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CD's, Tommy Bolin

Alphonse Mouzon: uma troca de ideias ao som de Mind Transplant

Toda vez que alguém fala sobre Tommy Bolin, existe um disco do qual o guitarrista fez parte que mesmo sendo brilhante, poucos costumam mencionar. No pouco tempo que ficou por aqui, o americano gravou um disco fantástico junto com um dos maiores bateristas de Jazz que já ousaram segurar uma baqueta, e não, não estou falando do extraterrestre ”Spectrum” do panamenho Billy Cobham, mas sim do igualmente clássico ”Mind Transplant”, o terceiro disco solo do grande Alphonse Mouzon, lançado em 1975.

Line Up:
Tommy Bolin (guitarra)
Henry Davis (baixo)
Alphonse Mouzon (bateria/vocal/sintetizadores/piano/órgão)
Lee Ritenour (guitarra)
Jay Gradon (guitarra)
Jerry Peters (piano/órgão)

Track List:
”Mind Transplat”
”Snow Bound”
”Carbon Dioxide”
”Ascorbic Acid”
”Happiness Is Loving You”
”Some Of The Things People Do”
”Golden Rainbows”
”Nitroglycerine”
”The Real Thing” – Versão remaster

Se você curte a Jam do disco de Cobham, espere até escutar isso aqui. A banda é fantástica, trata-se de um dos trabalhos mais chapados e brilhantes do segmento Fusion. Um LP que beira o Funk psicodélico em alguns momentos, sempre com uma pegada monstruosa e detalhes incríveis, onde mais uma vez, Bolin deixa sua marca.

Mas não é só por causa de um músico que um clássico sobrevive, temos também um arregaço contundente por parte de Lee Ritenour e Jay Gradon (também nas guitarras), fora é claro o restante da banda, que apesar de muito tentar, não consegue interromper as investidas de um impossível, frenético e fulminante Aphonse Mouzon.

São 35 minutos de Jam, um instrumental que transborda urgência e que mesmo sendo considerado um dos maiores clássicos do Jazz, é pouquíssimo conhecido e digo mais, a performance de Bolin é só um detalhe, os outros músicos também esfarelam seus respectivos instrumentos. O baixo de Henry Davis é Funk puro, a cama pianística de Jerry Peters é suprema e o resultado é tão quente que reza a lenda que se você colocar um ovo na frigideira com o fogo desligado e com esse disco na vitrola, ele frita.
Um poço de qualidade, quase todo instrumental (se desconsiderarmos os belos vocais de Alphonse em ”Some Of The Things People Do”). Uma fritação contundente e que é apenas UM dos belos discos que o baterista criou. As viradas desse cara deveriam ser estudadas!

Chega a ser brincadeira ouvir um disco com tanta riqueza e pegar a ficha técnica depois e ver 6 nomes apenas. E o mais absurdo é o padrão de intensidade que é estabelecido desde o play inicial com a faixa título, até o final do LP com ”Nitroglycerine” (para quem tem a versão comum), pois quem possui a remasterização deste clássico ganha um gás de 20 minutos de pura explosão improvisada. 

E o peso prova o caráter visionário deste som, apostando numa linha que é justamente o divisor de águas entre os jazzístas conservadores e os fritadores do bom e velho Fusion. Estilo que se firmou e descabelou toda comunidade conservadora que achava que o certo era o piano no modelo ”trilha de elevador”.

O problema é que esqueceram de avisar a banda do Alphonse, por que o pessoal comeu Fusion em todas as refeições. Era teclado de café, guitarra no almoço, batera de lanche da tarde, baixo na janta e uma jam para preencher a madrugada. É inclusive desnecessário evidenciar os resultados. ”Mind Transplant” exala novidade em todas as tracks, o groove e a talk box são elementos latentes em ”Snow Bound” e o peso prova ser um desafiante ridículo para ”Carbon Dioxide”, por exemplo.

O desenvolvimentos dos sons cai para qualquer lado, tudo aparece de maneira brilhante nesse disco e nenhuma nota se perde em remadas encavaladas e mal resolvidas no instrumental. A bateria é base e o que oxigena tudo, por isso que os outros instrumentos ganham tanta liberdade e o resultado é tão amplo.

”Ascorbic Acid” mostra que não faltou cocaína para Mouzon, ”Happines Is Loving You” da uma canja do grandioso feeling desta reunião, ressaltando o feeling colorido do trio Bolin, Ritenour e Gradon. Mas é com ”Golden Rainbows” que a casa vai para o chão. São temas como esse que fazem o mundo girar meu chapa, é quando a guitarra entra e o baixo fica de queixo caído fazendo a base com toque sutis, mas sempre perceptíveis de um visionário Bolin e um inspiradíssimo Ritenour, homem que teve culhões para preencher o recheio (solo) desta exuberância Funkeada.

 
E não pense que o pessoal relaxou, Alphonse segue tirando o ânimo dos bateristas para sentarem no cockpit do ritmo com ”Nitroglycerine”, e abre a caixa mágica das jam não lançadas quando resolve incluir ”The Real Thing” na remasterização deste clássico. Eis a faixa que exemplifica tudo que foi dito aqui, mostra uma das melhores gravações da história da bateria e resume a vibe de um disco que atropela o ouvinte com os ensinamentos que deveriam reger nossa vida: 20 minutos de jam, quem nunca?! 

Entrevista:

1) Sua abordagem para com a bateria é uma das mais intensas que já escutei. Toda vez que escuto seus discos parece que os caras que o acompanham tentam, mas não conseguem acompanhar seu groove! Como você sustenta esse nível? Parece que as baquetas estão sempre um passo a frente de todos! 

