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O rap nacional no século 21 é diverso

O rap nacional no século 21 é diverso, separamos 5 vídeos clipes para vocês: BC Raff, Rap Plus Size, Sergio Estranho, Victor Xamã e nILL.

“Um Samurai que conhece o seu caminho, não se importa de ouvir falar sobre outros caminhos.” Hagakure

Sempre me agoniou o famoso: “ou você gosta disso ou daquilo”. Não por qualquer ideia frágil de ecletismo ou por acreditar que devemos gostar de tudo. Mas da mesma sorte que nunca acreditei em ser fã de ninguém de modo alienado, também sempre pensei que certas coisas que não me agradavam muito, tinha seu público, sua função e suas qualidades.

Quando voltei a acompanhar a cena do rap nacional de modo a buscar o que realmente acontece de norte a sul do país, a primeira constatação foi a enorme qualidade musical que atravessa o país. De lá pra cá, outra constatação de igual proporção vem me chamando a atenção: a diversidade e qualidade das expressões.

A discussão sobre os atributos estéticos de uma obra é possível em termos racionais, ao contrário do que o senso comum gostaria de crer. O rap vem crescendo no país nos últimos anos, e é natural que a diversidade que nos constitui como país e as diferenças dos atores que atuam nesse gênero hoje, expressem uma miríade de questões. Acredito que o papel do jornalismo musical é buscar entender e dar a ver as diversas expressões musicais, do modo mais crítico e variegado possível. 

Obviamente os resultados não são unânimes e nem devem ser, mas a clássica frase do dramaturgo romano Terêncio: “Sou humano, nada do que é humano me é estranho”, poderia ser um norte. Não é saudável gostar de tudo, mas é bem interessante, estar a aberto a diferentes expressões, quando realmente se gosta de música. Faço desse exercício prática de vida, e por isso resolvi reunir numa mesma matéria, alguns/algumas rappers, que não encontramos juntos por aí. Observe e Absolva.


BC RAFF

Artista que no que se propõe é excelência, Raffa Moreira aka BC Raff atua no cenário rap do Brasil, dentro do trap como linha estética. Em sua trajetória, as tretas não são algo escasso, assim como a qualidade de suas músicas, sua técnica e seu tino marqueteiro não fogem nunca da raia. BC Raff é daqueles artistas que no cenário nacional comunica também com uma parcela grande da juventude. Seus posicionamentos raciais e profissionais mexeram com  verdades fajutamente assentadas no “mercado do rap nacional.”

Há em certa medida uma constante tentativa de ridicularização do trabalho e da figura do Raffa Moreira, muito pelo artista estar vez por outra envolvido em tretas. Como geralmente o seu trabalho é apresentado com singles, a uma carência de reviews sobre seus trabalhos, ele que ficou muito conhecido pelo bordão: “Mixtape mano”. Mas que se procurarmos trabalhos de análise, seja sobre essas mixtapes mais antigas, seja pelos temas abordados em seus singles, pela sua qualidade pop, não teremos muito sucesso.

Nesse videoclipe, produção do DesenrolaFilmes, numa parceria com Aka Rasta, BC Raff mais uma vez nos oferece um excelente trabalho.


RAP PLUS SIZE

Muito se falou após o lançamento desse clipe, do quanto o próximo disco do Rap Plus Size passou a ser mais e mais aguardado. O lance é que o trabalho de Issa Paz e Sara Donato vem ganhando contornos próprios. E quando falamos em contornos próprios se trata de entender que aos poucos as minas vem criando um estilo próprio e singular dentro do cenário.

Geralmente agressivas em suas linhas e flow, elas já tinham mandado muito bem no clipe de O Som Mais Pesado Do Ano (2018). Onde junto com Godó e Raphão Alaafin, elas vinham transformando a gordofobia em algo risível, demonstrando a estupidez desse preconceito.

