Crappy Jazz lança Véspera (2018) E traz um Noise Rock Groovado… em seu álbum de estreia, o duo apresenta composições com barulho e groove!!
Com um trabalho cheio de boas ideias, e que foi sendo composto aos poucos, desde a sua fundação em 2015, o Crappy Jazz lançou um bem acabado disco de estreia. Véspera (2018) foi lançado nas plataformas digitais no dia 25/07 com distribuição digital pela Tratore. O Crappy Jazz, trata-se de um duo formado por Yuri Muller (bateria, vocal, percussão e piano) e Silva Leonel (baixo, backing vocal, percussão e ruídos), e obviamente essa formação negocia para a produção de um som bastante singular.
Duos no rock, se não são algo inédito e nem recente no Brasil possuem pouca tradição, algo que vem aumentando nas últimas décadas. Pra quem se interessar em pesquisar, recomendamos os sergipanos do Lacertae e do The Baggios (hoje um trio), mas também os caras do Muñoz, são excelentes pedidas.
Em geral, o que vemos é a dupla guitarra e bateria como formação hegemônica nos duos, mas o Crappy Jazz aposta no par baixo e bateria, o que traz um sabor diferente e especial ao som dos caras. Dando-lhes talvez a necessidade de buscar um trabalho inventivo maior pra preencher o som da dupla, mas algo que os rapazes enfrentam com muita criatividade. E pode ter certeza que você não sentirá falta de guitarra alguma, da mesma forma que não sente, ao ouvir o Morphine.
Musicalmente singular, mas também visualmente intrigante a capa do disco já traz a inquietação como um primeiro impacto. Produzida pelo artista gráfico norte-americano Jesse Draxler que já trabalhou com Kendrick Lamar e com a banda Deafheaven. A capa de Vespera (2018) traz um trabalho visual que é “uma expressão como se fosse o resultado de todas as músicas do disco tocadas ao mesmo tempo na mente de uma pessoa, onde ela consegue visualizar algo cada vez que “olha” (escuta) esses pensamentos (letras) tendo, assim, suas interpretações. “Um conflito entre o ouvinte e o som”, resume Yuri.
Essa descrição feita pelo Yuri sobre o trabalho visual e sua correlação com a música do Crappy Jazz, certamente não foge da realidade que se instalará no ouvinte do disco. O som presente nas 11 faixas do álbum, coordenados pelo dueto de baixo e bateira/percussão, vai aos poucos através das audições que fazemos criando um estranho caleidoscópio.
Discos de estreia são difíceis, pois apresentam a missão de trazer ao público a primeira experiência de gravação de uma banda. E para tal missão, diversos fatores concorrem para que uma banda que nos propõem uma linguagem bastante diferente do comum, consiga realizar com sucesso essa tarefa que se torna mais árdua! Ao não se restringir numa formação habitual, necessariamente esses artistas estão soltos na corda bamba da criação, pois não possuem referenciais firmes para desenvolver seu som em estúdio, não possuem precedentes sólidos. Prova disso é que as bandas que citamos, sejam os duos nacionais, seja o Morphine, não estão nem de perto próximas ao som feito pelo Crappy Jazz.
No entanto, o duo de Londrina no Paraná, enfrenta o desafio com dignidade e sem apelar pra formulas mais fáceis, sempre levando uma música atrás da outra por caminhos que nos surpreendem. Talvez fosse mais “esperto” trazer composições em inglês e assim mirar num exotismo dentro do mercado internacional.
Não, os caras apresentam boas composições e todas em português, o que produz no ouvinte uma proximidade maior com a banda, fazendo com que a apreciação do seu som esquisito comece a ser mais palatável. As letras de alguma forma nos serve aqui de âncora, nos guiando pelos estranhos territórios sonoros e nos prendendo no chão entre essas construções caleidoscópicas, musicalmente falando, a que o álbum nos insere.
Junto a isso, acrescente-se as mudanças de andamento, os riffs de baixo distorcido, a bateria e a percussão propondo ritmos e teremos uma ideia pálida do som do Crappy Jazz. O fato real é que descrevê-los como noise rock é uma verdade pela metade, pois a prevalência de baixo e bateria os faz soarem dançantes em diversos momentos. E aí é que se compõe, de algum modo ao nosso ver, esse som caleidoscópico. Ou uma especie de sentido profundo presente em Véspera (2018).
Os vocais vão do canto em dupla ao gutural com uma rapidez e naturalidade que é o espelho das viradas de andamento e inserção de ritmos ao longo das músicas. Todas essas variações musicais, constroem o território, o espaço musical para letras que em geral tratam de problemas mentais, desespero, relacionamentos tóxicos, má sorte e disputas escrotas, enfim, inadequações diante da vida.
Yuri Muller e Silva Leonel despejam um groove embebido em fúria para fazer par as insatisfações contidas nas letras. E nesse sentido, o noise e o groove fazem de certo modo o papel de yin e yang na construção musical dos caras. Quando lhes falta a razão ou quando esta se encontra ameaçada, é o balanço e o ritmo quem lhes serve de cama elástica para lhes jogar de volta a corda bamba da criação.
O curto pianinho inserido entre o fim de “Ruínas” e o começo de “Nova Queda” nos parece uma especie de mensagem subliminar musical querendo nos dizer que a melancolia não é aquilo que os caras vão cultuar em sua música. Preferindo isso sim, dançar na beira do abismo olhando pro outro lado, rumo a outra música, outro balanço.
O Crappy Jazz estreia com um bom disco que é sólida prova, mais uma, diante da quantidade absurda de lançamentos de norte a sul do país, de que possuimos uma geração rockeira inquieta.
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