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Os 30 anos de ‘Brasil’ dos Ratos de Porão

Brasil dos Ratos de Porão completa 30 anos e não poderia faltar uma resenha completa dessa obra prima do hardcore.

O Ratos de Porão é uma clássica banda de hardcore brasileira, fundada no início da década de 80 em meio a gangs punk paulistana e muita maloqueragem, pouco a pouco, em termos de sonoridade foram se distanciando do punk e estreitando laços com o metal, mais especificamente o thrash metal, fazendo um som que costumeiramente é denominado de crossover.

Em 1989 o Ratos de Porão lança seu quarto álbum de estúdio, o “Brasil”. Este álbum marca o cruzamento da fronteira do hardcore para o crossover, sendo o primeiro álbum mais puxado para o metal do grupo.

“Brasil” foi lançado pela Eldorado e pela Roadrunner Records, tendo sido distribuído em duas versões, Português e Inglês, o que facilitou a ampla divulgação da banda nos EUA e principalmente na Europa. Definitivamente o “Brasil” tornou-se um dos álbuns mais clássicos do Ratos.

Versão Português:

Versão Inglês

https://www.youtube.com/watch?v=cfp44vfO1Kc

A formação do Ratos de Porão para o “Brasil” foi: João Gordo (Vocal), Jão (Guitarra), Jabá (Baixo) e o Spaghetti na bateria. 30 anos depois mantém-se no Ratos de Porão João Gordo e Jão.

Contexto Político na época do lançamento do “Brasil”

O país havia acabo de sair de um regime ditatorial. Em verdade as primeiras eleições pós regime deram-se em 85, com a vitória de Tancredo Neves, que faleceu dando espaço para José Sarney assumisse a presidência do país,

“Brasil” foi lançado em ano de eleições presidenciais, onde figuravam nas cabeças Collor e Lula, ambos nordestinos porém com um abismo de diferença em suas pautas políticas. Contudo sua composição deu-se anteriormente, ainda sob a presidência de Sarney que quando assumiu, e a cortina de fumaça que mascarava o mar de merda que o regime militar havia afundado o Brasil, não apenas em termos de Direitos Humanos, mas economicamente falando, tentou regularizar a economia do país com dois pacotes econômicos, extremamente desastrosos, Planos Cruzado e Cruzado 2. Isso é bem retratado em “Plano Furado II”:

“Você não se arrependeu

Daquela última vez

O Brasil quase faliu

E você quase morreu

O sistema monetário

Sempre muda pra pior

O pobre fica bem mais pobre

E o rico vai pra melhor”

 

E “S.O.S. País Falido”:

“Estamos num barco furado

Não temos dinheiro

Nem revolução.

Só 1000% de inflação

Eu acho que o barco vai afundar

2000% de inflação

Nem São Tancredo vai ajudar”

E não ajudou mesmo! Mal sabia o Ratos que quando Collor assumisse o assalto aos brasileiros e brasileiras seria institucionalizado com o pacote econômico de Ruth Cardoso, que promoveu constrição nas poupanças e economias de todos e todas.

O Ratos não fez previsões sobre o que viria, exatamente, na década seguinte. De uma forma ampla estava claro que os caras sabiam que da merda não iriamos sair. Contudo, desde àquela época os caras já denunciavam o desmatamento e exploração desenfreada dos recursos naturais da Floresta Amazônica. “Amazônia Nunca Mais” mostrou para além das fronteiras do nosso país o que estava rolando por aqui:

“Mas o homem branco

Com seu sujo poder

Escravizou e prostituiu

Se aproveitou da pura inocência

Dos verdadeiros filhos do Brasil”

(…)

“O Guarani é o Hino da Morte

Para índios, árvores e animais

O fogo queima tudo que sobrou

Infelizmente, Amazônia nunca mais!”

