Nas vielas de Londres: 5 cinco discos fundamentais para você conhecer a atual cena Jazz de UK.
Londres está no radar novamente, e dessa vez o motivo não é o Brexit. O groove, senhoras e senhores – mais especificamente o Jazz – é a razão pela qual a cena do Reino Unido está dando o que falar nos últimos anos.
Liderada por nomes como o do clarinetista e saxofonista Shabaka Hutchings, o cenário se mostra cada vez mais efervescente e engloba desde o Fusion até o Afrobeat, sem precisar virar a esquina. Rola Jazz Funk na flauta do Tenderlonious, Spiritual Jazz com o Maisha e grandes ideias flutuando no teclado do Kamaal Williams.
O som vai de Barbados até metrô de Londres numa caravana que mistura um repertório sonoro muito amplo e versátil. É uma galera muito jovem, mas com habilidades técnicas prodigiosas e uma visão muito interessante quanto a exploração e o futuro do Jazz, sem esse papinho de família Marsalis.
Seja ele com elementos eletrônicos ou ao orgânicos, o som está acontecendo. Do underground ao mainstream, os grupos se misturam numa renascença moderna muito interessante e que será dissecada nessa série de postagens. A ideia é ligar os pontos e apresentar um celeiro muito interessante para o futuro do groove.
1) Yussef Kamaal – Black Focus (2016)
Lançado pela Brosnwood Recordings, “Black Focus” é uma espécie de marco zero para a cena Jazz de UK. Primeiro e único disco fruto da união do baterista Yussef Dayes e o tecladista Kamaal Williams, o Jazz do duo promove um encontro desafiador entre o Fusion e o groove.
Com intrincadas linhas de bateria, Yussef Dayes oferece um plano de fundo rico para que Kamaal Williams explore timbres e texturas delirantes no sintetizador. Infelizmente esse trabalho foi o único que a dupla gravou, já que o projeto foi interrompido por divergências musicais. Vale lembrar que apesar do grande sucesso do disco e uma tour marcada – com alguns shows já esgotados – os músicos apostaram em novos projetos.
Esses 2 definitivamente ajudaram a definir o som que hoje ganha a atenção dos maiores festivais do mundo e eu não descartaria uma volta. A conexão musical é claro e o resultado impressiona pela criatividade, pela capacidade técnica e mostra uma abordagem original, capaz de sintetizar do que rola na cena como um todo. O encontro das influências africanas do Yussef Dayes com o fraseado malandro e criado no Drum & Bass do Kamaal Williams… É um som desafiador.
2) Kamaal Williams – The Return
Logo depois que o Kamaal Williams encerrou as atividades, Yussef Dayes e Kamaal Williams foram explorar. O primeiro formou seu quarteto e passou o ano de 2017 viajando o mundo – inclusive com escala em São Paulo – enquanto o outro partiu em carreira solo.
Vale lembrar que antes de trabalhar com o baterista, o também produtor utilizava a batuta de Henry Wu em suas aspirações com música eletrônica, mas com o advento de seu selo, a Black Focus Records, ele já aproveitou e solidificou seu nome com um dos melhores discos do ano.
Lançado no dia 25 de maio de 2018, o disco chega com climas de teclado que remetem à abordagem do “Black Focus”, mas que já evidenciam outra faceta por parte do tecladista. Sua perícia e seu nato feeling ficam claros a cada riff e a tenacidade na escolha dos timbres evidenciam seu bom gosto e o belo trabalho de acompanhamento dos músicos envolvidos na sessão.
O trabalho de produção é de altíssimo nível e se fosse possível escolher apenas uma palavra para descrever tudo isso, acredito cremoso “cremoso” seja um bom adjetivo.
3) Mansur Brown – Shiroi
O guitarrista Mansur Brown é o elo entre o Yussef Dayes e o Kamaal Williams. Desde a época do “Black Focus” – vale lembrar que ele colaborou em algumas faixas – até depois do fim do projeto, Mansur segue gravando e viajando com os 2 ao mesmo tempo, tudo enquanto orquestra e promove a sua própria carreira solo.
Depois de aparecer para o cenário em 2016 no Triforce – ao lado de um quarteto que promovia um belo híbrido de Jazz Funk e Fusion – o prodígio de 22 anos aproveitou a recente abertura da Black Focus Records para já emplacar a sua estréia solo. “Shiroi”, lançado no dia 28 de setembro de 2018, o disco chega com uma guitarra capaz de colocar o Eddie Hazel e batidas com influência de Trap, tudo sob o mesmo teto.
É tão desafiador quanto parece. A guitarra de Mansur é dona de um som distinto. Um blend entre técnica e feeling, seu som se perde em texturas com a mesma facilidade com a qual entra em vertiginosos solos. Tocando baixo e guitarra, o guitarrista também foi responsável pela criação das bases que envolvem cada um dos temas e, take após take, revela um timbre belíssimo, enquanto promove um improvável encontro. A guitarra do malandro é um sopro de ar fresco.
4) Nubya Garcia – Nubya’s 5ive
Primeiro disco solo da saxofonista Nubya Garcia, “Nubya’s 5ive” mostra um Jazz açucarada. Cheio de cor e sabor, as influências caribenhas da musicista dão outro tom para num instrumental bastante rítmico e melódica.
Repleto de swing, vale ressaltar o trabalho do tecladista Joe Armon-Jones e a bateria de Femi Koleoso. Os caras são peça chave nessa dinâmica e o som de sax da Nubya é bastante interessante. Não apenas por seu background sonoro riquíssimo, mas também por suas colaborações ao lado de outras bandas da cena – como o já citado Maisha – sua lírica está sempre à serviço da cena e ela pode ser vista tocando flauta ou no meio de uma jam desafiando a tuba de Theon Cross.
Nubya é uma das workaholics de maior sucesso no cenário e é importante salientar o protagonismo feminino na cena, mas isso será comentado durante as próximas edições desse dossiê. Ah, um conselho: antes de apertar play disco, saiba que você passará algumas horas sem sair da primeira faixa… “Lost Kingdoms” é um tema exuberante e que consegue sintetizar a proposta da rapaziada.
5) Maisha – There Is a Place
Como já foi citado em duas oportunidades durante esse texto, o Maisha é mais um grupo da cena Jazz de UK. Com um approach raro em tempos atuais, o sexteto formado por Jake Long aposta num som com claras influências do que foi lançado – principalmente pela IMPULSE! nos anos 60 e 70 – mas com uma roupagem bastante moderna e exótica, cortesia dessa nova geração.
É um trabalho de fato impressionante, com composições audaciosas e que conseguem construir um verdadeiro universo nos ouvidos do ouvinte. Formado por nomes chave da cena como o líder do grupo (o já mencionado baterista do grupo, Jake Long) e a Nubya Garcia, o som mostra novas possibilidades para uma das escolas mais desafiadoras do Jazz.
Esse é um ponto em comum dentro de cada um dos trabalhos citados aqui. Todos os eles agregam algo de novo e moderno no som. É uma declaração vívida sobre o significado de ser artista… Existe uma inquietação no ar e resultado final passa longe do revisionismo.
– Por Dentro da Cena Jazz de UK: Top 5 – Parte 1
Por Guilherme Espir