Cidade Chumbo – Pílulas Diárias de Insurgência (2019)

Cidade Chumbo – Pílulas Diárias de Insurgência (2019) Segundo EP da banda carioca vem nos servir um pharmakon mais do que necessário hoje!!!

Cidade Chumbo 2

As seis músicas presentes em Pílulas Diárias de Insurgência (2019), segundo EP da banda carioca Cidade Chumbo, entregam com muita qualidade aquilo que prometem. Papo reto com ideias simples e boas construções na chave punkrock hardcore, os caras não estão em busca de serem reconhecidos como gênios vanguardistas. A intenção flagrantes das seis músicas presentes neste segundo excelente passo da banda, permanece sendo a mesma.

Punk rock hardcore nervoso, experiente, agressivo, o Cidade Chumbo segue sua marcha sonora com muita expertise e você precisa ouvir o som dos caras, mas sobretudo pensar no que está ouvindo.

Cavalgando velozmente e com muita força nas cadências, a música dessa banda é para a mais pura e completa insurgência contra o caos patético que se instaurou no país. O som produzido pela Cidade Chumbo é um chamado ao enfrentamento, por parte de todos os cidadãos que reconhecem a distopia em que vivemos. A genialidade dos caras está exatamente no fato de nos alertar para o cenário de crueldade patética que estamos vivendo, em ritmo de reality show, com laranjais, com milícia, com tudo e via twitter.

A música que abre o EP, “Andróides e Vanguardas“, vai bastante nesse sentido acima mencionado. Nos fazendo pensar em quanto essa velocidade trágica que presenciamos, ao mesmo tempo tem ressaltado apenas a nossa imobilidade, nossa falta de potência. Um futuro distópico dado no aqui e agora, nos assaltando sem que demonstremos capacidade de reação, uma excelente abertura e contextualização.

Na sequência, cabe perfeitamente essa reflexão saudosa de um tempo vivido, em “Sociedade Secreta” fica-nos a certeza de que esses caras não vivem de passado. Nesse caso, a letra apenas explicíta o que a música já o fazia, o som e a fúria dessa banda nascida em meio as manifestações de 2015 que agitaram o país, congrega cabeças caras do underground carioca.

Cidade ChumboCaras que seguem nesse espírito rebelde, hoje o Cidade Chumbo é formado por Vital (Jason/ Poindexter) com seu excelente vocal, Alexandre Bolinho (Kopos Sujos) na guitarra metendo os riffs nervosos, Alex Mostarda (Anarchy Solid Sound) no baixo pesado e Rodrigo Barba (Los Hermanos) espancando o kit. Os caras tem feito música de combate desde de seu EP de estreia, o Cidade Chumbo (2017).

Reflexões sobre o coletivo e sobre o individual, relações consigo mesmo, com os outros e com a sociedade atravessam as seis músicas que encontram uma urgência sonora e temática ancorada no atual, mas também em reflexões osbre a passagem do tempo. Se construíndo com um sentido bastante claro de contextualização dos problemas que vivemos, reflexões de ordem mais pessoal numa chave onde a memória serve-lhes para autocriticas e pensamentos sobre a ética e conclui com o chamado a reação política, pelo bem comum. 

Em “Auto-Ajuda” há uma boa amostra de como todos nós estamos implicados no desenrolar dos fatos que hoje nos atacam. Todos os micro fascismos que deixávamos/deixamos passar batido no dia a dia, se naturalizam/naturalizaram em nossa sociedade e a sua emergência não deveria nos espantar. Nós sempre vimos amigos (ou mesmo parentes) fazerem piadas machistas, racistas, homofóbicas, e outras amostras da lama que por vezes deixamos atravessar as nossas possibilidades de micro contenções. E obviamente isso agora, quer nos soterrar, tem nos soterrado.

Punk Rock atitude é também aprofundar as idéias politicas e sobretudo não se utilizar apenas de palavras de ordem e chavões clichês! Em “Anos 90“, uma das músicas mais fodas do EP, voltamos ou antes, seguimos nessa reflexão sobre o tempo passado, as vivências de outras décadas, coisa que esses jovens senhores possuem de montão. A decadência que toma a existência de alguns, que entendem que envelhecer é um passaporte pra se tornar um imbecil, um cuzão reaça.

Nas últimas duas músicas, o ritmo vai ficando mais e mais agressivo e saindo da esfera da micropolítica para a busca de um agenciamento capaz de transformar essa realidade estúpida e a cada dia mais cruel em que estamos imersos. “Pílulas Diarias de Insurgência“, música que nomeia o EP, é uma convocação à mobilização das pessoas que já conseguem ler a nossa atual situação, mas que por algum motivo não se encontram ainda em marcha. E a música não se pretende nada menos que o título propõem, um pharmakon  rebelde capaz de colocar nossas rodas revolucionárias em marcha.

E fechando o EP, um outro alento em forma punk, “Nada A Temer“, que busca na força coletiva a potência capaz de vencer o medo, os adoecimentos, a paralisia, a insenção inconsequente. Todas as práticas que tem paralisado aqueles que não conseguem aceitar os movimentos políticos que foram perpetrados desde o golpe parlamentar aplicado na presidente Dilma em 2015.

Com toda certeza, Pílulas Diárias de Insurgência (2019) é um EP que vai além da mera convocação a uma rebeldia juvenil. Analisando mais detidamente o disco, as seis faixas produzem um processo hermenêutico que dentro de seu espaço sonoro e poético consegue e bem, nos mostrar o quanto estamos a viver numa distopia galopante, o quanto nós que hoje muitas vezes nos dizemos assustados diante da barbárie social e da ausência das instituições democráticas, deveríamos ter feito essas leituras muito antes, enquanto sociedade. Agora, só nos resta lutar, só nos resta insurgir! 

Essas pílulas podem ser tomadas a qualquer hora, e não possuem contra indicação.

 

 

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