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A luz própria de Benjamin Clementine em At Least For Now

benjamin-clementine

Benjamin Clementine mostrou sua música para o mundo com At Least For Now, seu primeiro disco de inéditas. Conheça o som do britânico.

Sempre gostei de ver fotografias e de prestar atenção na expressão de vários músicos dos quais sou fã. O mais interessante, no entanto, é que por mais que ver o Jimi Hendrix congelado seja lindo, creio que nada transmita o que sua imagem realmente foi, da mesma forma que um vídeo ou uma música.

Acredito que os corpos falam através da arte. Quando começam a externalizar a música, todos são capazes de propagar sentimento, e se vocês não conseguiram captar a essência dessa ideia, vejam o reverendo Benjamin Clementine, por exemplo.

É impressionante como a imagem desse cidadão diz muita coisa. Esse magnetismo é a luz própria de Benjamin Clementine. Apenas os grandes mensageiros conseguem impactar alguém com um primeiro contato tão passageiro e ao mesmo tempo impactante como esse, do primeiro olhar.

Sempre achei que os grandes nomes da música tivessem um tempero diferente na formação de suas respectivas personas artisticas. Quando isso é percebido só por uma foto, quer dizer que temos algo especial nas mãos. E foi exatamente isso que senti quando vi a face do senhor Benjamin Clementine… Anotei seu nome imediatamente, pois algo me dizia que se tratava de uma experiência única.

At Least For Now

Após o play, o palpite virou convicção. O motivo? ”At Least For Now”, o primeiro full da carreira do britânico, lançado em 2015, trata-se de um trabalho especial.

at least for now

Track List:
”Winstom Churchill’s Boy”
”Then I Heard A Bechelor’s Cry”
”London”
”Adios”
”St-Clementine-On-Tea-And-Croissants”
”Nemesis”
”The People And I”
”Condolence”
”Cornerstone”
”Quiver A Little”
”Gone”

 

Dono de um timbre de voz bastante único e de uma abordagem técnica arrojada ao piano, Benjamin apareceu na midia depois de superar poucas e boas durante sua caminhada – descalço – na estrada do sucesso.

Benjamin Clementine

Poeta, ator, compositor, pianista e cantor, Benjamin nasceu na Inglaterra e foi criado no bairro de Edmonton – numa família de descendência ganesa – mas foi na França que a sua música aconteceu. Sem teto, tocando por trocados, o músico se tornou uma figura cult em Paris. Se você pesquisar no Youtube, encontrará vários vídeos do cidadão, tocando nas ruas ou em estações do metro parisiense.

Autodidata, Clementine desenvolveu um estilo bastante influenciado pelos compositores franceses, como Debussy, por exemplo, misturando essas influências com uma abordagem vocal bastante expressiva e dramática, como se fosse o narrador e o pianista de sua própria peça.

É dessa forma no mínimo peculiar que ele apresenta suas composições, sempre com um lirismo que parece flutuar, acompanhado por um piano que orbita o Jazz e o Blues – com autoridade –  envolto por infalíveis bases que ele cria para  sustentar sua voz.

Em seu primeiro disco de estúdio, após lançar 2 EP’s (“Cornerstone” em 2013 e “Glorious You” em 2014), um dos grandes músicos e compositores de sua geração, Benjamin arquitetou um tecido musical muito interessante, trabalhando a percussão de seu piano com um feeling mais Trip Hop, um detalhe que agregada traços modernos ao seu trabalho. O meliante não soa datado. O groove desse Black Power é contemporâneo.

A tônica é a voz e o piano de alta fluência técnica e criatividade. Não tem banda de apoio, aqui é Benjamin e um beat fazendo a bateria, com toques de cordas finalizando as camadas. Esse jogo de luz e sombra entre as cordas e as bases – com buquê Trip-Hop – ajudam a ressaltar ou atenuar as atmosferas que são criadas, take após take.

