O Dub é o mais puro néctar do elemento roots. A via de acesso mais densa e pulsante que o DNA Jamaicano nos brindou. Os batimentos cardíacos da terra por cima de um groove com inclinações esfumaçadas, lentas, cheias de eco e que pesam uma tonelada.
A história do estilo e seus pilares. Tudo isso remonta ao reino de I and I, a saudosa Jamaica, o berço de tudo, a gênesis daquele som que não é do Planet Hemp, mas que você sente no peito. O caminhar das notas graves, a transição da era de ouro do Ragga, da raiz com banda, até a ponta dos dreads, hoje mais de 40 anos depois, no meio da era digital.
Foto: Fábio Linhares |
Quem construiu essa ponte? Foram muitos homens, a Babilônia ameaçou cair quando ouviu o peso de King Tubby, Errol Thompson, Prince Far I… Está tudo por baixa da cortina de fumaça, pegue a faquinha do rocambole e comece a cortar os blocos da história. Remonte a sequência evolutiva, sincronize o darwinismo Rastafari e coloque uma intera destinada aos livros de história.
Dia 21/11/2015. Dia 21 de novembro de 2015, as 16:20 (pelo horário da Jamaica, mentira, foi as 22:00), o Afro System Festival abriu as portas do Estúdio, situado em Pinheiros e, daí pra frente, a missão de reconstruir a ponte entre o presente e o futuro, começou a ser traçada.
Desconsiderando um leve atraso no front das atrações, o elo das transcrições de RNA começou a ser colocada na fita depois que o DJ Samuca adentrou o recinto. O público ainda estava chegando, mas não teve moleza, o sábado foi banhado por trilhas queimadoras de neurônios desde o primeiro minuto.
Sets dinâmicos, com boa duração, grooveria eletroacústica da mais fina qualidade. Teve Amanajé Sound System na sequência da roda, High Public Sound passando a goma e DJ Tahira com a missão de seguir torrando a vela de celebração. As memórias são esparsas… Afinal de contas não é sempre que você cola numa sessão de mais de 5 horas de duração.
A cada atração o espaço ficava mais povoado. Os beats não paravam, os corpos pulsavam, pulavam, andavam em sincronia com o passo de Haile Selassie. Todos sabiam quem estava pra chegar, mas ninguém conseguia nem ter uma ideia do que iria acontecer, a tensão foi aumentando e quando bateu 3 horas da manhã, rapaz, a sauna se transformou numa panela de pressão.
Primeiro o pessoal da High Public foi dar um tapa nos últimos detalhes. Logo depois a rainha do Dancehall subiu no palco e só de ver a senhorita Nancy, em seu habitat natural, uma das maiores lendas da Jamaica… Foi um sinal, a elevação estava próxima. O set começou e aí deu pra entender por que a mulher é uma lenda, em menos de 10 segundos ela já tinha a platéia na palma da mão, faltava só uma seda.
Mas o Afro System levou várias e ainda o fez com a benção de todos os elementos místicos. Sister Nancy foi para o palanque e enquanto pregava, sua luz própria foi irradiada com a força de 500 vaporizadores. A suprema corte do ”Bam Bam” se apresentou com a humildade de mil homens. agora sim o cenário estava pronto: Sister Bam Bam Nancy was in the house.
Foto: Macrocefalia Musical |
Foi a maior sauna que já participei. O melhor Dub que já ouvi. Uma noite translúcida, leve para o corpo, pesada para a cabeça. Registrar e assimilar tudo que foi visto e ouvido é uma tarefa para alguns dias, meses, até mesmo anos. A grandeza dessa noite foi impressionante. afinal de contas a primeira dama estava ali, na frente de uma casa lotada.
Uma das maiores guerreiras do exército dos jardins suspensos da Babilônia, ali, na mesma casa que nós, seres mundanos da platéia. O som foi purificando cada uma das almas situadas na Avenida Pedroso de Moraes (420, mentira 1036).
Foto: Macrocefalia Musical |
O reverb virou cérebros do avesso. a dupla drum & bass torceu e triturou. O resto bateu na sequela dos ecos e da fumaça que a essa altura do campeonato, era apenas um plano de fundo para as festividades. Tivemos mais ou menos 90 minutos para entender de onde veio o Dub, como ele era e como ele está hoje.
Alguns neurônios se perderam nessa jornada de conexão, mas outros milhares viram e fizeram fumaça para celebrar uma noite, que muito provavelmente, produziu a melhor session de néctar jamaicano da minha vida.
Todos os presentes se encontravam complementa anestesiados, parecia um sonho, uma viagem transcendental e com a trilha sonora perfeita, criada por uma das maiores entendedoras desse som que nos faz dançar. Agradeço a todos os envolvidos, desde as bandas no line up até o pessoal da Afro System. É isso, apenas forget you troubles and dance. Fire fire fire.