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Davzera chapa o ouvinte com sua Cozinha Marginal e além!

Davzera

O MC e beatmaker baiano Davzera soltou o EP Cozinha Marginal e uma parceria chapadíssima com um bonde do sul do país!

“Mas tem uns caras florescendo gravatas, e apesar da ressaca tô tipo um samurai fi da desgraça, cortando cotoco dos pilantras com a espada e assistindo saidinhas bancárias.” 

Escutamos Davzera desde que o mesmo passou a divulgar suas produções nas rede mundial de computadores, e desde lá a chapação sempre foi garantida. Em uma de suas faixas do começo da carreira: “A Tribo”, o MC produz uma visão pouco comum que tem o filme Apocalipse Now do cineasta Francis Ford Coppola como referência:

Avisa que os menor tão sem os livro, tão com o ouro das veia, com maldade nos rifles, no alto das favelas, tão com um bolo de notas, tão sem nada a tempo, atirando pra cima, comemorando mortes, no alto dos barracos, com binóculos cheque, tão que tão de quebrada, tão de kunk prensada, na ilha abandonada, Apocalipse Now, a tribo ei, com uns rifles no coldre, as corrente pesada, tão queimando umas carnes, brincando de ciranda, tipo os Reis do Deserto!”

Uma visão crítica com forte acento ácido, tudo isso em um flow que foi chamado de tedioso por um crítico de música. Um cenário, um retrato apresentado aqui pelo poeta é de uma construção fora do comum que coloca no hip-hop referências ao surrealismo nacional dignos de um Roberto Piva. Imagens poéticas que não podem desprezadas por quem se pretende amante do rap nacional. Uma denúncia que reúne o absurdo da existência diaspórica com imagens que se bem refletidas nos ajudam a pensar sobre o contexto em que vivemos. 

A obra de Davzera é de uma chapação das mais realistas possíveis, são barras que desde sempre buscam extrapolar as portas da percepção comuns ao público do rap. Muitas vezes construídas por moralismos, por visões ocidentalizadas de problemas que estão em suas origens para além dessa visão de sociedade em que estamos afundados. Barras que muitas vezes nos faz rir e ao mesmo tempo tomar consciência de sua intenção política e social, através de uma estética firme em suas intenções com uma estilística totalmente própria!

“De rolê na city, cozinhando clássicos no plano astral”

Foto por Maycon Cavalcante

É possível dizer ouvindo as músicas de Davzera que o humor é talvez uma das melhores e maiores características de seu trabalho, não é possível ouvir suas críticas ácidas sem rir, porém um riso que nos faz entender o severo. Imagens como: “Guilherme meu filho fecha essa porta, os Cops ganham mal, você precisa ver o contracheque dos caras, fazendo bicos, extraindo arcadas dentárias!” ou adlibs como: “Tonhão Wear”, são exemplos da seriedade desse humor, que não possui par no rap nacional. Não é possível não entender que o MC constrói rimas para bater no fundo de nossos cérebros e lá dentro nos fazer pensar.

O fato pra você que não teve o prazer até então de encontrar a obra de Davi Nadier, que outrora foi conhecido como Beirando Teto, e que hoje assina como Davzera é que estamos diante de um MC, de um beatmaker que é sempre novo naquilo que se propõem. Esse novo se mantém ao longo de seus singles e mais recentemente dos discos como uma forma constante de impulso contra cultural, que são as origens do hip-hop. Negociando temas como violência e o despertar existencial para fora dos costumes e práticas que a indústria cultural e a sociedade nos empurra.

Sua arte no hip-hop é contagiante no sentido de levar o ouvinte em busca de si mesmo, de algo que não tinha percebido. Rindo de si mesmo, dos absurdos que se naturaliza ou prestando atenção àquilo que não se dava a necessária atenção. As faixas de Davzera tem ido sempre nessa fronteira tênue da autocrítica. E dois de seus trabalhos recentes nos levam além!   

Sobre o flow tedioso que Davzera apresenta, devemos concordar mas apenas com a condição de entendermos que esse tédio é o contraponto musical de uma série de linhas que trabalham no nível da explosão de sentidos. Uma questão que nos aparece nesse sentido é a questão da alimentação, da seleção de um cardápio todo próprio, que o masterchef do underground, tem pincelado ao longo de seu trabalho, em faixas como “ravioli de pasto”, por exemplo. 

Não são meras analogias ou metáforas, antes é preciso compreender que a obra de Davzera é esse cardápio – pique a “Rimaria” da qual Matéria Prima falou – preparado como uma seleção da alta cozinha do que o rap pode ofertar em termos de ritmo e poesia. Já faz um tempo que o trabalho de Davzera é único dentro do mercado do rap nacional, e suas rimas alimentam os espíritos inconformados. Inclusive se você não ouviu Low Carb (2020), não está bem alimentado!