Agora, em Sua Ex te Odeia (Porque Você é Um Cuzão), elas repetem o procedimento para ressaltar também outras pautas que lhes são caras, como a luta por igualdade através do feminismo. Num beat do Vibox, e no lindo audiovisual produzido pela Ganga Prod., as minas deitam num flow em cima de um beat trap, e ridicularizam os MCs escrotos que não tem proceder.


SERGIO ESTRANHO

Você precisa ouvir Luan Santana Mixtape (2017), talvez entenda o erro que cometeu passando tanto tempo sem conhecer o trabalho do Sergio Estranho. O trampo desse “mano paulista do rap de São Paulo” te levará com certeza a conhecer o excelente trabalho do Rancho Mont Gomer, e aí você entenderá de fato o tamanho do erro que você vinha cometendo.

Mas ainda há tempo, Sergio Estranho é um dos muitos artesãos que seguem transformando o rap em “grande arte”, experimentando e afiando as linhas com uma propriedade ímpar. O artista acaba de lançar Tudo Isso É Um Sonho EP (2019), onde produziu os instrumentais e a direção musical é do Rancho.

Antes do lançamento do EP, Estranho lançou o clipe da última faixa do EP, E.S.T.R.A.N.H.O. (Esta Sigla Não Significa Nada), com direção dele e da Isa Hansen, assista e veja o quanto você está perdendo.


VICTOR XAMÃ

A essa altura do campeonato, Victor Xamã já deveria dispensar apresentação, após o lançamento de dois discos que só não emocionam e cativam quem já está completamente embotado. O rapper manauara, diretamente lá do norte, não para de dar aulas pro resto do país, além de fazer parte de um dos grupos mais originais do cenário nacional: Qua$imorto.

Vindo dos elogiadíssimos discos Janela (2015) e V.E.C.G.(2017), o mano segue nos trampos, apresentando agora uma peça audiovisual que é uma poesia muito bonita nas imagens e na edição. Fruto do trabalho da diretora Isa Hansen que captou com uma singeleza absurda a essência da música que, de algum modo, é o tema da maioria das composições de Xamã.

A dicotomia entre o homem e a natureza- para alguém que vive entre a exuberância e a força da maior floresta do mundo dentro de uma metrópole- é uma das forças da poesia do rapper. Isa Hansen teve muita sensibilidade e sobretudo demonstra por sua vez a força de sua arte. Olhem pro norte e enxerguem.


NILL

Está aqui uma outra prova, dessa vez cabal e suficiente, para atentarmos a visão geral que esse texto quer promover. O rapper de Jundiaí nILL tinha ou tem tudo para não ter alcançado o merecido sucesso que o álbum Regina (2017) lhe trouxe. Uma lírica muito própria, uma experimentação de timbres, seguindo a linha vapowave em suas produções, falando um montão de anime. Ao que me parece, pelo menos, não são aspectos historicamente valorizados no rap nacional. Mas para o nosso bem, o trampo do nILL foi ouvido, mediado por sites e formadores de opinião e o público, juntamente com a crítica, abraçou.

Nesse processo todo, ao seu modo, o rapper vem promovendo uma microrrevolução no cenário nacional, ao abrir o público para a percepção de novas estéticas e temas. O maravilhoso Good Smell Vol. 1 mixtape (2018) é uma outra pérola que o mano soltou, e SoundFoodGang – FoodSation (2018) é uma outra pedrada, desta vez coletiva. E agora chegou nas ruas, o clipe de Aqualtune/Alluka, um audiovisual fruto de uma oficina na Casa de Clipes no Instituto de Cinema, em São Paulo.

Reafirmado o que dissemos acima, é isso que nos apresenta esse novo videoclipe do nILL, um excelente complemento visual, para suas ideias e rimas, com uma estética nova, para o que estamos acostumados a ver em clipes de rap nacional. Com direção certeira da Gabi Jacob, o MC é flagrado em momentos distintos de ânimo, ora tristão em meio a multidão, ora reflexivo, ora animado de rolê pela cidade. Mais um excelente trabalho. Vida longa para esse mano.

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