 

Outro recorte histórico que o Ratos de Porão acabou fazendo, através de suas letras, foi o quanto o final da década 80, início de 90, estavam mergulhadas nas drogas e começando avaliar os excessos cometidos no final de 70 e até o meado de 80. Era hora de fazer um balanço, e um dos clássicos do Ratos de Porão já demonstrava que o panorama para nova década que iniciava-se não era dos melhores, “Aids Pop Repressão”:

“Os tempos mudaram, agora é o fim

Um punk vira crente pra pedir a salvação

Emborracha o danado para não se infectar

Aquela coisa boa você nunca vai achar

 

Sexo, drogas, rock’n roll

Quem está nascendo agora isso não vai conhecer

Temos que nos proteger

Os prazeres dessa vida já viraram maldição”

E não pararam por ai. Em outro clássico a banda faz uma autocrítica da forma de vida que vinham levando ao longo dos anos, em “Beber até morrer” a pergunta que ressoa nas mentes: “Essa é a solução?”

A heroína já tinha chegado aos grandes centros do país, tais como São Paulo, tornando-se uma das drogas mais badaladas do momento, trazendo sérias consequências e diversos obtidos aos jovens e às jovens da época. O Ratos, em um verdadeiro “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço” tentava frear, através de alertas, o consumo desenfreado da droga do momento. “Heroína Suicida” deixa claro isso:

“Sinta as garras do pico assassino

Rasgando suas entranhas

Traçando seu destino

Sinta a apatia dessa multidão

Caminhando insanamente

Rumo a destruição.

Mesmo que sua vida seja uma merda

Você não pode desistir

Não entre nesse mundo maldito

Você tem que viver”.

Gil Gomes estava despontando na TV, com aquele jornalismo mesclado com gore/splater, puro sangue e um toque de horror. Nitidamente o Ratos foi influenciado por esses tipos de programas da época, que mesclava jornalismo policial com filmes de terror praticamente. Indícios disso são as faixas “Herança”, “Vida Animal” e “Gil Goma”.

A preocupação com a situação do país continua nas faixas “Terra do carnaval”, que retrata a apatia do povo brasileiro e o conformismo com tudo, nada muito diferente dos tempos atuais. “Crianças sem futuro”, dando um panorama da mortalidade infantil, relacionada aos altos níveis de pobreza da época, níveis esses que estão voltando a crescer. E “Lei do Silêncio”, algo também bem comum atualmente, onde atrocidades são cometidas, sobretudo nas periferias dos grandes centros, e as pessoas não se sentem seguras em denunciar ao Estado, pois muitas vezes são os próprios agentes estatais responsáveis por tais atrocidades.

“Traidor” fala justamente da alcunha que foi dada ao Ratos, pelo distanciamento do punk e um maior envolvimento com a cena metal.

No álbum consta uma faixa instrumental, “O Fim”, com um riff de guitarra total thrahêra!

Por fim, cabe falar de 04 faixas que são mais que atuais 30 anos depois, são elas:

Farsa Nacionalista: “Seu orgulho é totalmente sem sentido, Se trabalha como um animal, E vive como um cão”;

Porcos Sanguinários: “Abuso de poder, Falso moralismo, Merda na cabeça, Na mão um treisoitão”;

Máquina Militar: “Olhe soldado, Esqueça seu passado, Você deixou de existir, Agora você é uma máquina do sistema, Somente para matar, Somente para destruir”;

E com chave de ouro, vamos a esse recadinho vindo lá de 1989, da música “Retrocesso”:

“Cuidado com o poder do regime militar

O tempo vai retroceder

O DOI-CODI vai voltar no

BRASIL, BRASIL, BRASIL”

É triste ver como o “Brasil”, e suas temáticas, ainda são bem atuais, o que denota que nosso país continua um antro de apatia afundado no excremento vindo de Brasília, um país repleto de inequidade e com grandes chances de retrocessos históricos. Na real, quando trechos como esses fazem tanto sentido ainda, claramente já retrocedemos:

“Ame-o ou Deixe-o

Essa era a solução

De Médici e sua corja

Imposta para o povo do

BRASIL, BRASIL, BRASIL”

30 Anos de “Brasil”, comemoramos ou lamentamos ele fazer tanto sentido ainda? A resposta não sabemos, mas fato é que ele será tocado na íntegra no show do Ratos de Porão no Festival Abril Pro Rock de Recife/PE.

Sobre o autor:

Dudu é Straight Edge, Membro do coletivo Saco de Vacilo, vocalista da banda Antiporcos, Rubro Negro e viciado em música. 

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