“Criado na batucada, rimas e beats cozinhados com esmero!”  

Em “Cozinha Marginal” trampo que terminou de ser realizado esse ano, pelo menos na entrega do spotify, Davzera fala de batucada, em um beat do Apolo 808 (responsável também pela mix e a master do trampo), com um andamento leve e mais lento. A faixa funciona do mesmo modo que uma escola de samba junino em seu cérebro, com uma poética que traz outras vivências para a música. Uma “Maratona” das quais não desconfiamos do percurso existencial mas que ainda assim preparou o poeta e nos encanta!

A ambientação de “Viet” fala por si mesma e a lírica empregada na música segue um caminho leve, quase nos fazendo flutuar. Com um flow e uma entrega que nos leva a desfazer-nos de concepções materialistas ao mesmo tempo em que nos coloca na indecisão sobre o como chegar nesse rolê. É o passe dos poetas que viram a cara e nos deixam com a realidade para lidar, com a bola na frente do gol aberto… MSW é o responsável por esse beat classudo, quase etéreo. 

Sem tropeços, a cozinha segue ofertando pratos muito bem preparados. Aqui de nossa parte, eu me recuso a pensar em um trampo que o Davzera lance e que não bata um brilho, como em “Ma Prince 2”, pelo simples fato de que após mais de 33 singles seus trabalhos cheios seguem a linha da invenção. 

Outra questão importante é que Davzera nunca tá de verdade chapado, está sempre atento, sempre certeiro em suas ideias, com uma lucidez aterradora. “Escort Lagoa” é outra porrada em nossa pineal, falando de formas diferentes sobre o mesmo que lhe é caro: “engrandecimento espiritual”, com uma urgência que lhe é toda própria. A faixa tem participação de Bãovivão e o beat é do MNC Beatz. Bãovivão rima pesado e entrega referências a Rudyard Kipling, como protetor dos garotos selvagens, o flow Bagera!

Dois dos maiores MC’s do país estão da faixa “Orixá de Cabeça”, onde o Davzera encontra um Eloy Polêmico pesado pra caralho mandando a real sobre as trairagens e deixando escuro quem são seus aliados no beat do sempre certeiro Eric Beatz. Nessa parceria o MC baiano que já colaborou com o Rancho Mont Gomer, não deixa baixo e segue firme na ancestralidade, no churrasquinho e no silêncio. 

O Big Alien segue os trabalhos sob as “Luzes de Fortal”, sobre a vida na rua pelas noites, os apertos e o desejo de conquistas, a caminhada não foi em vão, rimando de um forma visceral… com o Davzera respondendo em um beat de sua lavra, leão na savana jogando fácil! Um trabalho que cresce a cada audição e não apenas por ouvirmos o Mc e jogarmos pro universo, Um sambinha faz a passagem com “Batucada Interlúdio” e conseguimos ver o tanto que esse MC pode em termos de musicalidade!

A faixa que fecha o trabalho é forte de um jeito que nos empolga – quem ama o boombap royal salute tá ligado – e fecha numa rapidez estonteante, o beat é do Pedrvso! Davzera jogador fino no baba, ouvindo bossanova – música cafona por definição – consegue nos fazer curtir isso com sample ou simplesmente citando…Neste trampo solo, o MC baiano segue nos mostrando porque vale sempre a pena seguir seus lançamentos 

“Espadas fincadas e seguimos!”  

Três músicas que precisam ser faladas aqui… O passeio do Davzera pelo sul do Brasil deixou registros fundamentais do que hoje é feito em termos de boombap nacional underground. Junto a Brasileiro e Bãovivão saiu uma trinca de faixas que esse povo que reclama de falta de under boombap não pode reclamar.. Também não sabemos o contexto dessa construção mas que ela fortalece o corre, é certo!

O que o vídeo da faixa “Cavalo Joker” nos deixa ver é uma correria, uma vivência na base com os aditivos necessários para o corre ser feito de modo irrepreensível como foi apresentado na música. Rapaziada numa comunhão bacana em ruas, praias e no quintal apresentando suas visões espirituais e no tanto que é necessário para fazer acontecer. Este “Cavalo Tape!” do qual sabemos pouco mas que não deixamos de admirar à distância vale pela corrida .

Davzera segue apresentando sempre excelentes trabalhos… Muito além do hype. 

-Davzera chapa o ouvinte com sua Cozinha Marginal e além!

Por Danilo Cruz 

 

 

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