O trabalho de um bom baterista é manter o tempo e o groove, inspirando os outros músicos a tocar melhor, assim direcionando e energizando a banda. É isso que eu faço toda vez que toco.

2) ”Mind Transplant” é um clássico do Jazz Fusion e contém um pouco do talento de Tommy Bolin, um cara que não viveu tempo suficiente para ser o que esse disco prova que ele poderia. O que você tem a dizer sobre ele e a ”Fusion Jam Sessions” (os ensaios do ”Mind Transplant”)? 

Tommy realmente me ajudou a fazer de ”Mind Transplant” um clássico do Jazz, junto com o guitarrista Lee Ritenour e Jay Gradon, bem como o tecladista Jerry Petters e o grande baixista de Funk Henry Davis. Bolin era um guitarrista de Rock & Blues que entendia o Jazz de uma maneira muito natural. Ele foi um jovem gênio que morreu aos 25 anos após se juntar ao Deep Purple.

3) Você tocou com ótimos guitarristas ao longo de sua carreira, mas eu acho que o cara que mais lhe desafiou foi o Larry Coryell. O que você tem a dizer sobre o approach do americano?

Larry e eu estamos tocando, saindo em turnê e gravando juntos há mais de 40 anos e nós nos conhecemos muito bem por causa de toda essa história. Por isso que a cada encontro, nós sempre nos desafiamos para ver quem é o melhor, é uma relação que sempre alimentou nossa química musical.

4) Quando o movimento Fusion começou você gravou discos fantásticos e acho que sem algum deles, o estilo não teria a forma que possui hoje. Como foi o processo de criar algo para um novo movimento? Você sentia que o Jazz clássico não estava mais tão quente?  

Durante o tempo que atuei como pioneiro neste campo eu ainda gravava Funk & Soul para outros artistas. Nunca pensei que o Jazz perdeu seus encantos. Até hoje Larry e eu seguimos com o Fusion, Rock, Jazz e Smooth Jazz.

Amo todos os estilos de boa musica e quando toquei com o Weather Report nós ajudamos a guiar um novo movimento Jazzístico que foi inspirado pelo grande Miles Davis. Depois eu voltei a tocar Jazz clássico por 2 anos com o McCoy Tyner (pianista do John Coltrane) e antes disso também me juntei ao Larry Coryell And The Eleventh House para seguir agitando a cena em 1973

5) Quais são os seus planos para um novo disco no futuro? Você não toca no Brasil desde 1985, isso seria uma ótima desculpa para um novo show!

A música brasileira é um elemento que está presente na maioria dos meus discos. Adoro compor e tocar sambas. No momento estou trabalhando em 4 discos novos para o meu label (Tenacious Records). A ideia é lançar tudo em 2016 e explorar mais um pouco dentro do Jazz clássico, Funk, Blues, Smooth Jazz e finalizar algumas músicas para trilhas de filme que andei criando também. 

6) Além de exuberantes linhas de bateria você também possui uma bela voz. O que muda pra você, musicalmente, quando precisa fazer as duas coisas ao mesmo tempo?

Não muda nada musicalmente falando. Quando canto e toco bateria ao mesmo tempo só preciso me concentrar no tom e no ritmo, assim, posso cadenciar ambos com boa desenvoltura.

7) Qual é a sua opinião sobre a chamada ”bateria moderna”? O que você acha que mudou?

Hoje a maioria dos jovens bateristas toca e possui o mesmo som. O foco é apenas tocar e o produto final, o som, a característica mais importante, se perde pela falta de originalidade. Cada baterista deveria criar sua própria identidade para poder ser facilmente reconhecido quando começa a aquecer o Kit.

Eu tenho isso, um estilo único de bateria, ninguém soa como eu e isso é algo que se perdeu hoje em dia. 

8) Depois de tantos anos no meio musical, clássicos solo, contribuições, projetos paralelos e supergrupos, o que você ainda quer tentar fazer dentro dessa nova cena?

Eu quero continuar a fazer ótima música com grandes parceiros do mundo todo e seguir envolvido com o maior número de projetos que consiga suportar. Uma das minhas maiores vontades é compor mais para filmes e para a TV. Gostaria de ter um hit na TV onde eu possa atuar e compor a trilha.

9) O Funk e o R&B ajudaram você a criar um estilo bastante flexível, pois com todas essas virtudes juntas você consegue ir para o Rock, misturar tudo e no fim do dia criar algo sem limites, algo bastante raro, devo salientar. Você acha que o Funk foi a chave para tanta criatividade?

O Funk, a música Pop e o Rock foram o começo de tudo para minha infância no sul. O groove do Funk principalmente firmou a base do meu som no fundo da minha alma e no tempo das batidas do meu coração.

Até hoje, quando toco um pouco de Be-Bop, sempre adiciono pitadas de Funk, é um elemento que inconscientemente habita tudo que acabo criando.

10) Alphonse, agradeço pelo seu tempo e pela oportunidade, foi uma honra falar com sua pessoa. Para terminar, gostaria de saber quais são os seus bateristas preferidos e por quê.

Elvin Jones, Roy Haynes, Tony Williams, Art Blakey, Philly Joe Jones, Buddy Rich e Jimmy Cobb são os meus bateristas favoritos. Além de ótimos músicos tecnicamente falando, eles foram grandes inspirações para meu som, pois conseguiam improvisar e seguir o script mantendo o mesmo nível, com muito groove e paixão.

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