiz e que pode a qualquer momento nos surpreender num disco interpretando clássicos do cancioneiro nacional.

Um talento que despontou como uma força da natureza no último ano mas que já entra 2016 num ritmo de trabalho intenso, cheia do cuidado artistico que lhe é peculiar. Batemos um papo com Cintia Savoli sobre seu ano de 2015 e as conquistas que seu excelente trabalho galgaram. Falamos sobre os diversos aspectos que permeiam seu trabalho como educadora, militante e artista da música e do hip hop.

Oganpazan Cintia, 2015 foi o que podemos chamar de um ano especial, onde você estreou o seu primeiro disco. Como você sentiu a repercussão desse trabalho? E como você viu a aceitação do rap nacional com o trabalho de outras meninas?

Cintia Savoli Seguramente o ano de 2015 foi especial para mim e para minha carreira. Depois que lancei o CD comecei a fazer show toda semana e a ser convidada para participar de eventos incríveis em Salvador pra tocar com grandes nomes da cena local e nacional. Esse ano eu toquei em inúmeros eventos em bairros tradicionais aqui, mas fiz questão também de participar de vários eventos os quais fui chamada nas periferias que é de onde o rap vem e de onde ele não deve sair com certeza. Isso foi foda porque passei a conhecer Salvador de fato, e tive um outro olhar sobre a Bahia e sobre os Baianos.

Quanto a aceitação do rap nacional em relação ao trabalho de mulheres creio que estamos ganhando espaço sim, porém não é porque as portas estão se abrindo e sim porque as mulheres estão metendo o pé e derrubando as portas.

O feminismo e a sororidade que estão atualmente em pauta na cena é o que contribui de fato pra que a gente vá conquistando esse espaço. Esse ano de 2015 conheci muitaaaasss mulheres fodas que fazem rap no Brasil.

Oganpazan – Inclusive nessa perspectiva você trabalha junto a outras mulheres num coletivo aqui em Salvador né? Fale um pouco sobre como esse coletivo tem funcionado e como ele funciona para você politica e artisticamente.

Cintia Savoli Sim trabalho com um coletivo de mulheres: o Rima Mina que também surgiu em 2015. O coletivo surgiu na intenção de construirmos um espaço onde as mulheres juntas possam ganhar força dentro da cena hip hop. Pra tanto fizemos oficinas formativas de free style, grafitti, rima e defesa pessoal só pra mulheres. A principio começamos eu, Mirapotira e Sista Katia e logo em seguida convidamos a Dj Nai Sena que fortaleceu enormemente a proposta.

Começamos com palestras sobre a história do hip hop, seus contextos políticos e culturais desde o seu inicio até os dias atuais e depois várias dinâmicas de grupo e oficinas de fato, pra conhecer a teoria e a prática de cada vertente citada. Ao final dessa primeira etapa, produzimos um evento lindíssimo com a primeira batalha de free style só de mulheres da história de Salvador. Onde uma dessas meninas (Janaina Noblat) foi selecionada para participar da liga nacional de Mc’s que ocorrerá em Belo Horizonte. Estamos preparando para 2016 essas mesmas oficinas, porém pretendemos atuar em outros espaços onde nos sentimos necessárias, como no presidio feminino e em casas de recuperação para dependentes químicas.

Oganpazan – E o Rima Mina agora também já possui uma vertente artística né?

Cintia SavoliÉ sim, o coletivo Rima Mina que a principio tinha a intenção de apenas formar mulheres também se transformou num grupo artístico, pois começamos a receber inúmeros convites para nos apresentarmos e aí começamos e tem sido delicioso. Nosso grupo já logo de saída teve a honra de abrir o show de um dos melhores rappers mundiais, Blitz Ambassador, rapper de Gana radicado no Estados Unidos.

Oganpazan Você se apresentou muito fora de Salvador também depois do lançamento do Bruta Flor, né? Chegou inclusive a fazer o lançamento em Brasília e se apresentou num grande festival por lá, conta pra gente como foi isso?

Cintia Savoli – Sim. Eu fiz o pré-lançamento do Cd primeiramente em Brasília e depois lancei aqui em Salvador, porém aqui o lançamento foi dentro do presidio Lafaiete Coutinho onde a comunidade carcerária me abraça em massa. Fora de Salvador tenho feito muitos shows em Brasília, também estive em São Luís do Maranhão, Goiânia e São Paulo.

O festival o qual eu tive o enorme prazer de me apresentar foi em Brasília e se chama Expô Hip Hop. É o maior festival da América Latina e já ocorreu em diversos países, sendo que nesse ano teve sua edição na Ceilândia DF e fomos selecionadas, eu e as minas do Rima Mina, para nos apresentarmos lá. Pra 2016 os convites são para São Paulo, Belo Horizonte, Rio Janeiro e Teresina no Piauí.

Oganpazan – Você que tem uma presença de palco muito forte, como esta sendo vista, como tem sido as reações a Bruta Flor em cima palco? Como é viajar tanto para mostrar seu trabalho em outros locais, você esperava essa enorme repercussão do seu trabalho?

