A Trindade é um projeto fantástico que reúne grandes nomes do RAP BA e tem soltado singles potentes, sempre trazendo um convidado nível hard
Imagino que para quem não tem um conhecimento mais profundo da cena de rap e da força da cultura hip hop no estado da Bahia, encontrar certos trabalhos que emanam nesse imenso país deve ser uma delícia. E recentemente – há quase um ano – foi a vez de surgir um supergrupo no rap BA. Pra quem não sabe, os supergrupos são digamos uma tradição no rock, onde artistas de grande vulto do gênero se reunem para produzir um projeto paralelo. E a Trindade é exatamente isso.
Os grandes pioneiros Lazaro Erê e Rone DumDum (Opanijé), junto ao hermano Ramon Velasquez (Turma do Bairro) se juntaram ao afiadíssimo Aquahertz e formaram a Trindade. Esse projeto tem produzido singles e lançado os mesmos com audivisuais muito bem produzidos, sempre trazendo um convidado de peso. Sendo assim, e aproveitando o último super lançamento deles, reunimos aqui todos os quatro singles (fases) do projeto e vamos desfia-los pra vocês. Simbora…
1º Fase
Uma espécie de manifesto sonoro inicial, Trindade é a apresentação dos caras, e apesar de não contar com feat, traz May Pitanga com uma guitarrinha bagaceira. Swingera nervosa no beat da Aquahertz e incisiva linhas, a tríade varia flows com técnica apuradissíma, enquanto escurece toda a malandragem “negoveia” made in Salcity. Esse primeiro lançamento já nos dava uma mostra do que viria daí pra frente…
2º Fase
Pioneiros muitas vezes fundam um nicho, local, território e ali se fixam, o que não é o caso aqui, a Trindade em sua segunda fase fez uma conexão com o Mano Teko, figura ímpar do Funk carioca. “Minha Conduta” traz uma produção da Aquahertz numa chave pop, mesclando funk e pagodão no beat onde os caras desfiam e montam as suas linhas com muita qualidade, mostrando que jogam muito fácil, seja no campo do Lasca ou no Maracanã.
Muita história reunida, e certamente uma postura que faz com que as condutas (o ethos) que os juntaram numa mesma faixa tornem essa uma música representativa e ao mesmo tempo inaugural de possibilidades politicas e estéticas.
3º Fase
Se você notou direitinho, deve ter percebido que estamos diante de uma reunião de singles em audiovisual que possuem uma estratégia conceitual, notadamente na sonoridade. Há um apelo dançante nas músicas, existe um diálogo nos beats com o pagodão, como antes houve com o funk. E essa ideia está de pleno acordo com o “Teor” de nossa cultura. Como o próprio Opanijé já cantava em um dos clássicos do grupo: “só acredito num deus que dança“.
Esse teor está ao mesmo tempo e exatamente por ser o que é: africano em sua origem, ao lado do terror que o estado genocida implementa em Salcity (em todo país). O convidado dessa vez, é o Fernandez que tem um trabalho que já transitou pelo pagodão baiano e pelo rap. É nesse equilíbrio entre o teor dos nossos tambores, e no auto reconhecimento da nossa herança africana que a Trindade segue, groovando nas denúncias e ideias!
4º Fase
Último lançaento da Trindade, “Tipo Vandal” é mais uma pedrada que dessa vez fez conexão com Dieguito Reis (Vivendo do Ócio), baiano que está morando em São Paulo com sua banda, mas que é minino da cidade baixa e tem nos últimos tempos produzido no rap, também. Faixa que localiza os caras naquela pegada que foi produzida e enunciada pelo rapper baiano Vandal em seu hit Ballah Eh Fogoh mas que é uma caracteristica do rap BA como um todo.
Numa produção pesada, as ideias abordam questões politicas que se apresentam em chave crítica à atual situação da nossa macro política e ao mesmo tempo abordando as questões raciais. Lotada de punchlines pesadissimas, a faixa encerra a quarta fase com aquele gostinho de queremos um trampo maior, EP, mixtape, disco.
O fato é que esse supergrupo tem apresentado um trabalho de muita qualidade e aceitamos o que vier de lá pra cá. Sigam a Trindade que o teor é sempre esse…