Aliás, o trabalho de cordas é um detalhe que acrescenta um ar de música orquestrada bastante prudente nas faixas. É interesse como esse recurso é utilizado também para agregar certo suspense para o desenrolar das composições. Essa abordagem fica clara desde a abertura do disco, com ”Winstom Churchill’s Boy”.

O repertório é pungente. A voz do cidadão funciona como um instrumento particular, se junta ou vai além do piano e cria temas e climas que revelam uma força assustadora. Com relatos dolorosos (como ouvimos em ”Then I Heard A Bechelor’s Cry”), Benjamin consegue impactar o ouvinte de uma maneira retumbante e nem por isso deixa ninguém na fossa.

É sentimento puro, mas é revigorante, e ver esse cara sentado em um piano, absolutamente inexpressivo é uma coisa, quando ele abre a boca parece que surge uma luz. As letras revelam um trabalho minucioso e cuidadoso, exorcizando os problemas que o multi instrumentista viveu até se colocar na situação que ocupa desde que esse disco saiu.

Aos 19 anos de idade, Benjamin saiu de Londres (onde nasceu e cresceu) e foi morar sozinho, mudando de país. Foi na França que ele começou a viver da música, tocando em bares e usando o asfalto quente da Champs Élysées para destilar sua poesia.

Hoje com 34 anos, já com uma sequência para esse disco lançada (“I Tell a Fly”), liberada em 2017, ele mostra seu incontestável valor e surge com um dos artistas mais celebrados pela crítica, principalmente no circuito europeu.

Só que isso não veio do nada, começou em 2012 quando Lionel Bensemoun fez a ponte para a gravação de ”Cornerstone”, seu primeiro EP, e ”Glorious You”, o trabalho que antecedeu este full lengh.

São letras de quem já viveu muita coisa. O repertório é vasto, completo e complexo, seja com uma proposta mais sutil, como ”London” ou trazendo o piano para o primeiro plano, como uma metralhadora de rosas, em ”Adios”. O que falar dos singles? O sucesso de ”Nemesis”, ”Condolence” e ”Cornerstone” foi tão categórico quanto o trabalho que Benjamin faz, tocando e cantando ao mesmo tempo.

É difícil saber o que ele faz de melhor, se é tocar ou cantar, mas a forma como essas duas habilidades são complementadas entre si é deslumbrante.

Escute o que o Benjamin tem para dizer. Coloque os fones e aperte play. A forma como ele usou as cordas e o seu próprio acompanhamento para direcionar a atenção do ouvinte para certas passagens chave nas faixas é inteligente e elegante. Em alguns momentos, o piano rouba a cena, noutros, Benjamin reina com sua voz soberana, sentindo cada nota.

É uma música solar e que pega o ouvinte de jeito, principalmente nas baladas. O murmurar de “Then I Heard a Bachelor’s Cry” vai ficar na sua memória.

Com relatos autobiográficos (“London”), e majestosos números que mostram sua comunhão com as teclas (como em “Adios”), essas passagens mostram uma sensibilidade quase cinematográfica, remetendo às trilhas do cinema francês que Benjamin teve contato. 

As cordas acrescentam um movimento que deixa rastro, como os detritos da cauda de um cometa. É assim no angelical refrão de “Nemesis”. É intimista em “St-Clementine-On-Tea-And-Croissants”.

Trata-se de um disco muito linear, e temas como “The People And I” sustentam a solidez do registro, em termos de conceito e abordagem de som, mostrando faixas que fazem sucesso ao vivo (“Nemesis”, “Condolense” e “Cornerstone”), funcionando em estúdio, também com uma abordagem genuína.

A produção agrega um frescor aos temas. As ideias são bem roteirazadas e, com isso, os ouvintes são agraciados por temas de grande luz própria, como Quiver a Little”, “Gone”, “I Won’t Complain” e “Pound Starling”. É um punhado de faixas preciosas que impressiona pelo patamar alcançado e pelo trabalho de produção. 

Benjamin Clementine, não se esqueça desse nome.

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