Cintia Savoli – Em outras praças onde não me conhecem, ocorre de as pessoas me olharem e verem uma mulher muito feminina, baixinha, aparentemente frágil, mas quando começo a cantar os olhos se abrem e os celulares são sacados para filmar ou fotografar. Acho que a força que transparece no palco é a mesma que tenho dentro de mim, ali ela esta apenas sendo externalizada. O palco é onde mais me sinto em casa, é o lugar onde posso ser ouvida e posso liberar minha energia contida. Também é onde estou cumprindo minha missão então creio que por isso seja tão intenso. O fato de eu cantar aquilo que vivo e acredito fica explicito em minha presença no palco. É somente minha verdade sendo transparecida. É tudo bem real.

Sim, eu esperava essa repercussão e estava me preparando para isso. Sou do tipo de pessoa que traça uma meta e trabalha para alcança-la. Sou conhecedora do meu talento e também sei que devagar e com muito esforço e ajuda dos que acreditam, ele está sendo lapidado.

Tudo com os pés no chão, pois não me considero uma sonhadora e sim uma realizadora de sonhos. Neste ano em que cantei em outros palcos fora daqui de Salvador, e para públicos diversos, eu tive experiências novas e diferenciadas. Pude cantar para públicos que não eram específicos do rap e em uma ocasião especifica agora em Brasilia cantei num evento onde o público era quase todo de mulheres e homens do crime.  Fiquei pensando se seria bem aceita e quando subi no palco depois da primeira canção o público já urrava. Nesse dia chorei.

Eu sei e tenho certeza de que onde eu for serei abraçada porque estou fazendo aquilo que de fato me move a alma. Quanto à caminhada, sei que a estrada é longa demais. E que ainda tenho muita estrada pra chegar onde quero, mas é só questão de tempo, humildade e dedicação.

Oganpazan – E para 2016, quais são os planos, o que você esta tramando? Ouvi dizer que tem disco novo esse ano, é verdade, se sim, o que podemos esperar nesse novo disco?

Cintia Savoli2016 continuarei intensamente divulgando o cd Bruta Flor em outros estados. Estou com algumas parcerias e farei algumas participações com artistas locais e nacionais  que ainda é surpresa. Mas sai tudo no primeiro semestre porque no final deste primeiro semestre pretendo lançar meu segundo disco que será todo produzido por Diego 157. Vai ser tipo um dueto Savoli & 157, a mc e o beatmaker dialogando de uma forma única e singular nas canções. Espero produzir tudo junto com ele, com amor e cuidado intensos.

O que vocês podem esperar deste cd novo? Rap PESADÂO e militante como sempre. Mas também terão faixas diferenciadas que sei que causarão polêmica. Mas é isso mesmo, eu sou isso. Sem grades nem rótulos, rap de alma e afinal de contas minha alma tem várias facetas. Sou amor e ódio, sou guerra e paz. Já estou trabalhando e pesquisando dia e noite e madrugada, 24 horas nessa missão.

Além disso, estou participando de dois projetos nacionais, que considero muito importantes.

Oganapazan – Tem alguma pergunta que não fizemos e que você gostaria de responder?

Cintia SavoliAhhhh tem sim, eu tenho dois projetos novos para 2016 que com certeza vai andar com muita tranquilidade, os quais não tenho muita pressa pois ainda tenho muita coisa da carreira solo pra tocar. Um dos projetos é só com mulheres do Brasil todo onde tive a honra de ser convidada para participar, chama-se Mente Blindanda. Só mulheres do rap pesado, tipo com a mesma levada que eu. Minas do Paraná, Florianópolis, Santa Catarina, Brasilia, São Paulo, inclusive são as minas da Odisseia das Flores e tem uma menina de Goiania também. Já temos uma música gravada, que esta sendo mixada e masterizada e vai ser lançada por agora, um mês no máximo.

E tem um outro projeto que também é nacional, com um galera de São Paulo, Brasilia e Minas Gerais que é uma coletânea de músicas onde cantamos juntos, todos nós juntos. São sete pessoas e eu sou a única mulher e o nome do grupo é Revide. Vamos lançar essa coletânea no Brasil todo.

E por último recebi um convite pra tocar no Tocantins, e os caras falaram que a galera lá ouve muito os meus raps. Vou voltar esse ano a fazer os eventos nos presídios, fui chamada para fazer os eventos com o Nova Era na Lemos de Brito, mas quero ir na Lafayete Coutinho também. Estamos armando umas oficinas e o show de Cintia Savoli.

O Cd físico do disco Bruta Flor já pode ser comprado com a artista, é só mandar um salve na página dela. Lembrando que estamos falando de uma artista independente e a venda dos Cd’s fortalencem novas produções então se você curte o trabalho dela, ou se quer conhecer uma excelente mc, mete mão.

Confira o novo single da Bruta Flor Cintia Savoli.

 

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